As autoridades ucranianas relataram hoje um ataque russo ao porto comercial de Odessa, um ponto-chave para a exportação de cereais pelo Mar Negro.

O porto foi "atacado especificamente quando cargas de cereais estavam a ser processadas. Dois mísseis atingiram as infraestruturas do porto, onde obviamente há cereais. Eles [os russos]  atacaram um território onde há cereais", afirmou à AFP o porta-voz militar Yuriy Ignat.

Segundo o governador regional de Odessa, o ataque fez vários feridos. "infelizmente, várias pessoas estão feridas. A infraestrutura do porto está danificada", disse Maksym Marchenko, num comunicado em vídeo publicado nas redes sociais, sem porém adiantar o número de vítimas.

"Isto prova que não importa o que a Rússia diga e prometa, pois encontra sempre uma maneira de não implementá-lo. Geopoliticamente, com armas, de forma violenta ou não. Encontra sempre uma maneira", disse Zelensky durante uma reunião com legisladores dos EUA, segundo uma declaração da Presidência.

A Rússia não se pronunciou oficialmente sobre esta acusação, mas segundo o ministro da Defesa turco Hulusi Akar, negou ter atacado o porto. “Os russos disseram-nos que não tinham absolutamente nada a ver com este ataque e que estavam a analisar o assunto “, disse o ministro.

O bombardeio ocorreu menos de 24 horas depois de os dois países assinaram um acordo histórico, separadamente, com a Turquia e a ONU, com o objetivo de aliviar a crise alimentar mundial.

As reações não demoraram a chegar.

Ao disparar mísseis no porto, o presidente russo, Vladimir Putin, "cuspiu na cara do secretário-geral da ONU, António Guterres, e do presidente turco, Recep (Tayyip) Erdogan, que fizeram enormes esforços para chegar a este acordo", disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia, Oleg Nikolenko.

O funcionário ucraniano também disse que a Rússia deve assumir "toda a responsabilidade" se o acordo falhar e "a crise alimentar mundial" se aprofundar.

Guterres condenou "inequivocamente" o ataque e enfatizou que "a implementação completa de [do acordo] pela Federação Russa, Ucrânia e Turquia é imperativa".

Na mesma linha, o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, disse que o ataque foi "repreensível".

“A UE condena veementemente o ataque com mísseis russos ao porto de Odessa. Atingir um alvo crucial para as exportações de cereais, um dia após a assinatura dos acordos de Istambul, é particularmente repreensível”, escreveu o Alto-Representante da União Europeia (UE) para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell, no seu perfil no Twitter.

Segundo frisou, este ataque demonstra, “mais uma vez, o total desrespeito da Rússia pelas leis e pelos compromissos internacionais”.

Também o Reino Unido condenou hoje o ataque "absolutamente terrível" ao porto ucraniano de Odessa.

“É absolutamente terrível que, apenas um dia após este acordo”, o presidente russo, “Vladimir Putin, tenha lançado um ataque completamente injustificado a Odessa”, disse a ministra dos Negócios Estrangeiros britânica e candidata a futura primeira-ministra, Liz Truss.

Durante uma ação de campanha para suceder Boris Johnson, Liz Truss considerou que tal “mostra que não se pode confiar numa palavra do que [Putin] diz". “Precisamos trabalhar urgentemente com os nossos parceiros internacionais para encontrar outra forma de tirar os cereais da Ucrânia sem envolver a Rússia e as suas promessas quebradas”, defendeu.

20 milhões de toneladas de trigo

O pacto assinado em Istambul é o primeiro grande acordo entre as partes em conflito desde o início da invasão russa em 24 de fevereiro e procura amenizar a fome que, segundo a ONU, afeta 47 milhões de pessoas a mais devido à guerra.

A Ucrânia recusou-se a assinar diretamente este documento com a Rússia, então ambos os países assinaram acordos idênticos separados com a Turquia e a ONU, na presença de Guterres e Erdogan, no Palácio Dolmabahce de Istambul.

"Hoje há um farol no Mar Negro, um farol de esperança, um farol de alívio", disse Guterres, pouco antes da assinatura. "Ultrapassaram obstáculos e puseram de lado as diferenças, para abrir caminho a uma iniciativa que vai servir os interesses comuns de todos", apontou.

O secretário-geral da ONU lembrou ainda que este acordo vai ajudar "a estabilizar os preços globais dos alimentos, que já estavam em níveis recordes mesmo antes da guerra – um verdadeiro pesadelo para os países em desenvolvimento".

"Especificamente, o acordo que acabámos de assinar abre caminho para volumes significativos de exportações comerciais de alimentos de três portos ucranianos importantes no Mar Negro – Odesa, Chernomorsk e Yuzhny. O envio de grãos e alimentos para os mercados mundiais ajudará a preencher a lacuna global de fornecimento de alimentos e reduzir a pressão sobre os preços altos", explicou Guterres.

Erdogan, peça-chave na negociação, disse esperar que o acordo "reviva o caminho para a paz".

Antes de assinar, a Ucrânia alertou que daria "uma resposta militar imediata" se a Rússia violasse o pacto e atacasse seus navios ou invadisse os seus portos.

O presidente ucraniano Volodimir Zelensky afirmou que a ONU deve garantir o cumprimento do acordo, que inclui o trânsito de navios com cereais ucranianos por corredores seguros para evitar minas no Mar Negro.

Até 20 milhões de toneladas de trigo e outros cereais estão bloqueados nos portos ucranianos, especialmente Odessa, por navios de guerra russos e minas colocadas por Kiev para evitar um ataque anfíbio.

Entretanto, na frente energética...

Após a assinatura, o Ocidente elogiou o acordo e instou Moscovo a cumprir as suas disposições.

Por outro lado, a UE teme que a Rússia comece a usar o controlo das exportações de gás como arma geopolítica na disputa com o Ocidente.

O acordo de cereais foi assinado um dia depois de a Rússia ter reiniciado a operação do gasoduto Nord Stream, que esteve parado devido a uma manutenção. Mas os analistas alertam que o fornecimento de gás será insuficiente para evitar uma escassez de energia na Europa no próximo inverno.

Como resposta, a Comissão Europeia instou os estados membros da UE a reduzir o consumo de gás em 15% até à primavera — disposição a que Portugal e Espanha se opõem.

Entretanto, no terreno, a Rússia tenta assumir o controlo total da província de Donetsk e da vizinha Lugansk. Ambas as regiões compõem a região do Donbass, no leste da Ucrânia, que viveu mais um dia de bombardeios pesados.

Dois americanos morreram nesta região, controlada parcialmente por separatistas pró-russos desde 2014, disse este sábado à AFP o Departamento de Estado dos Estados Unidos, sem especificar se eram combatentes.

Na região central da Ucrânia, pelo menos três pessoas, incluindo um militar, foram mortas e outras 16 ficaram feridas também este sábado, durante um ataque de mísseis russos à infraestrutura ferroviária e a um aeródromo militar em Kirovograd, segundo o governador da região, Andriy Raikovych.

Na sexta-feira, os Estados Unidos aprovaram um novo pacote de ajuda militar, no valor de 264 milhões, à Ucrânia, incluindo sistemas de mísseis de precisão, munições de artilharia e postos de comando de veículos blindados.

*Com Lusa e AFP

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