O coronavírus espalha-se pelo mundo e a lista de mortos e infetados regista números que fazem já com que o medo se propague por vários sectores. Com as 116 mortes verificadas em Hubei e outras cinco no resto do país nas últimas 24 horas, o número total de mortes na China é de 1.380.
Entre os eventos de grande dimensão cancelados está o Mobile World Congress (MWC), em Barcelona. Já o Grande Prémio de Fórmula 1 da China foi adiado, assim como os torneios de râguebi de sevens, previstos para decorrerem em Hong Kong e Singapura. A Liga dos Campeões asiática também será afetada, com os jogos que envolvem as equipas chinesas a serem igualmente adiados.
Da mesma forma, os Mundiais de atletismo de pista coberta foram adiados para 2021, os quais seriam o primeiro grande evento de atletismo do ano, a cerca de quatro meses dos Jogos de Tóquio2020, tendo ainda sido anuladas as provas de golfe da LPGA e PGA previstas para a China. Contudo, até ao momento, os Jogos Olímpicos Tóquio2020 continuam sem alterações.
Em Portugal, os efeitos a este nível também já se fazem sentir. A Fundação Champalimaud anunciou esta quinta-feira o cancelamento de uma conferência agendada para março.
"A Fundação Champalimaud lamenta anunciar o cancelamento da conferência 'Metamorphosis: science, information, planet and democracy'. Com base nos dados conhecidos até ao momento e as preocupações associadas à disseminação do coronavírus, as Instituições organizadoras tomaram a difícil decisão de não prosseguir com o encontro programado para os dias 12 e 13 de março. Esperamos realizar esta conferência no futuro, informação que confirmaremos com a maior brevidade possível", pode ler-se.
No nosso país, até ao momento, foram analisados seis casos suspeitos, todos eles com resultados negativos. Surgiu esta manhã mais um caso, no Hospital D. Estefânia, sendo que ainda não se sabem resultados das análises. Ao nível dos 20 cidadãos portugueses repatriados de Wuhan, de quarentena no Hospital Pulido Valente, as primeiras análises manifestaram-se negativas e são repetidas no dia de hoje.
Porquê adiar ou cancelar eventos?
Para perceber o que está em causa nestes cancelamentos ou adiamentos, o SAPO24 falou com o pneumologista Filipe Froes, coordenador do gabinete de crise da Ordem dos Médicos para o Covid-19.
Para o médico, adiar eventos é uma "atitude sensata", um vez que muitas das datas — principalmente no caso de feiras e conferências — podem ser reagendadas. "Os prejuízos de adiar são menores do que os prejuízos de se ter de cancelar", começa por explicar. "São eventos à escala global, a que vão pessoas de outros países, como a China, Japão, Coreia, Tailândia. E isto cria uma situação de desconforto para quem está no país anfitrião do evento e desconforto para quem se desloca".
Assim, descartar eventos marcados para março e abril, sobretudo aqueles que "têm uma forte presença dos países onde se tem manifestado o coronavírus", é uma forma de "adaptar o nível de vigilância". Assim, a nível de exemplo, adiar a feira de telecomunicações em Barcelona é, na opinião do especialista, a atitude correta neste momento. Não porque em Espanha tenham de existir cuidados redobrados dada e epidemia, mas sim pelos viajantes que poderiam chegar.
"Portugal e diferentes países têm uma entidade que monitoriza [os cuidados a ter] de acordo com a ameaça", diz. Por isso, "quando se viaja é necessário adoptar os cuidados de saúde do país a que se chega, é usual haver um painel até nos aeroportos com essas informações", precisa.
Contudo, Filipe Froes refere que não são necessários "comportamentos de histeria", como usar máscaras sem estar em países afetados ou onde o risco de contágio se comece a manifestar. "Essa atitude em Espanha e em Portugal é desnecessária e estamos a gastar recursos que podem ser úteis noutras situações. Se houver um agravamento, nessa altura logo se vê. Se puderem vir a precisar já gastaram a máscara numa altura que não era necessária. Isto é uma atitude que anda de mão dada com a ignorância", explica.
A solução, por isso, é estar atento às principais recomendações sobre o coronavírus.
Adiar ou não. As opiniões divergem
O Mobile World Congress (MWC) não resistiu ao coronavírus, mas a decisão não agradou ao governo espanhol. A associação GSMA decidiu cancelar a maior feira de telecomunicações móveis, cujo início estava previsto para dia 24, em Barcelona, perante as sucessivas desistências dos participantes face ao receio associado ao coronavírus.
Inicialmente, a imprensa espanhola avançou que a associação organizadora tinha decidido, em reunião extraordinária, avançar com a realização do certame, porém, algumas horas depois, acabou por recuar na sua decisão. Empresas como a Ericsson, Sony, Amazon, Intel e LG , Nokia, Vodafone e Deutsche Telekom já tinham anunciado a sua desistência.
Em comunicado, a organização do evento referiu que "com o devido respeito ao ambiente seguro e saudável de Barcelona" neste momento, o MWC Barcelona 2020 seria cancelado "porque a preocupação global com o surto de coronavírus, a preocupação com viagens e outras circunstâncias impossibilita a realização do evento".
No congresso, cujo final estava agendado para dia 27, eram esperados mais de 100 mil visitantes de cerca de 200 países, incluindo cinco a seis mil pessoas da China.
Foi ainda referido que "a cidade anfitriã respeita e compreende esta decisão", não descartando um MWC Barcelona 2021 e outras edições futuras.
Contudo, o Governo espanhol veio reagir ao sucedido, dizendo que a culpa não é do coronavírus. "O Governo manifesta o seu apoio e solidariedade às pessoas afetadas pelo coronavírus em diferentes partes do mundo, especialmente na China. No entanto, considera que não são razões de saúde pública em Espanha que levaram ao cancelamento do MWC", pode ler-se num tweet.
Aliás, assim que surgiram as primeiras notícias sobre um possível cancelamento do evento, Espanha reagiu.
"O Governo entende que não há razões de saúde pública para não realizar tais eventos no nosso país. Espanha possui um Sistema Nacional de Saúde de atenção universal, reconhecido internacionalmente, que oferece garantias de saúde completas em situações como a atual", foi referido em comunicado.
Em Espanha, apenas dois casos positivos de coronavírus foram confirmados em pacientes, em Palma de Maiorca e nas Canárias. Quanto a cidadãos espanhóis repatriados de Wuhan, vinte já receberam alta do hospital Gómez Ulla, em Madrid, onde permaneceram em quarentena, pelo que o país refere que "o nível de alerta na Espanha é considerado baixo".
Mas os organizadores do MCW não estão sozinhos na sua avaliação. Relativamente ao Grande Prémio de Fórmula 1, a Federação Internacional do Automóvel (FIA), juntamente com a Fórmula 1, decidiram aceitar o pedido de adiamento da prova, que estava agendada para o dia 19 de abril, depois de um uma solicitação oficial do promotor do evento, o Juss Sports Group.
“A FIA e a Fórmula 1 continuam a trabalhar em conjunto com as equipas, o promotor e as autoridades da China para avaliar a situação e os seus desenvolvimentos. Todas as partes vão ter o tempo necessário para estudar a viabilidade de possíveis datas alternativas para a realização do Grande Prémio mais tarde no ano, caso a situação melhore”, refere a FIA em comunicado.
No que diz respeito aos torneios de râguebi de sevens, a Federação internacional de râguebi, vê o adiamento dos jogos como "uma resposta às preocupações sanitárias persistentes ligadas à epidemia do novo coronavírus". Prevista para entre 03 e 05 de abril, a etapa de Hong Kong, criada em 1976 e que foi uma das provas que estiveram na origem do circuito mundial, foi adiada para o fim de semana de 16 a 18 de outubro.
A Liga dos Campeões asiática também será afetada, com os jogos que envolvem as equipas chinesas a serem adiados, para já, para abril, com exceção para a equipa do Beijing Guoan, que se encontra instalada na Coreia do Sul, bem como o torneio de qualificação olímpico feminino, previsto inicialmente para Wuhan, epicentro da epidemia, transferido para Sidney, Austrália. Da mesma forma, o arranque do campeonato chinês de futebol, agendado para arrancar em 22 de fevereiro, foi retardado.
Exceção feita, todavia, para os Jogos Olímpicos Tóquio2020. O presidente do comité organizador, Yoshiro Morri, garantiu que não planeia adiar ou cancelar a iniciativa por causa da epidemia do novo coronavírus, criticando os “rumores irresponsáveis” sobre o assunto.
A apenas 162 dias da cerimónia de abertura, têm sido levantadas dúvidas sobre um possível adiamento dos Jogos, que decorrerão em Tóquio, caso o vírus se espalhe a toda a Ásia.
"Gostaríamos de coordenar com o governo nacional e agir com calma", disse Mori durante uma reunião com altos responsáveis do Comité Olímpico Internacional (COI).
Além dos grandes eventos acima referidos, várias feiras de menor importância foram canceladas nas últimas semanas, principalmente na China, por causa da epidemia, entre elas, a feira de arte contemporânea Art Basel, prevista para o final de março em Hong Kong, e a Conferência e Exposição sobre aviação de negócios na Ásia no final de abril em Xangai. Na Europa, as decisões têm sido menos radicais, ainda que uma feira de relógios tenha sido cancelada em Zurique e um fórum de investimentos tenha sido adiado na Rússia.
Estas são as principais recomendações das autoridades de saúde à população
O surto do novo coronavírus detetado na China tem levado as autoridades de saúde a fazer recomendações genéricas à população para reduzir o risco de exposição e de transmissão da doença. Eis algumas das principais recomendações à população pela Organização Mundial da Saúde e pela Direção-geral da Saúde portuguesa:
- Lavagem frequente das mãos com detergente, sabão ou soluções à base de álcool;
- Ao tossir ou espirrar, fazê-lo não para as mãos, mas para o cotovelo ou para um lenço descartável que deve ser deitado fora de imediato;
- Evitar contacto próximo com quem tem febre ou tosse;
- Evitar contacto direito com animais vivos em mercados de áreas afetadas por surtos;
- Deve ser evitado o consumo de produtos de animais crus, sobretudo carne e ovos;
- Em Portugal, caso apresente sintomas de doença respiratória e tenha viajado de uma área afetada pelo novo coronavírus, as autoridades aconselham a que contacte a Saúde 24 (808 24 24 24). Caso se dirija a uma unidade de saúde deve informar de imediato o segurança ou o administrativo.
Combater a desinformação
A Organização Mundial da Saúde tem tentado também divulgar factos para combater a desinformação e mitos ligados ao novo coronavírus. Eis algumas dessas informações:
- É seguro receber cartas ou encomendas vindas da China, porque as análises feitas demonstram que o coronavírus não sobrevive muito tempo em objetos como envelopes ou pacotes;
- Não há qualquer indicação de que animais de estimação, como cães e gatos, possam ser infetados ou portadores do novo coronavírus. Mas deve lavar-se sempre as mãos após contacto direto com animais domésticos, porque protege contra outro tipo de doenças ou bactérias;
- Não há também prova científica de que o consumo de alho ajude a proteger contra o novo coronavírus;
- Usar e colocar óleo de sésamo não mata o novo coronavírus;
- As atuais vacinas disponíveis no mercado contra a pneumonia não previnem contra o coronavírus 2019-nCoV. Este novo vírus precisa de uma nova vacina que ainda não foi desenvolvida;
- Os antibióticos não servem para proteger ou tratar as infeções provocadas pelo coronavírus. Os antibióticos são usados para infeções bacterianas e não virais. Contudo, os doentes hospitalizados infetados com coronavírus poderão ter de receber antibióticos porque pode estar presente também uma infeção bacteriana;
- Pessoas de todas as idades podem ser afetadas pelo coronavírus. Contudo, pessoas mais velhas ou com doenças crónicas (como asma ou diabetes) parecem ser mais vulneráveis a ter doença grave quando infetadas.
O Covid-19
O novo coronavírus, que pode provocar doenças respiratórias potencialmente graves como a pneumonia, foi detetado pela primeira vez no final do ano em Wuhan, na província de Hubei (centro da China).
Desde então, e a par do território continental da China e das regiões chinesas de Macau e Hong Kong, foram confirmados outros casos de infeção do novo coronavírus em mais de 20 países.
A OMS declarou em 30 de janeiro uma situação de emergência de saúde pública de âmbito internacional, o que pressupõe a adoção de medidas de prevenção e coordenação à escala mundial.
A organização das Nações Unidas já apelou à criação de um fundo de 675 milhões de dólares (613 milhões de euros) para combater o surto do novo coronavírus nos próximos três meses.
*Com Agências
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