Depois de António Costa, Graça Freitas foi a mais recente figura de relevo a ser convidada para o programa de Cristina Ferreira, na SIC, no âmbito da atual pandemia da Covid-19.
Durante a entrevista, Graça Freitas abordou o regresso à normalidade, comparando as dificuldades que se deparam no horizonte como "partir uma perna e durante meses aprender a andar”, sendo necessário "treinar novas formas" de coexistir com os outros nos tempos que se prevêem.
“É uma questão de disciplina, de disciplinar-nos para, durante um período das nossas vidas, que não é o seu fim, nos condicionarmos para não fazermos coisas que fazíamos antes”, justificou a diretora-geral da saúde.
Por essa razão, Graça Freitas apelou a que as pessoas não façam grandes planos, mesmo para os meses mais quentes, pois "não há possibilidade de equacionar" se a pandemia estará completamente controlada nessa fase.
"A grande incógnita deste vírus", explicou a responsável, é que outros tipos de coronavírus "têm um comportamento que já conhecemos e são vírus sobretudo do outono e do inverno, que nos deixam em paz durante os meses mais quentes. Este nós não sabemos", sendo "impossível prever”.
Por isso, seja no caso de festas de aniversário ou de casamentos, Graça Freitas apelou a que as pessoas façam celebrações pequenas e comedidas, e que reservem "uma grande festa" para "depois de termos vacina ou de termos cura”. Caso contrário, a diretora-geral da Saúde admite que o trabalho feito até aqui possa ser deitado a perder, sendo essa uma fonte de "receio" para si.
O aspeto do distanciamento no seio das famílias, especialmente no que toca aos seus membros mais velhos, é duro, admite, especialmente tendo em conta que também o pratica na sua vida pessoal, tendo diminuído os contactos com a sua mãe de 90 anos.
"Antes do Covid, obviamente que ia vê-la mais vezes, passava com ela bastantes horas e interagíamos do ponto de vista físico, havia muitos abraços e muitos beijos", disse, sendo que agora vai vê-la menos vezes e sem contacto próximo. "Eu, ao não abraçá-la, estou a protegê-la e vice-versa”, explica, indicando, porém, que as pessoas podem ver-se "com regras".
Essa mensagem, garante, é essencial ser transmitida, não só às pessoas mais vulneráveis, como também às mais novas, pois são aquelas que "se esquecerão destes hábitos", cabendo a quem está no meio um "grande cuidado geracional" para que elas perceberam "que estamos a fazer aquilo por proteção, por amor pelos outros”.
“O que é difícil nestas alturas é o processo de comunicação”
Outro dos tópicos abordados na conversa com Cristina Ferreira foram as críticas a que o seu trabalho tem sido sujeito, quer pela acusação de veicular de informações e conselhos incorretos, quer pelas queixas de ocultação de números de infetados pela Covid-19.
Quanto ao primeiro ponto, Graça Freitas admitiu que "o que é difícil nestas alturas é o processo de comunicação”, pois numa fase de grande incerteza, as pessoas pedem respostas claras onde elas podem ainda não existir e "ir transmitindo ao longo dos dias esta nova aprendizagem não é fácil".
Um dos exemplos abordados foi quando indicou há alguns meses de que a probabilidade da Covid-19 chegar a Portugal seria muito baixa, apelando as pessoas à calma. A este respeito, a diretora-geral da Saúde, reiterou que falou "em probabilidades". "Eu não sou uma pessoa muito determinística, não acho que haja certezas em nada da vida", defendeu Graça Freitas, lembrando que a probabilidade podia ser "maior ou menor " e "daí até à forma como foi interpretada, pode ter havido uma grande diferença”.
Outro dos temas, foi quanto à utilização de máscaras em público, inicialmente desaconselhada pela DGS, mas agora recomendada para espaços públicos fechados depois do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças e da Organização Mundial de Saúde terem agido nesse sentido.
“Temos de ter esta noção que vamos dando informação às pessoas à medida que a vamos sabendo, essa confiança as pessoas têm de ter, de que não estamos a esconder, não lucramos nada em esconder", garantiu a diretora-geral da Saúde. "Para esconder alguma coisa, tínhamos de ter algum ganho e não temos, não há nenhum motivo para esconder nada. Vamos dizendo as coisas à medida que as vamos sabendo e se daí a 15 dias soubermos uma coisa diferente, temos de ter a humildade de dizer que aprendemos alguma coisa e vamos fazer doutra maneira", completou.
A este respeito, a diretora-geral da Saúde abordou os desfasamentos entre os números de casos infetados veiculados pelos municípios e os números apresentados nos boletins diários da DGS. “Se nós às vezes dizemos um número e depois dizemos outro, é porque tivemos a capacidade de o confirmar, ou não, dias depois e este processo leva muito tempo, há muitas pessoas que trabalham desde a meia-noite até à hora a que sai o boletim para ter a certeza que sai o mais próximo possível da realidade", justificou, rematando: “o meu princípio é não dizer coisas que não sei”.
A exposição pública do seu trabalho, diz, "faz parte do tal pacote que veio com o cargo". "Se me perguntasse há três anos se eu gostaria deste nível de exposição, eu diria que não, mas faz parte", afirmou Graça Freitas, dizendo lidar com a pressão "sabendo que não há outra forma".
"Tento relativizar as coisas, tento colher ensinamentos, não sou hermética ao que se diz”, adiantou a diretora-geral da saúde, garantindo ouvir "críticas que não são fáceis de ouvir”, mas também “muita gente que", sem achar que é "perfeita", diz estar a fazer "um trabalho honesto, feito com verdade”.
A vida de quem gere uma pandemia em Portugal
O quotidiano da diretora-geral da Saúde foi outro dos tópicos abordados, com Graça Freitas a admitir que ainda não teve um dia de folga desde o início da pandemia.
Acordando todos os dias antes das seis da manhã, a responsável diz que a primeira coisa que faz é ler para saber "o que é que aconteceu de relevante durante a noite, quer do que é que se passou nos outros países em relação à doença, se saiu algum artigo novo, se saiu alguma notícia importante nos jornais”.
A necessidade de "ver o que é que aconteceu naquelas horas de descanso” é fruto da “muita preocupação em perceber o que é que aconteceu no mundo, na parte social da vida das pessoas, na parte da epidemia mas também na parte da ciência, as pistas que vamos tendo”, disse Graça Freitas.
Apesar das menções à sua aparente fragilidade física, a diretora-geral da Saúde garantiu que vai continuar a trabalhar. “Ninguém é insubstituível e eu sou uma pessoa que se considera absolutamente normal, mas nesta altura acho que faço falta, nem que seja para pequenas coisas. Enquanto conseguir estar do ponto de vista físico, vou estar”.
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