“O parecer [da Procuradoria-Geral da República (PGR), divulgado na sexta-feira] põe de lado que o problema sejam as relações familiares. Resta saber se o negócio foi lesivo para o Estado, com algum tipo de favorecimento. Nesse sentido, aguardamos a averiguação que o Ministério da Administração Interna disse que ia fazer e a Justiça tem também de fazer o seu caminho”, afirmou Catarina Martins aos jornalistas à margem de uma visita à feira da Senhora da Hora, concelho de Matosinhos, distrito do Porto.
Catarina Martins frisou que o BE continua a encontrar “problemas de clareza e transparência” na análise de incompatibilidades de titulares de cargos públicos, esperando por isso que na próxima legislatura sejam dados à Entidade da Transparência, recentemente aprovada no parlamento, os “meios necessários” para “fiscalizar”.
“Sabíamos que a lei era confusa e por isso mesmo foi alterada. Mas continuamos a achar que há um problema de clareza e transparência na análise de titulares de cargos políticos. Por isso, por iniciativa do BE, foi aprovada, no final da legislatura, a Entidade da Transparência”, recordou a coordenadora do BE.
Catarina Martins sustenta que esta entidade, “exterior ao parlamento”, precisa “agora de ter os meios para agir”.
“Temos de prevenir e garantir condições de transparência na nossa democracia”, frisou.
A coordenadora do BE referiu ainda que esta entidade foi “criada para fiscalizar toda a gente com cargos de responsabilidade pública”.
O primeiro-ministro, António Costa, homologou na sexta-feira o parecer da PGR sobre incompatibilidades e impedimentos de políticos, no qual se recusam interpretações estritamente literais - e até inconstitucionais - das normas jurídicas.
De acordo com o gabinete do governante, relativamente a contratos celebrados com familiares do titular de cargo político ou com empresas por eles participadas, a PGR considera que "deve entender-se que o impedimento não abrange os contratos celebrados com toda e qualquer entidade pública, mas apenas os celebrados com entidades que estão sob algum tipo de dependência face ao titular de cargo político".
Após notícias na comunicação social sobre negócios entre governantes e empresas de familiares, designadamente no âmbito da polémica das golas antifumo distribuídas pela Proteção Civil, António Costa pediu, a 30 de julho, um parecer ao Conselho Consultivo da PGR para "completo esclarecimento" sobre os impedimentos de empresas em que familiares de titulares de cargos políticos tenham participação superior a 10% do capital.
O parecer foi, na sexta-feira, publicado no ‘site’ do Ministério Público (MP).
O parecer, na perspetiva do primeiro-ministro, "responde de modo inequívoco às questões que havia colocado", considerando o Conselho Consultivo da PGR que "as normas jurídicas não podem ser interpretadas de forma estritamente literal, devendo antes atender-se aos demais critérios de interpretação jurídica, entre os quais avulta a determinação da vontade do legislador".
No parecer do Conselho Consultivo da PGR considera-se que, nos casos relativos a contratos celebrados com familiares do titular de cargo político ou com empresas por eles participadas, "existe fundamento para […] desconsiderar a letra do preceito na parte em que esta não corresponde ou foi para além do espírito do legislador”.
Ou seja, este entendimento "arreda da sua esfera de abrangência os casos […] em que os concursos públicos foram abertos e tramitaram perante outros órgãos do Estado e/ou pessoas coletivas públicas situadas fora da esfera de ação do governante”.
Afasta também os casos em que “os subsequentes contratos foram celebrados no termo de um concurso, após o escrupuloso cumprimento de todas as formalidades aplicáveis, prescritas pelo Código dos Contratos Públicos".
No parecer, defende-se que a sanção prevista na lei para este tipo de casos, a demissão, "é política e objetiva, mas não é de aplicação automática, carecendo a sua aplicação de um procedimento que assegure, pelo menos, os direitos de audiência e de contraditório".
(Artigo atualizado às 12:22)
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