A requisição civil está definida juridicamente no decreto lei 637/74, da altura do PREC (Período Revolucionário Em Curso), que justifica a criação desta figura legal com a necessidade de assegurar o funcionamento de "certas atividades fundamentais" e para ser utilizada "em casos excecionalmente graves".

Esta lei mantém-se praticamente inalterada desde a sua publicação, em novembro de 1974, cerca de três meses após a entrada em vigor do primeiro diploma que consagrou o direito à greve após a revolução de Abril e enquadrou o seu exercício.

Foi nesta lei da greve que surgiu pela primeira vez uma referência à requisição civil, pois já previa que o governo pudesse determinar, "em circunstâncias particularmente graves, as medidas de requisição e mobilização necessárias para assegurar o funcionamento dos serviços de interesse público e para evitar situação de perigo para a economia nacional.”

Dois anos depois surgiu a Constituição da República de 1976, que afastou a possibilidade de limitação do direito à greve em função dos motivos e elevou este direito “à categoria de direito fundamental dos trabalhadores".

Foi em 1976 que a figura legal da requisição civil foi usada pela primeira vez, tendo sido aplicada ao pessoal de enfermagem dependente da Direção-Geral do Ensino Superior, da Direção-Geral dos Hospitais, da Direção-Geral de Saúde e da Direção-Geral da Previdência, na Zona sul do continente.

Em 1977 foi publicada uma nova Lei da Greve, que revogou a anterior e que vigorou até à publicação do Código do Trabalho em 2003.

Mas, o regime legal da requisição civil continuou inalterado desde 1974, tendo tido apenas uma mudança em 1979, no artigo relativo à eventual necessidade de intervenção das forças armadas em situações de requisição civil.

Em 1988, o Partido Socialista apresentou no parlamento um projeto de lei para alterar a lei de 1974, que estabelecia que o recurso à requisição civil apenas seria permitido quando em situações de greve houver incumprimento por parte dos trabalhadores ou das associações sindicais dos deveres de prestação dos serviços mínimos indispensáveis.

O projeto de lei foi votado na generalidade a 9 de março de 1989, tendo sido rejeitado com os votos contra do PSD e com a abstenção do CDS.

Assim, o regime legal da requisição civil manteve-se até hoje, originando, sempre que é utilizado, dúvidas e interpretações diferentes por parte dos especialistas em direito do trabalho (juslaboristas), que o articulam com o restante ordenamento jurídico.

Com o dever da prestação dos serviços mínimos durante as greves, definido no Código do Trabalho (CT), muitos juslaboristas têm defendido que a requisição civil é a única forma de o assegurar, em casos de incumprimento.

A lei de 1974 enumera os serviços ou as empresas sujeitas à requisição civil, nomeadamente o abastecimento de águas, o serviço de correios e de comunicações telefónicas, telegráficas, radiofónicas e radiotelegráficas, o serviço de transportes terrestres, as minas essenciais à economia nacional, a produção e distribuição de energia elétrica, a exploração, transformação e distribuição de combustíveis destinados a assegurar o fornecimento de indústrias, os portos, a transformação e distribuição de produtos alimentares, a prestação de cuidados hospitalares, médicos e medicamentosos ou a salubridade pública.

No CT, são considerados como necessidades sociais impreteríveis os serviços de correios e telecomunicações, os serviços médicos, hospitalares e medicamentosos, a salubridade pública, os serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis, o abastecimento de águas e os transportes.

Tendo em conta que a definição de necessidades impreteríveis pouco mudou, apesar das mudanças na legislação laboral, vários especialistas têm defendido que a requisição civil só pode ser utilizada para assegurar de facto a prestação dos serviços mínimos nas atividades que satisfazem necessidades sociais impreteríveis e não para assegurar funcionamento de serviços essenciais de interesse público ou de setores vitais da economia nacional.

Especialistas em direito do trabalho, como Jorge Leite, Monteiro Fernandes e José João Abrantes, têm defendido que a requisição civil é admissível quando não são cumpridos os serviços mínimos decretados para uma greve em concreto.

Estes professores de direito do trabalho foram citados, a propósito, numa tese de mestrado de Maria João Carvalho Lopes, apresentada em 2015 na Universidade Católica do Porto, intitulada "Algumas considerações em torno da requisição civil".

A autora concluiu no seu estudo que a requisição civil, tal como está definida e regulada no DL 637/74, "já não se encontra enquadrada no nosso sistema jurídico", porque posteriormente surgiram outros diplomas legais, nomeadamente a Lei 65/77, a Constituição da República de 1976, as revisões constitucionais de 1982 e 1997, que introduziram importantes alterações no domínio da greve, e o CT.

"Com todas estas alterações, o regime da requisição civil ficou inalterado. Pese embora, ser um mecanismo cada vez menos utilizado, (...), a sua aplicabilidade prática pode, em tempos de crise e conflito social (...) desencadear mais conflituosidade, tendo em conta a ambiguidade do regime deste procedimento", considerou.

Para Maria João Lopes, "apesar do próprio diploma também contemplar a excecionalidade do mecanismo, impõe-se uma clarificação do regime".

"O âmbito da requisição civil deve focar os setores de atividade de forma mais atual, nomeadamente, fazendo uma aproximação ao art. 537.º do CT, para que desta forma haja maior sincronia e harmonização legislativa. Por outro lado, as requisições preventivas devem ser proibidas. Defendemos que o Governo, pode, em casos excecionais e de ponderosa necessidade, equacionar o pedido de requisição civil. Contudo, a concretização administrativa só pode ocorrer com o incumprimento dos serviços mínimos, e desde que, esse incumprimento possa pôr em risco os direitos fundamentais dos cidadãos, defendeu.

A última requisição civil tinha sido decretada há pouco mais de quatro anos, em dezembro de 2014, pelo Governo PSD/CDS, que usou a lei de 1974 para decretar uma requisição civil aos trabalhadores da TAP, que tinham quatro dias de greve marcados para o final do ano.

O "caráter excecional" da requisição civil está garantido no diploma, que, ao longo dos 45 anos de democracia e da consagração do direito à greve, já foi usado 30 vezes para pôr cobro a paralisações prolongadas na Carris, no Metro, na CP e na TAP.

Além destas 30 requisições civis a trabalhadores em greve, em Portugal ocorreu outra, com outro fim em 1980, nos Açores.

Esta requisição civil, de janeiro de 1980, foi decretada para requisitar "terrenos e edifícios não utilizados ou subutilizados nos concelhos de Angra do Heroísmo e da Vila da Praia da Vitória, na ilha Terceira, da Calheta, na ilha de S. Jorge, e da Graciosa" para realojar as pessoas lesadas pelo sismo que ocorrera no primeiro dia do ano e para garantir a continuidade dos serviços públicos.