Naquele que é dos maiores mercados ao ar livre no distrito de Aveiro e no Norte do país, Hélder Silva e Maria Rocha circulavam devagar, de mão dada, ao ritmo de uma segunda-feira considerada feriado, já que na região é habitual a folga da Sexta-feira Santa ser trocada pela segunda-feira após a Páscoa.
Ele apreciou o ambiente “sossegadinho” do mercado e partilhava da satisfação dos comerciantes ao defender que “toda a gente precisa de trabalhar”, e ela ia escolhendo para os filhos alguns ‘boxers’ e pijamas, depois de quase três meses à espera de poder adquirir esses artigos ao vivo, por não apreciar compras do género através da Internet.
“Fui remediando e evitava sair ao máximo, porque tinha que me proteger a mim e aos meus. Agora que os meus filhos vão para a escola é que precisam de um bocadinho mais de conforto, com roupas ao tamanho deles”, explica Maria Rocha.
Uma das comerciantes que sabe como os pais com crianças em rápido crescimento estavam particularmente desesperados por roupas maiores é Adriana Dias, que já não montava banca em Espinho desde o início do ano e, desde então, só se conseguiu sustentar “com as poupanças”.
Esta manhã não estava particularmente entusiasmada com a afluência “porque as pessoas já gastaram o dinheiro na Páscoa e depois não sobrou tanto” para compras na feira semanal, mas realçava um aspeto positivo: “Notei que as pessoas realmente têm saudades nossas e isso é muito bom”.
Paula Cavado foi uma das clientes que reconheceu que o mercado de Espinho lhe fez falta pelo tipo de serviço que vem justificando a sua fidelidade. Logo depois de comprar umas sapatilhas para a filha mais nova, justificou porque é que não o fizera no comércio ‘online': “O número que ela calça engana muito, nunca é certo e depende do modelo do calçado. Prefiro ir a uma pessoa a quem costumo comprar e depois ter a possibilidade de trocar facilmente”.
Os riscos de contágio em tempo de pandemia não a preocupam demasiado. “[Aqui] Não está muito movimento, há muitos lugares vazios porque muitos comerciantes ainda não vieram hoje, podemos dar sempre o espaço de segurança e o pessoal anda praticamente todo de máscara, portanto acho que é seguro”.
Carla Nunes, que vende tapetes e outros têxteis para o lar, concorda com a perspetiva sanitária, mas, apesar de ter despachado algumas encomendas a clientes fixos durante a paragem comercial dos últimos meses, mostrou-se desanimada quanto à recuperação do negócio.
“Isto está parado, como a gente já estava a calcular”, declarou, atribuindo a situação a diversos fatores: “As pessoas têm certos receios [relativos à covid-19]; havia a indicação de que a feira não era para ser efetuada hoje e depois isso mudou, mas muita gente não teve conhecimento; com a proibição entre concelhos as pessoas têm medo de arriscar porque as multas são caras”, etc.
Na banca em frente, uma colega que a ouve tenta animá-la e incutir-lhe um discurso mais otimista, mas Carla ainda está magoada por as feiras serem sempre “as primeiras” áreas de atividade que o Estado encerra quando há confinamento e, além disso, também lamenta a situação de comerciantes conhecidos que, sem os mercados, “tiveram que cessar atividade e procurar outros trabalhos” para sobreviver.
O argumento da vendedora é que as restrições impostas por Governo e autarquias não acautelaram a especificidade dos negócios ao ar livre. “Podiam ter agido de maneira diferente, alternando certos setores” em sucessivos dias de mercado, como aconteceu em algumas feiras que, por terem adotado um sistema intercalado, “nunca chegaram a parar”.
Procurando levar o dia com mais humor, Hugo Queirós escolheu para a sua jornada de trabalho uma máscara de proteção que replica o rosto de um macaco e depois, entre camisolas de futebol, porta-moedas em cortiça, bijuteria e lembranças de Portugal, falou a sério.
“A vacina está a andar, uma percentagem da população já está vacinada e tenho fé que isto vá melhorar. O Governo que faça o que tem que ser feito. Compreendo porque estivemos em confinamento, acho que foi justificado? Se for preciso fazê-lo outra vez, que o façam. Não sou do contra – sou pela vida”, proclamou.
A data para a reabertura das feiras e os mercados de venda de produtos não-alimentares, cuja realização se encontrava suspensa desde 15 de janeiro devido à pandemia de covid-19, foi anunciada a 11 de março e reafirmada na quinta-feira, pelo Governo, mas a medida fica sujeita a autorização municipal, à semelhança do que já aconteceu no primeiro confinamento, em 2020.
De acordo com a agência noticiosa francesa AFP, a pandemia de covid-19 já provocou quase 2,854 milhões de mortes em todo o mundo, na sequência de mais de 131 milhões de casos de infeção desde a descoberta do vírus SARS-CoV-2 em dezembro de 2019.
Em Portugal, o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde indica que a doença já causou 16.879 óbitos entre 823.335 infeções confirmadas.
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