Lee Hsien Yang, um dos filhos do antigo primeiro-ministro de Singapura, Lee Kuan Yew, recebeu asilo no Reino Unido após fugir do que afirma ter sido "uma campanha de perseguição" no seu país.

Em entrevista ao The Guardian, Hsien Yang contou que o regime autoritário fundado pelo pai, que morreu em 2015, e herdado pelo irmão, voltou-se contra ele após juntar-se a um partido da oposição depois de uma desavença familiar.

"Apesar da prosperidade económica muito avançada que Singapura tem, há um lado obscuro nisso. O Governo é repressivo”, afirmou. “As pessoas pensam que é algum tipo de paraíso, mas não é", continuou.

Sob o Governo do irmão, que foi primeiro-ministro durante 20 anos e até maio de 2024, Lee Hsien Yang alega que as autoridades usaram o que ele chamou de "alegações infundadas" contra ele, contra a sua esposa e contra o seu filho para mover uma série de ações judiciais.

"Escalou a ponto de eu acreditar que, para a minha própria segurança pessoal, eu não deveria continuar a viver em Singapura", confidenciou Lee.

Nos últimos anos, as finanças de Singapura têm estado envolvidas em escândalos de corrupção internacionais. "As pessoas precisam de olhar além das afirmações ousadas e falsas de Singapura e ver como é realmente a realidade", disse o singapurense.

"É necessário que o mundo olhe mais de perto para ver o papel de Singapura como facilitador fundamental do comércio de armas, do dinheiro sujo, do dinheiro das drogas e das criptomoedas”, denunciou ainda.

O país tem, atualmente, uma posição favorável no índice de perceção de corrupção da Transparência Internacional, mas o diretor de política do barómetro no Reino Unido, Duncan Hames, alerta: "Pode parecer que os países não têm problemas de corrupção doméstica, mas ainda assim desempenharem um papel fundamental em permitir redes corruptas noutros lugares".

"O papel regional de Singapura como um grande centro financeiro torna-a atraente para aqueles que procuram movimentar ou esconder fundos ilícitos", explicou.

O pai de Lee Hsien Yang, Lee Kuan Yew, tornou-se primeiro-ministro de Singapura em 1959. A partir daí, transformou uma Singapura pobre numa potência económica e garantiu a independência da antiga colónia britânica.

Por outro lado, ordenou a detenção de centenas de figuras da oposição, impôs restrições à imprensa e às liberdades sociais, e estabeleceu um Governo de partido único, ficando conhecido como "o ditador democrático favorito do mundo".

Em 1990, Kuan Yew deixou o cargo, mas manteve-se enquanto ministro até 2004. Naquele ano, o seu filho mais velho, Lee Hsien Loong, tornou-se primeiro-ministro.

Enquanto isso, Lee Hsien Yang estudou em Cambridge e serviu no exército. Depois de se aposentar, assumiu posições de liderança em algumas das maiores empresas privadas de Singapura.

Contudo, a morte do patriarca, em 2015, desencadeou uma desavença familiar sobre o que fazer com a sua casa.

Lee Kuan Yew tinha deixado claro que queria que a casa fosse demolida quando a sua filha mais nova, Lee Wei Ling, deixasse de ali viver, o que a própria e Lee Hsien Yang respeitaram. No entanto, Lee Hsien Loong, então primeiro-ministro, alegou que o pai estava aberto a que o Governo decidisse o que fazer com a casa.

Nos anos que se seguiram, o desentendimento sobre a casa transformou-se numa série de processos judiciais.

Em 2017, um dos filhos de Lee Hsien Yang foi acusado de "ridicularizar a Justiça" do país ao comentar no Facebook que Singapura tinha um "sistema judicial flexível". Condenado, o filho teve de pagar uma multa de 15.000 dólares de Singapura (10.532 euros).

Já em 2018, o Procurador-Geral de Singapura entrou com uma ação disciplinar contra a esposa de Lee Hsien Yang. Lee Suet Fern, advogada de sucesso, foi acusada de agir de forma imprópria em relação ao testamento do sogro e foi suspensa durante 15 meses.

Hoje em dia, o casal está a ser investigado por suposto perjúrio. De acordo com Lee Hsien Yang, as alegações mais recentes são claras tentativas de destruí-lo.

À publicação, o singapurense referiu que é um dos alvos do "sistema de vigilância muito extenso" de Singapura, o que o motivou a procurar asilo em agosto, dois anos depois de deixar o seu país de origem.

Questionado sobre o papel do irmão nesta alegada perseguição, afirmou: "Na minha opinião, num país rigidamente controlado como Singapura, este tipo de ações não poderiam ter acontecido sem o consentimento de Lee Hsien Loong".

Recentemente, um porta-voz do Governo garantiu que Lee Hsien Yang e a sua família “são e sempre foram livres de voltar para Singapura". No entanto, referiu: "Em Singapura ninguém está acima da lei. Qualquer um, incluindo os descendentes do primeiro-ministro fundador, pode ser investigado e julgado em tribunal".