“Terão ardido milhares” de colmeias e cortiços, segundo uma estimativa provisória à agência Lusa do apicultor António Carvalho, presidente da Cooperativa Lousãmel, a entidade que gere a Denominação de Origem Protegida (DOP) da Serra da Lousã.
Às colónias de abelhas dizimadas pelo fogo, soma-se, em toda a região demarcada, um número igualmente elevado de apiários cuja flora em redor foi reduzida a cinzas.
As abelhas “morrerão de fome” se não forem alimentadas artificialmente no local pelos proprietários ou objeto de transumância.
“A flora não vai recompor-se no espaço de três anos”, disse à Lusa António Carvalho. A Lousãmel, com sede na Lousã, tem cerca de 450 associados em diferentes concelhos.
A cooperativa assume a gestão da DOP Serra da Lousã, que abrange 10 municípios: Arganil, Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos, Góis, Lousã, Miranda do Corvo, Pampilhosa da Serra, Pedrógão Grande, Penela e Vila Nova de Poiares, nos distritos de Coimbra e Leiria.
“Vou propor à direção que a venda dos materiais apícolas seja a um preço mais acessível para os sócios afetados pelos fogos”, anunciou o presidente da Lousãmel.
A diretora executiva da empresa, Ana Paula Sançana, salientou que os incêndios registados na região, desde o dia 17, quando morreram 64 pessoas devido ao fogo que eclodiu no concelho de Pedrógão Grande, “destruíram pelo menos 30% dos pastos” da DOP, com “graves reflexos nos ecossistemas” e na economia.
Na região demarcada, além de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, onde o fogo lavrou durante vários dias e teve consequências mais trágicas, foram também afetados os concelhos de Arganil, Góis, Pampilhosa da Serra e Penela.
“Foi um passo muito negativo” para o futuro da apicultura na Serra da Lousã, pelo menos até ao fim da década, disse.
Ana Paula Sançana realçou que morreram igualmente “milhões de outros insetos que fazem a polinização” de espécies, como as urzes, o castanheiro e o medronheiro, entre outras, cujos néctares e pólenes são determinantes para a qualidade do mel DOP.
“Também por isso, a regeneração destas espécies vai ser muito mais lenta”, sublinhou.
Luís Estêvão é o presidente da Cooperativa Pampimel, que conta cerca de 70 associados no concelho da Pampilhosa da Serra, onde arderam 150 colmeias e cortiços, e cerca de 600 unidades ficaram sem alimento.
“Nalguns casos, num raio de cinco a seis quilómetros, não há nada”, afirmou, indicando que os apicultores “ainda conseguiram salvar muitas colmeias”.
Devido à seca dos últimos meses, os produtores já contavam com uma baixa na produção de mel na Serra da Lousã.
Os incêndios vieram agravar as previsões: “Vai haver uma redução nesta campanha e as quantidades vão ser afetadas nos próximos anos”, segundo Luís Estêvão.
Também o seu pai perdeu duas unidades apícolas.
“É urgente alimentar” os enxames sem pasto, recorrendo a produtos artificiais, mas os seus donos “vão ter de arranjar alternativa para as mudar”, defendeu, por sua vez, o presidente da Câmara da Pampilhosa da Serra, José Brito, proprietário de meia centena de colmeias.
O autarca do PSD, antigo presidente da assembleia geral da Lousãmel, estima que as chamas tenham consumido 25% da área do concelho.
“Mas, felizmente, três quartos do território ainda estão verdes”, o que permite realizar a transumância dentro dos limites do município.
José Brito manifestou algum otimismo quanto à regeneração do coberto vegetal: “Vai demorar tempo para conseguirmos normalizar esta atividade importantíssima, mas as plantas queimadas poderão rebentar daqui a um ano”.
A Câmara Municipal “vai comprar alguns produtos” para ajudar a alimentar as colmeias nesta fase.
A autarquia espera ser ressarcida das despesas pela Administração Central. “Se não conseguirmos esse apoio, suportamos nós os encargos”, adiantou à Lusa.
Almerindo Costa, presidente da Associação de Apicultores Serramel, que reúne 70 produtores e organiza a feira do mel do Espinhal, disse que o fogo destruiu 85 colmeias e cerca de 70 cortiços no concelho de Penela.
“Este ano já vai ser mau” em termos de produção e a destruição de extensas áreas florestais onde predominam as urzes “vai ter impacto” durante alguns anos nas quantidades de mel colhidas.
Na sua opinião, “tudo vai depender do rebentamento da flora”, a partir da próxima primavera.
Os incêndios que deflagraram na região Centro, no dia 17, provocaram 64 mortos e mais de 200 feridos e só foram dados como extintos uma semana depois, no sábado.
As chamas consumiram 53 mil hectares de floresta, o equivalente a 75 mil campos de futebol.
A área destruída por estes fogos corresponde a praticamente um terço da área ardida em Portugal, em 2016, que totalizou 154.944 hectares, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna divulgado pelo Governo em março.
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