O fogo andou às portas da aldeia de Arganil, no concelho de Mação, na tarde de terça-feira, mas desde domingo que Celeste não consegue descansar e mesmo hoje, com uma das colunas de fumo já bem longe da povoação, a mulher de 74 anos ainda anda preocupada.
"Esta noite andei sempre por aí a ver se havia reacendimentos. Isto está muito perigoso", conta à agência Lusa Celeste Farinha, que desde domingo está sem telemóvel e sem telefone - mais uma preocupação.
Na terça-feira, teve tudo preparado - "documentos e mala" - para o caso de ter de fugir de casa, mas quando lhe perguntaram se era "cardíaca", ainda mentiu e disse que "não", com medo de a tirarem da aldeia onde nasceu.
"Não vale a pena estar aí a morrer aos bocadinhos. Pensei: 'há de ser o que Deus quiser'", sublinha Celeste, que ainda esteve fechada dentro de casa na hora de maior fumo.
Para combater o medo, a mulher de Arganil virou-se para a fé e diz que andou os três dias "sempre com Deus na boca, sempre com o sagrado coração de Jesus na boca".
"Se Deus não nos acudir, quem é que nos acode?", pergunta Celeste, que apesar de ter andado sempre com "Deus no pensamento", o momento não foi para rezar.
"O 'stress' é tão grande que não dá para isso", refere a reformada, que ainda não está recomposta do "susto".
Entre Arganil e Moita Recome, Manuel Martins caminha pela estrada enquanto olha para árvores e terrenos queimados à procura de reacendimentos.
"Até agora são só fumarolas, mas ainda não dá para descansar, que se há um reacendimento está ali uma boa parte que não ardeu", vinca o operário têxtil, que vive em Lisboa, mas que tem uma casa de segunda habitação, que era dos seus pais, em Arganil.
Naquela aldeia, Manuel sublinha que as chamas ainda estiveram "muito, muito perto de uma casa" e, por agora, toda a atenção é pouca para se garantir que não arde mais.
"Isto foi meia hora muito difícil", frisa Abílio Martins, de 60 anos, que carrega um balde de pequenas maçãs das poucas macieiras que escaparam ao incêndio para dar às cabras, que perderam agora todo o pasto.
O trabalhador agrícola de Moita Recome viu as chamas a consumir umas habitações abandonadas e garante que se não fossem as descargas dos meios aéreos casas habitadas também teriam sido destruídas.
"Defendemo-nos como pudemos", afirma Abílio, que agora faz contas ao prejuízo das chamas que lhe roubaram "grande parte do sustento".
"Como vai ser a partir daqui?", pergunta o habitante de Moita Recome, que também em 2003 viu os seus terrenos arderem.
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