A manifestação de hoje, organizada, como habitualmente, pela Assembleia Nacional Catalã, uma plataforma da sociedade civil, teve como mote a frase “Voltamos às Ruas”, mas mobilizou 62 mil pessoas em Barcelona, depois de há um ano terem sido 115 mil os participantes, segundo a polícia municipal.
O número avançado pela polícia é o mais baixo em mais de uma década (excetuando os anos da pandemia) e está longe da mobilização alcançada entre 2012 e 2018, quando o Dia Nacional da Catalunha (a Diada) se transformou numa jornada de reivindicação da independência e as manifestações levaram às ruas centenas de milhares de pessoas, superando um milhão em alguns anos.
As manifestações da Diada pela independência perderam poder de mobilização nos últimos anos, após a tentativa falhada de autodeterminação de 2017.
Além das manifestações, também os partidos independentistas têm perdido terreno e nesta Diada de 2024 a Catalunha tem pela primeira vez em 14 anos um governo não separatista, liderado pelo socialista Salvador Illa. Pela primeira vez em mais de 40 anos de democracia em Espanha, não há sequer um membro no governo regional que seja de um partido separatista.
“Há desgaste, cansaço, não se vê um caminho claro [no independentismo]”, diz à Lusa Dolors, de 62 anos, para explicar a menor mobilização nas manifestações dos últimos anos.
Para esta reformada catalã, “os partidos independentistas estão a pagar a repressão” que se seguiu a 2017 e “não estão neste momento preparados para avançar com um caminho claro”, sendo públicas as crises internas dentro das forças independentistas e as divisões entre elas.
Con tudo isto, “não é que haja menos independentistas, mas estão frustrados, parados e dececionados”, acrescenta, sentada na praça do Arco do Triunfo de Barcelona, o mesmo local onde há um mês o separatista e antigo presidente catalão Carles Puigdemont, alvo de um mandado de detenção em Espanha desde 2017, fez um pequeno comício antes de ter fugido de novo à polícia. Um mês depois, foi este o local escolhido para a manifestação da Diada deste ano.
“Puigdemont demonstrou que ainda estamos aqui. Como nós hoje. É uma mensagem simples”, diz Anna, 63 anos, sentada ao lado de Dolors.
Anna é independentista e de esquerda, mas elogia a atitude de Puigdemont, um independentista de direita.
“A esquerda independentista está órfã e por isso não foi votar em maio”, acrescenta, para explicar o resultado das últimas eleições autonómicas, em que os socialistas foram os mais votados e a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), que estava à frente do executivo regional, foi relegada para o terceiro lugar.
A ERC viabilizou os governos espanhóis do socialista Pedro Sánchez em Madrid em troca de indultos e uma amnistia para dirigentes separatistas, assim como outras questões relacionadas com as tutelas autonómicas ou de ordem orçamental que, para Dolors e Anna, ficaram, na realidade, em “águas de bacalhau” e não trouxeram vantagens à Catalunha ou à causa independentista.
Opinião diferente tem outro grupo de amigos, também independentista mas de outra geração, sentados na mesma praça do Arco do Triunfo de Barcelona.
Para Olivia, 18 anos e com uma bandeira independentista da Catalunha a cobrir-lhe as costas, “muitos não se sentem representados no comportamento de Puigdemont” depois de 2017 e episódios como aquele que protagonizou há um mês em Barcelona que “causam muitos danos” à causa separatista.
Para além do comportamento de Puigdmont, Olivia e os amigos Albert e Daniel, de 18 e 16 anos, consideram que a causa independentista está neste momento prejudicada pelas divisões entre partidos e movimentos e pelo crescimento do populismo e da extrema-direita, que tem ganhado seguidores entre os jovens da mesma idade, sobretudo, por causa das redes sociais.
“Tudo isto causa muito dano”, repete Olivia.
A poucos metros Anna acrescenta algo com que todos estão de acordo: “Temos de refazer o caminho [para a independência]. Voltaremos a fazê-lo”.
*Margarida Pinto, da Agência Lusa
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