“Não há nenhum documentário. O contrato que foi assinado e que foi tornado público está errado, não é nada daquilo que vai acontecer”, disse à Lusa Luís Capucha, investigador do Centro de Investigação em Estudos de Sociologia (CIES) do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa e coordenador da equipa encarregada de elaborar a candidatura da tauromaquia a património cultural imaterial de Portugal.
A atribuição da tarefa resulta de um protocolo com a Direção-Geral de Património Cultural (DGPC) que, por não ter capacidade para desenvolver o trabalho por si própria, o encomendou ao CIES, para dar cumprimento a um dos projetos vencedores do Orçamento Participativo de 2017, que era precisamente o de elaborar essa candidatura, tendo um valor de 200 mil euros.
Na sequência de uma notícia de hoje do jornal ‘i’, que dava conta do contrato no qual se prevê a realização do documentário, o partido Pessoas, Animais e Natureza (PAN) exigiu saber por que é que uma universidade pública vai pagar por ajuste direto um documentário para promover a tauromaquia e questionou o Governo sobre os motivos desse contrato.
Luís Capucha negou que haja qualquer financiamento do ISCTE a esse trabalho, explicando que o que está previsto é a criação de uma plataforma eletrónica que funcione como repositório de material relativo à tauromaquia e a produção de um “pequeno registo filmado da síntese de todo o material recolhido” - uma vez que as orientações são para privilegiar o recurso a suportes de imagem e audiovisuais em detrimento do texto - e “não um filme para televisão”.
Segundo o contrato, o ISCTE iria pagar cerca de dez mil euros, mais IVA, pela produção do documentário, mas Luís Capucha garante que isso é um erro, que o valor diz respeito à elaboração da plataforma eletrónica e do filme síntese do trabalho, mas que o custo é assegurado pelas verbas previstas no Orçamento Participativo, não havendo qualquer financiamento por parte da universidade e cabendo à DGPC a responsabilidade de adiantar as verbas necessárias à execução do projeto.
“O contrato é equívoco, reconheço, mas sobre isso não posso adiantar muito, terei de falar com os serviços do ISCTE. Fala da produção de um filme, de um documentário de televisão, e não é de todo esse o objetivo e nem sequer a plataforma de acesso aberto. Terá uma parte aberta para quem quiser depositar material. Mas os sítios onde vão estar guardados não são de acesso a aberto”, disse Luís Capucha, que apontou ainda outros erros no contrato “que têm que ser revistos”, como a duração do projeto para o qual foram contratados quatro investigadores e que será até outubro de 2019 e não de três meses, como consta.
“O que posso assegurar sob palavra de honra é que a ideia da promoção de um filme para passar na televisão ou de uma plataforma aberta para promover a tauromaquia ou fazer propaganda é contrária ao que queremos fazer. O objetivo é entregar uma candidatura para que a tauromaquia possa vir a ser reconhecida como património cultural imaterial de Portugal”, acrescentou.
Luís Capucha defendeu o “rigor e qualidade científica” do CIES neste como noutros projetos, garantindo que não há um ponto de vista ou orientação prévia para a recolha de material e elaboração da candidatura, e que as visões contrárias serão incluídas no trabalho que vai “olhar para a tauromaquia no seu conjunto, incluindo as diferentes perspetivas a respeito da festa de toiros”.
“Não é uma matéria excluída e está explicitamente designada no contrato”, disse, defendendo ainda que “a ciência não pode estar cá sujeita a princípios ideológicos que dizem o que se pode estudar e o que não se pode” e que “não há nenhuma razão para excluir a tauromaquia só porque alguns não gostam”.
“Há sempre uns indivíduos que são contra. Censores não é uma invenção de agora. O PAN e o Bloco de Esquerda gostam de se armar em censores da tauromaquia. Isso não é uma coisa de agora, mas nós vamos, naturalmente, considerar essas atitudes de condenação, porque existem e fazem parte da realidade”, disse ainda o professor do ISCTE.
(Notícia corrigida às 15h34 de 10/10/2018: Correção no primeiro parágrafo da informação sobre o contrato assinado pelo ISCTE. O contrato foi assinado com a empresa a quem foi adjudicada a criação de uma plataforma informática e não com a Direção-geral do Património Cultural)
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