No ITQB faz-se sobretudo investigação fundamental, a ciência que é a base do conhecimento, que abre caminhos para as descobertas e para aplicações concretas, que nem sempre estão na cabeça dos investigadores ou são óbvias e conhecidas quando estes se decidem a estudar algo.
“Nós fazemos investigação fundamental, porque acreditamos que a investigação fundamental é a base das aplicações do futuro. Nós trabalhamos para o futuro e não necessariamente para o presente. A investigação fundamental é reconhecida como a base dessas aplicações, mas também da cura das doenças, da criação de valor, etc. […] É uma investigação baseada em curiosidade, mas, obviamente, em coisas importantes que é necessário compreender”, disse à Lusa o diretor do instituto, Cláudio Soares.
Entre os projetos de investigação que os cerca de 500 investigadores do ITQB atualmente têm em mãos está a resistência a antibióticos e o desenvolvimento de novos medicamentos. O objeto de estudo tornou-se mais comum e mediático com a crescente resistência aos antibióticos, que já se tornaram completamente ineficazes contra algumas bactérias, mas quando a investigação surgiu, há décadas, era um território desconhecido.
“Muitas vezes ninguém sabe quais são as aplicações do futuro, a questão é essa”, disse Cláudio Soares, que explicou que a investigação em curso é “eminentemente fundamental, mas tem implicações bastante imediatas na compreensão de como é que a resistência aos antibióticos surge e em como é que se pode tentar reduzir este problema”.
A passagem da investigação fundamental a aplicações concretas exige tempo e “maturação”, mas do ITQB, que se dedica à química e às ciências da vida, já saíram alguns resultados bastante concretos, como a sequenciação do genoma do sobreiro, a “árvore nacional e uma árvore estratégica do ponto de vista económico”, sendo um avanço que pode permitir perceber de que forma pode ser possível melhorar a árvore.
Mas saem também empresas em fase de lançamento, como uma ‘startup’ recentemente comprada por uma empresa norte-americana e que desenvolve trabalho na aplicação médica do monóxido de carbono, uma molécula que ingerida em grandes quantidades é letal, mas que em quantidades doseadas e direcionadas para certas zonas do organismo humano “pode permitir curar doenças”, com impacto sobretudo em doenças inflamatórias, mas possivelmente também em infecciosas.
“As aplicações das coisas que fazemos demoram tempo, temos que estudar e precisamos de vários atores, precisamos de nós, são precisas as empresas”, disse Cláudio Soares.
As empresas estão cada vez mais próximas dos centros de investigação, disse o diretor do ITQB, e trabalham cada vez mais em parceria com as instituições, sendo disso exemplo a união deste instituto a um conjunto de empresas para criar uma incubadora de empresas na área das ciências da vida.
Em Elvas, o ITQB prepara-se para abrir um laboratório colaborativo dedicado à ciência de plantas, em conjunto com a farmacêutica Bayer, a Syngenta, especializada em produtos agroquímicos, e outras empresas e associações de agricultores e industriais do setor.
Vender o produto destas investigações é um campo em crescente profissionalização na ciência, que precisa de intermediários para chegar às empresas e fazer a ponte necessária para a transferência de tecnologia para o mercado.
Mas recentemente, o ITQB, que é também uma instituição de educação, com programas de mestrado e doutoramento, decidiu formar os seus investigadores em gestão e negócios na área tecnológica e aliou-se à faculdade de economia da universidade, a NOVA SBE, para um programa de pós-graduação, cuja segunda edição arranca já em janeiro, e que quer formar investigadores capazes de vender o seu próprio conhecimento.
O financiamento competitivo, resultante de bolsas de investigação e da ligação às empresas, representa 80% do total dos cerca de 16 milhões de euros anuais do orçamento do instituto, com apenas três milhões de euros a terem origem no financiamento público da universidade.
“Um número impressionante”, sobretudo quando comparado com a realidade nacional, possível porque toda a gente “dá o litro para obter financiamento para trabalhar e expandir a instituição”, refere Cláudio Soares, que ainda assim gostaria de ter mais financiamento, ao nível de outros sistemas científicos com os quais Portugal se quer comparar.
“Deem-nos dinheiro e liberdade e nós seguimos o nosso caminho. Nós sabemos para onde queremos ir”, disse.
Na cerimónia que hoje decorre, para além de uma conferência pelo Prémio Nobel da Química 2002, Kurt Wütrich, responsável pela aplicação da ressonância magnética nuclear às moléculas biológicas, a Universidade Nova de Lisboa homenageia ainda, com a entrega da medalha de mérito a título póstumo, o professor António Xavier, que lançou as bases do ITQB.
"António Xavier pensou esta instituição e levou-a até à Universidade Nova de Lisboa. Foi um homem extraordinário que pensou uma instituição aberta, de excelência, numa altura em que era difícil pensar instituições dessa natureza em Portugal. Era um bioquímico que se dedicava à ressonância magnética nuclear”, disse Cláudio Soares, que adiantou ainda que será também homenageado o professor Carlos Portas, “que teve também um percurso importante na criação do ITQB”.
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