"Se começar a comprar, não terei recursos para me candidatar outra vez", comentou o chefe de Estado, enquanto percorria o piso de entrada da quase centenária livraria Argosy, que ocupa um edifício de seis andares no centro de Manhattan.
Pouco depois, ao folhear velhos livros em português e manuais de direito, alguns do século XVII, perante Judith, Naomi e Adina, três irmãs que mantêm em atividade este negócio familiar fundado pelo seu pai, Louis Cohen, em 1925, Marcelo Rebelo de Sousa tentou adivinhar o preço de um deles: "3500 dólares".
Afinal, custava três vezes menos, e uma das irmãs sugeriu-lhe que "pode usar o resto na campanha". O Presidente da República retorquiu: "Eu não gasto muito dinheiro, sabe quanto é que gastei na minha campanha presidencial? Não vai acreditar. 167 mil euros, o equivalente a 180 mil dólares. Não é muito".
"Da próxima vez, será menos do que isso", assegurou. Para logo de seguida corrigir: "Não há próxima vez".
Marcelo Rebelo de Sousa pôs de parte um exemplar de "Os Lusíadas" de 1880, com "tradução livre" para francês feita pelo duque de Palmela, para a coleção camoniana da Fundação Casa de Bragança, certificando-se primeiro, por telefone, de que a instituição ainda não tinha esta edição rara.
Em seguida, subiu aos pisos onde estão os mapas, as primeiras edições e os autógrafos, à conversa com Judith, Naomi e Adina, a quem contou que começou a colecionar livros antigos "aos 14, 15 anos", pedindo dinheiro emprestado aos pais, e que doou no total "mais de 200 mil volumes à biblioteca de Celorico de Basto".
As três irmãs pareciam encantadas com o chefe de Estado português, e às tantas Judith disse-lhe: "Quem me dera que fosse o nosso Presidente". Naomi confidenciou-lhe o mesmo, mais à frente: "Estávamos a pensar que podia ser o nosso Presidente".
O Presidente norte-americano, Donald Trump, vive ali perto, mas não visita a livraria. "O que é ótimo", observou Adina. Em contraste, um dos seus antecessores, Bill Clinton, é cliente assíduo da Argosy, desde que estava em funções, mas nunca trouxe a comunicação social.
Marcelo Rebelo de Sousa já tinha visitado há um ano outra livraria independente famosa de Nova Iorque, a Strand, fundada em 1927.
Hoje, rodeado pelos jornalistas que o acompanharam na 74.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, passou cerca de duas horas na Argosy, que sobrevive em Manhattan porque o imóvel é propriedade da família, que está determinada em mantê-lo.
"Adoram livros? Eu também. Que família, que exemplo", elogiou, logo à entrada. "Passaria horas e horas e horas e dias e dias e dias a ver tudo", exclamou, no final, encantando com este lugar de achados improváveis e fragmentos históricos, onde se sente o cheiro dos livros.
O chefe de Estado fez questão de examinar cuidadosamente um conjunto de mapas antigos de Portugal e das suas antigas colónias, que uma das funcionárias, Laura, lhe mostrou, um por um, e comprou uma gravura colorida das ilhas cabo-verdianas para oferecer ao seu amigo Jorge Carlos Fonseca, Presidente de Cabo Verde.
Demorou-se igualmente na secção de autógrafos de personalidades, onde surpreendeu ao acertar sucessivamente no preço de vários artigos, e deu a explicação: "Tenho um bom senso da realidade".
À saída, prestes a regressar a Portugal, ao fim de três dias e meio em Nova Iorque, os jornalistas lançaram-lhe o tema da recandidatura, perguntando-lhe se na terça-feira fez o seu último discurso como Presidente da República perante a Assembleia Geral das Nações.
Marcelo Rebelo de Sousa, que tem remetido para o verão de 2020 uma decisão em relação às presidenciais de janeiro de 2021, nada adiantou.
"Ou não me recandidato, ou me candidato e não sou eleito - e este foi o último discurso que fiz na Assembleia Geral das Nações Unidas. Ou me recandidato e sou eleito - e então poderei estar aqui em 2021 outra vez a discursar. Vamos ver", respondeu.
No próximo ano, está definido que será o primeiro-ministro a representar Portugal nas Nações Unidas, referiu.
*Por Inês Lima, enviada da agência Lusa.
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