No Tribunal Central de Instrução Criminal, a procuradora Vera Camacho considerou, no final da sua intervenção, que “não há decisões de tribunais superiores que respondam com assertividade à aplicabilidade da lei da amnistia”, embora “a argumentação válida pelos assistentes permita suscitar dúvidas” em relação à aplicabilidade neste processo.
Assim, o MP defende que o arguido “deverá ser pronunciado pelos factos que lhe são imputados, deixando em consideração do tribunal a aplicabilidade da lei da amnistia”.
A defesa de Rui Pinto entende que a lei da amnistia “é aplicável ao presente caso e aos crimes concretos de acesso indevido e violação de correspondência”, lembrando que a amnistia foi aplicada no outro processo, sendo “uma continuação e uma fragmentação de processos, estando em causa exatamente as mesmas situações e factos temporais”.
“Não temos a menor dúvida de que há uma estratégia de fragmentação de processos. Por factos cometidos já a partir de 2015 a 2019, podemos chegar a 2050 com o MP entretido a fazer processos novos sobre factos que já estão há muito tempo apurados. Isso é inaceitável”, afirmou aos jornalistas o advogado Francisco Teixeira da Mota, à saída do tribunal.
Desta forma, a defesa realçou que o arguido “não deverá ser pronunciado por 310 dos 377 crimes” presentes na acusação, ao passo que os assistentes presentes no debate instrutório afirmam que “deverá ser pronunciado por todos os crimes que é acusado”, como explicaram os advogados do Benfica Rui Patrício e João Medeiros aos jornalistas.
“O arguido deve ser pronunciado porque ele próprio admite que cometeu os crimes. A única coisa que contesta é o número de crimes e a qualificação dos crimes. Levou um conjunto de razões jurídicas para tentar reduzir o número de crimes e nós entendemos que não tem razão. Deve ser pronunciado em qualquer circunstância. O resultado será inevitavelmente, estamos em crer, a sua submissão a julgamento”, indicou Rui Patrício.
Em relação à lei da amnistia, aprovada no âmbito da vinda do Papa a Portugal, para a Jornada Mundial da Juventude, em agosto do ano passado, esta “é apenas residual relativamente ao número global de crimes”, sendo ainda uma questão “juridicamente muito discutível” e que os advogados do Benfica entendem que “não se aplica neste caso” em concreto.
“Se alguns dos crimes caírem por força da amnistia, sobra tudo o mais. Esse tudo o mais é suficientemente crime e suficientemente grave para se ir a julgamento e discutirmos de uma vez por todas este assunto, sem subterfúgios processuais como aconteceu em outros processos”, disse ainda a equipa de advogados que representa o clube lisboeta.
De acordo com Rui Patrício e João Medeiros, a lei da amnistia não se deve aplicar por duas razões: “A lei sujeita a amnistia a determinada pena, mas também a determinada tipologia relativamente a multa. No caso concreto, verificar-se-ia o requisito alusivo à pena, mas não o respeitante aos dias de multa, que seria o dobro do previsto na lei da amnistia. Há depois uma segunda razão, relacionada com a data da prática dos crimes. Há crimes que continuam para além da idade e é uma questão que afasta a amnistia”.
No final do debate instrutório, no qual Rui Pinto não esteve presente por se encontrar em França a colaborar com autoridades europeias num processo, a juíza de instrução agendou para o dia 22 de fevereiro, a partir das 14:00, a leitura da decisão instrutória.
Rui Pinto, de 35 anos, já tinha colaborado anteriormente com a justiça francesa ainda antes do julgamento do processo Football Leaks, no qual acabou condenado, em setembro do ano passado, pelo Juízo Central Criminal de Lisboa, a quatro anos de prisão com pena suspensa, por um crime de extorsão na forma tentada, três de violação de correspondência agravado e cinco de acesso ilegítimo.
Já em novembro, o criador do Football Leaks, de 35 anos, foi também condenado em França a seis meses de prisão, com pena suspensa, pelo Tribunal Judiciário de Paris, por aceder ilegalmente a emails do Paris Saint-Germain.
Em relação a este processo, Rui Pinto responde por 377 crimes relacionados com o acesso aos emails do Benfica e de outros clubes, Liga de clubes, empresas, advogados, juízes, procuradores, Autoridade Tributária e Rede Nacional de Segurança Interna.
Segundo a acusação, estão em causa 202 crimes de acesso ilegítimo, 134 de violação de correspondência, 23 de violação de correspondência agravado e 18 de dano agravado.
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