"A formação do Governo com este suporte parlamentar quebrava uma lógica de exclusão", recordou Francisca van Dunem, durante uma aula aberta à população, no Algarve, sublinhando que o seu ADN é "incompatível com discriminações".

Falando na abertura do 4.º Festival Literário Internacional de Querença (FLIQ), que decorre naquela aldeia do concelho de Loulé até domingo, a governante revelou ainda que aceitou o convite por confiar "nas qualidades e na absoluta integridade" de quem a convidou.

Durante a aula, que decorreu num espaço aberto daquela aldeia do interior algarvio, Francisca van Dunem recordou também a sua infância, no sul de Angola, e a diferença que sentiu quando a família se mudou para a capital, Luanda, "cidade que cheirava a medo".

A mudança deu-se numa altura em que eclodia um conflito armado em Angola, o que fez com que andar na rua, fortemente patrulhada por milícias, sobretudo para os homens, se tivesse tornado "num ritual de encontro com o risco".

Na sequência daquilo a que assistiu e que viveu, com cerca de 10 anos a atual ministra da Justiça decidiu que queria tornar-se advogada, inspirada em personagens de ficção, mas, sobretudo, por considerar que a advocacia "era um lugar de integridade e coragem".

"Eu cresci muito depressa, a conspirar para que um dia a justiça fosse igual para todos", revelou, acrescentando que a permanente ausência de justiça se tinha tornado "intolerável".

Francisca van Dunem recordou ainda a sua ida para Lisboa estudar Direito, na década de 1970, poucos meses antes do 25 de abril, e a sua carreira de 36 anos enquanto magistrada do Ministério Público.

A aula livre assinalou os 30 anos da iniciativa “Estudos Gerais Livres” (EGL), promovida pelo filósofo Agostinho da Silva e pelo antropólogo Manuel Viegas Guerreiro, patrono da fundação com o mesmo nome que organiza o festival.

O festival decorre este ano sob o tema "Literatura e Geografia(s)", homenageando o escritor, ensaísta e professor algarvio Nuno Júdice, vencedor do Prémio Rainha Sofia de poesia ibero-americana pela sua obra poética, em 2013.

A primeira aula dos EGL foi ministrada por Agostinho da Silva a 03 de maio de 1989, no Museu Nacional de Arte Antiga, com a presença, entre outras personalidades, do Presidente da República da altura, Mário Soares.

Os EGL foram criados por Manuel Viegas Guerreiro, em conjunto com o professor e amigo Agostinho da Silva, "com o intuito de levar o conhecimento e a discussão de temas à população em geral", lê-se no comunicado hoje divulgado.

O festival tem o apoio da Direção Regional de Cultura do Algarve, da Câmara de Loulé e da União de Freguesias de Querença, Tôr e Benafim.