“A derrota da Ucrânia seria a vitória do imperialismo sobre o multilateralismo e o direito internacional. Se for esse o resultado, países como Portugal, e a generalidade das nações que compõem a comunidade internacional, seriam tão perdedores quanto a Ucrânia”, considerou Gomes Cravinho.
O chefe da diplomacia portuguesa intervinha no debate temático sobre a situação na Ucrânia, que decorre hoje na Assembleia da República, no dia em que se assinala um ano do início da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Cravinho sustentou que “a sobrevivência e a vitória do multilateralismo e do direito internacional não é, apenas, uma questão de ideologia”.
“É uma questão decisiva, incluindo para Portugal. Precisamos de poder contar com um sistema internacional, e com mecanismos de diálogo baseados em regras, para que esteja plenamente garantida a nossa soberania e capacidade de decidirmos os nossos próprios destinos”, acrescentou.
Num discurso de cerca de 15 minutos, em que lembrou o apoio prestado por Portugal à Ucrânia desde o início do conflito, Cravinho afirmou que o regresso da guerra “em grande escala à Europa pela mão de Vladimir Putin” obriga “a confrontar ideias feitas sobre o presente do continente europeu e sobre o futuro da ordem internacional”.
“Não esqueçamos hoje, neste triste aniversário, que a batalha maior que se trava hoje na Ucrânia, é entre o regresso à lei do mais forte, que caracterizou a primeira metade do século XX, e a sobrevivência do multilateralismo assente em regras do direito internacional, do diálogo e da diplomacia”, sublinhou.
Cravinho ressalvou ainda que “faz parte dos paradoxos e das tragédias da vida internacional que há momentos em que a paz apenas se conquista pela força das armas” e que “o combate dos ucranianos pelo seu território é também o combate por um mundo mais decente, mais ordeiro e mais pacífico”, tratando-se do direito inerente de legítima defesa “de que dispõe qualquer nação atacada, um direito previsto no artigo 51º da Carta das Nações Unidas”.
“É neste contexto que fornecemos já cerca de 315 toneladas de material militar, um valor que, com a próxima remessa, aumentará para 532 toneladas, incluindo viaturas blindadas, geradores, munições, e equipamento médico e sanitário. Procurámos, em cada momento, corresponder às necessidades militares mais prementes da Ucrânia, à medida das nossas capacidades e com elevada generosidade”, disse.
O ministro dos Negócios Estrangeiros assegurou ainda no parlamento que a palavra dada pelo Governo e pelo primeiro-ministro em matéria de apoios financeiros à Ucrânia é para cumprir “na plenitude”.
O ministro foi questionado pelo líder do Chega, André Ventura, sobre uma notícia do Jornal de Negócios que refere que o prometido apoio de Portugal de 250 milhões de euros não chegará na totalidade.
“Em relação aos apoios anunciados, há uma questão muito simples que se pode sublinhar: a palavra dada é para cumprir, a palavra do primeiro-ministro sobre apoio financeiro é palavra que será cumprida na plenitude”, assegurou Gomes Cravinho.
O Jornal de Negócios escreve hoje que a “ajuda financeira de 250 milhões já não chega a Kiev” e que “Portugal compromete-se agora apenas com uma garantia de 55 milhões para alavancar o financiamento conjunto dos 27 ao orçamento ucraniano, sem prestar assistência bilateral”.
Na sua intervenção inicial, o ministro dos Negócios Estrangeiros já tinha salientado a assinatura, em maio do ano passado, de um Acordo de Cooperação Financeira com a Ucrânia no valor de 250 milhões de euros, que inclui a cedência de direitos especiais de saque no Fundo Monetário Internacional.
“Portugal apoia com o que pode, mas escusamos de andar pela Europa a fazer número quando chega a hora de pôr a massa”, tinha criticado o líder do Chega.
André Ventura desafiou ainda o ministro a esclarecer quer este valor quer quando chegarão os anunciados tanques e helicópteros, bem como se Portugal “vai ou não” declarar a Rússia como um Estado patrocinador do terrorismo, mas estas matérias ficaram sem resposta.
O ministro dos Negócios Estrangeiros gastou a quase totalidade dos 16 minutos na sua intervenção inicial, sobrando-lhe apenas 30 segundos para responder aos pedidos de esclarecimento dos partidos.
O líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, pediu ao Governo que esclarecesse o seu papel na promoção da paz, considerando-o “por vezes equívoco”, e lamentando a “escalada armamentista”.
O deputado do BE pediu ainda explicações ao Governo sobre alguns casos de “insucesso no acolhimento de refugiados ucranianos”, em particular das crianças, muitas fora do sistema de ensino.
Na resposta, o ministro considerou a dimensão humanitária da maior importância e apontou que, entre as crianças ucranianas que não estão na escola, muitas “estão a fazer aulas ‘online’ e a ter uma escolaridade de forma diferente”.
Gomes Cravinho salientou que além da dimensão humanitária, política e financeira, o apoio de Portugal à Ucrânia tem também “uma dimensão irrecusável que é militar”.
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