Já o ministro visado, Fernando Grande-Marlaska, criticou os partidos por só terem visionado uma parte das filmagens, afirmando que ninguém morreu em 24 de junho em território espanhol e insistindo que a resposta da força policial Guarda Civil foi correta e proporcional perante um ataque violento à fronteira por perto de duas mil pessoas organizadas e armadas com instrumentos perigosos, como machados e rebarbadoras.
Nove deputados de uma comissão parlamentar do Congresso de Espanha assistiram hoje, à porta fechada, a parte das imagens registadas em 24 de junho por câmaras fixas, um helicóptero e um ‘drone’ (aparelho aéreo não tripulado) das autoridades espanholas na fronteira da cidade de Melilla com Marrocos.
As autoridades têm oito horas de filmagens, mas os deputados só viram uma parte.
No final, todos os partidos menos o socialista (PSOE, do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez) consideraram serem necessárias mais explicações do ministro Fernando Grande-Marlaska, com a maioria a dizer que o ministro tem mentido nas explicações que tem dado.
Marlaska vai ao parlamento dar novas explicações aos deputados na próxima quarta-feira e o maior partido da oposição, o Partido Popular (PP, de direita), não descarta pedir a seguir, em função dessa audição, uma comissão de inquérito, que se somaria às investigações já em curso do Ministério Público e da Provedoria de Justiça.
A deputada do PP Ana Vázquez elogiou a atuação da Guarda Civil (como também fizeram os outros partidos de direita, Cidadãos e VOX), mas disse que houve “mentiras” e “meias verdades” por parte do ministro, como ter negado (pelo menos, inicialmente) que a polícia marroquina entrou em território espanhol ou que houve quase meio milhar de devoluções sumárias de migrantes a Marrocos, sem respeito pela legislação internacional.
Já na esquerda, o Unidas Podemos (que faz parte do Governo) e os bascos independentistas do EH Bildu questionaram a atuação da Guarda Civil e sublinharam que as gravações que viram confirmam que não foi dada a atenção necessária a pessoas feridas e que “os principais acontecimentos ocorreram em território espanhol”, nas palavras do deputado Jon Iñarritu.
O deputado basco criticou Fernando Grande-Marlaska por ter sido, até agora, “pouco transparente” nas explicações e “esconder-se em generalidades”.
Para a coligação Unidas Podemos, as imagens hoje visionadas não mostram que os migrantes que tentavam passar a fronteira para entrar em Espanha tenham usado violência excecional e própria “de um ataque militar”.
Além disso, o partido questionou a forma como foram entregues 470 migrantes, de imediato, a Marrocos, sem qualquer identificação ou procedimento que respeitasse normas legais e com acesso de polícias marroquinos a território espanhol.
Falando em Bruxelas a jornalistas espanhóis, Grande-Marlaska manifestou-se disponível para responder a todas as perguntas na próxima quarta-feira, mas criticou os deputados por não terem visto todas as imagens, que considera que atestam que a Guarda Civil deu uma “resposta legal e proporcionada” à violência do ataque a uma fronteira espanhola e da União Europeia (UE) e que “não houve nenhuma morte em território nacional”.
“Foi um ataque violento e de uma violência extrema”, que deixou feridos mais de 50 Guardas Civis, “dois deles com especial gravidade”, assim como polícias marroquinos, disse o ministro.
A atuação das forças de segurança espanholas e marroquinas em junho, em Melilla, tem sido questionada por diversas entidades internacionais, como as Nações Unidas.
O ministro espanhol já foi também chamado por uma comissão do Parlamento Europeu para dar explicações, o que disse que fará quando estiverem concluídas as investigações que estão a decorrer em Espanha, no Ministério Público e na Provedoria de Justiça.
O provedor de Justiça espanhol, num primeiro relatório, questionou a atuação da Guarda Civil, levantando a suspeita de entregas “sumárias” de migrantes à polícia marroquina, de falta de assistência a feridos ou de lançamento de pedras e utilização de ‘sprays’ contra quem tentava saltar a fronteira.
Num comunicado, o Ministério da Administração Interna sublinhou que este relatório é de outubro e que já prestou esclarecimentos posteriormente.
“Todos as recusas na fronteira foram realizadas com a legislação vigente” e “a Guarda Civil em nenhum momento omitiu o dever de auxílio”, acrescentou a nota do ministério.
Melilla e Ceuta, outro enclave espanhol situado junto à costa marroquina, são as únicas fronteiras terrestres da UE com África.
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