"O que é a direita e a esquerda: são meras distrações, como o racismo! O que importa mesmo é acabar com este sistema", eis uma das frases, proferida pelo militante Rui Roque na apresentação da sua moção de estratégia perante os cerca de 500 delegados, que sintetiza o sentimento da maioria dos presentes na reunião da capital do Alto Alentejo.
Mas o "negacionismo" do posicionamento do Chega no espetro partidário - às vezes resumindo-o a um simples "à direita do CDS" - convive abertamente com um discurso radical que aponta o dedo à etnia cigana, à igualdade de género ou os direitos das minorias.
O próprio líder do Chega, André Ventura, recusa o posicionamento do Chega na extrema-direita do espetro partidário, mesmo convivendo no grupo europeu Identidade e Democracia (ID) com os partidos mais radicais da ala direita da União Europeia, como a União Nacional francesa de Marine Le Pen ou La Norte italiana de Matteo Salvini, paladinos do discurso anti-imigração.
Rui Roque, um profissional que recusa rótulos, não apagou da sua moção de estratégia o percurso político, iniciado nos extremistas do PNR (Partido Nacional Renovador) em 2014. Foi o próprio a levar em mão aos congressistas e jornalistas a sua moção, encadernada de uma forma que faz lembrar os livros na instrução primária do Estado Novo, uma bandeira branca com a cruz de Cristo içada num mar azul onde pontuam uma caravela e o brasão de armas, sob um fundo amarelo e azul.
A intervenção de Rui Roque pode até ser considerada branda, quando comparada com a do "colega" Jorge Rodrigues de Jesus, autor de um discurso inflamado, por vezes pontuado por berros que inflamaram a plateia, para defender a ilegalização da ideologia marxista.
O militante Jesus do Chega chegou até a proclamar que a União Europeia, além de defender a ideologia de género, "promove também a pedofilia", embora num raciocínio não explicado a militantes a aplaudir de pé.
"Eu prefiro morrer de pé do que viver de joelhos o resto da minha vida", gritou entusiasmado no fim da intervenção para vincar a ideia essencial da sua moção: "O Chega é contra esta União Europeia marxista. E, se não mudar, Portugal tem de sair".
"Não aceitamos uma aliança da Europa com inúmeros ditadores terceiro-mundistas do Islão porque é incompreensível e inaceitável! Não aceitamos uma imigração descontrolada como forma de reembolso de uma falsa dívida histórica", concluiu.
Os jornalistas foram outro alvo de alguns dos militantes que passaram pelo púlpito da herdade casamenteira onde decorre a II Convenção Nacional do Chega. São mentira as acusações de extremismo, fascismo, homofobia, etc, alegaram vários militantes, como Miguel Nunes Silva.
Já no início da reunião Sérgio Carvalho subia à tribuna para proclamar que "o número de militante do Chega cresce exponencialmente apesar do adversário comunicação social, cujo passe custou 15 milhões", numa referência aos apoios estatais para fazer face aos prejuízos causados pela pandemia da covid-19.
As intervenções marcadas por uma acentuada carga ideológica foram alternando com outras mais destinadas a "lavar roupa suja", que dominaram a primeira metade do primeiro dos dois dias de trabalhos, no decorrer dos quais só um homem foi poupado: André Ventura, cada vez mais o único denominador comum destas ´famílias desavindas'.
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