Nada garante que o spitzenkandidat mais votado seja desta vez o sucessor de Jean-Claude Juncker na presidência da Comissão Europeia. É que o Conselho Europeu, composto por chefes de Estado e de governo da União Europeia, quer recuperar o poder de escolha do nome a propor e já veio dizer que não está previsto em nenhum tratado qualquer mecanismo automático que diga que o presidente da Comissão é um dos candidatos principais. Ainda assim, concordou que os grupos políticos são livres de escolher os seus spitzenkandidaten. De uma ou de outra forma, a escolha do próximo presidente da Comissão terá de ter em conta os resultados das eleições europeias.

A par desta questão, torna-se difícil adivinhar a nova geografia do futuro Parlamento Europeu, até hoje dominado pelo centro-direita, com o PPE com o maior número de deputados (216), seguido pelo S&D, socialistas e democratas (185). De acordo com as sondagens, os liberais serão a terceira força do hemiciclo, e a extrema-direita e a extrema-esquerda, bem como os partidos nacionalistas, deverão continuar a ganhar poder. Tudo dependerá, assim, dos acordos e coligações entre os diversos partidos pan-europeus.

Na semana passada, também e finalmente, a primeira-ministra  britânica, Theresa May, anunciou que o Reino Unido (RU) vai participar nas eleições europeias, a decorrer entre 23 e 26 de maio. O RU, que tem 73 deputados no Parlamento Europeu, adiou o Brexit até 31 de outubro (com possibilidade de revisão a 30 de Junho).

Recorde-se que os eurodeputados eleitos entram em negociações oficiais para formar os grupos políticos para a nova legislatura, a nona, em junho, mas todo o processo só ficará completo provavelmente em outubro, com as audições dos comissários indigitados, que têm de ser aprovados pelo PE antes de a Comissão Europeia poder entrar em funções, no início de novembro. O Parlamento Europeu tem 751 deputados, número que sem o Reino Unido é reduzido para 705, com alguns países, como Espanha, França, Irlanda, Holanda ou Estónia, a ganharem mais deputados.

Os novos eurodeputados irão reunir-se para a sessão constitutiva, em Estrasburgo, a 2 de julho, durante a qual será eleito, por voto secreto, o novo presidente do Parlamento Europeu, 14 vice-presidentes e cinco questores (deputados eleitos para tratar dos assuntos financeiros e administrativos). Nessa altura serão também decididas a composição das comissões parlamentares. Antes disso, a 20 e 21 de junho, decorre a Cimeira Europeia e os grupos políticos terão de notificar a sua composição a 24 do mesmo mês.

As famílias políticas europeias, que mais não são do que partidos políticos pan-europeus, organizam-se não por nacionalidades, mas por grupos onde estão representados os membros eleitos ou os MEPs (membros do Parlamento Europeu). Existem atualmente oito grupos políticos, mas esta realidade pode ser alterada em função dos resultados eleitorais. Cada grupo parlamentar tem de ter um mínimo 25 deputados vindos de pelo menos 25% dos Estados-membros.

A distribuição atual e o que defende cada grupo político (uma visão que o leitor poderá aprofundar com o primeiro e único debate entre os seis spitzenkandidaten realizado ontem). Alguns deputados não pertencem a nenhum grupo político e, nesse caso, fazem parte dos Não Inscritos.

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PPE - Partido Popular Europeu

O PPE é o partido com mais representatividade no Parlamento Europeu desde 1999, atualmente com 216 deputados. Trata-se da família dos democratas-cristãos e muitos dos seus fundadores moldaram de certa forma a história da União Europeia. O partido foi criado em 1976 e apenas não tem membros do Reino Unido. É lá que estão o PSD e o CDS, com sete deputados (e José Inácio Faria, em representação do Partido da Terra, e que agora faz parte da equipa de Paulo Morais, do Nós Cidadãos), mas também o Fidesz - União Cívica Húngara, de Viktor Orbán. O Fidesz está suspenso de qualquer atividade parlamentar. A decisão, que poderá acabar na sua expulsão do PPE caso o partido não inverta a trajetória que está a seguir em relação ao domínio dos tribunais, da não autonomia universitária, do controlo da imprensa na Hungria, será revista depois das eleições. Mas Nuno Melo, cabeça-de-lista do CDS, também já defendeu que forças como o Voz, que tem sido descrito como um partido de direita radical, podem ter lugar no PPE. O PPE é presidido desde 2014 pelo alemão Manfred Weber, da União Social-Cristã - agora spitzenkandidat - e tem entre os seus vice-presidentes Paulo Rangel, do PSD. O candidato principal, no entanto, não tem peso político para ganhar a Comissão Europeia e muitos são da opinião de que, a ganhar o PPE, o presidente da Comissão devia ser Michel Barnier, o francês que está à frente das negociações do Brexit e que já ocupou diversos cargos políticos, de ministro dos Negócios Estrangeiros da França a comissário da Política Regional ou do Mercado Interno.

S&D - Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas

O S&D é composto pelos membros do Partido Socialista Europeu e alguns independentes. Defende uma sociedade europeia inclusiva, baseada nos princípios de liberdade, igualdade, solidariedade, diversidade e justiça e, na atual era de crise, a sua prioridade é “lutar contra o desemprego e assegurar que as sociedades e os mercados dos Estados-membros se tornem mais justos”. É o grupo mais importante do centro-esquerda e o segundo em número de deputados (185). É neste grupo que está inserido o Partido Socialista português, com oito MEPs, o partido português mais votado. Também tem tido os seus desaguisados políticos. Uma das críticas teve a ver com a falta de posição face aos acontecimentos na Roménia, em Malta, na Bulgária ou na Eslováquia sem que qualquer responsável - a não ser a deputada Ana Gomes - tenha tomado uma posição forte sobre o assunto. O spitzenkandidat é o holandês Frans Timmermans, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros da Holanda e antigo primeiro vice-presidente da Comissão Europeia.

ECR - Conservadores e Reformistas Europeus

Criado em 2009 para fazer uma reforma urgente da União Europeia, defende o regresso às origens e aos princípios que a fundaram UE. Tem 77 deputados e é o terceiro maior grupo político do Parlamento Europeu. Integram este grupo o Partido Conservador do Reino Unido, o Partido Democrático Cívico da República Checa, o Partido da Lei e da Justiça da Polónia, o Partido Popular Dinamarquês da Dinamarca e o Partido dos Verdadeiros Finlandeses da Finlândia. Não há nenhum partidos português neste grupo. Jan Zahradil, da República Checa, vem dos Reformistas Aliança da Europa e é o candidato principal do grupo.

ALDE - Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa

O Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa foi fundado em 1993 e é um partido liberal composto por 49 partidos nacionais liberais e centristas de toda a Europa. Tem 69 deputados, entre os quais o português António Marinho e Pinto, eleito pelo MPT - Partido da Terra nas eleições de 2014, ano em que o partido obteve o seu melhor resultado de sempre. Depois de eleito, começou por afirmar: “Verifiquei uma coisa que não sabia antes: o Parlamento Europeu não tem utilidade. É um faz-de-conta. Não manda nada, apesar de todas as ilusões, todas as proclamações, que são mentiras”. Manteve, apesar disso, o lugar de eurodeputado. Em setembro de 2014, Marinho e Pinto anunciou a rutura com o MPT, do qual nunca foi militante, e fundou Partido Democrático Republicano (PDR), por quem concorre às eleições em 2019. Este ano, o ALDE terá mais um partido português, o Iniciativa Liberal, que se candidata pela primeira vez a umas eleições, nacionais ou europeias, e que tem como cabeça-de-lista Ricardo Arroja. O belga Guy Verhofstadt, eleito primeiro-ministro da Bélgica em julho de 1999 e que chefiou três governos ao longo dos dez anos seguintes, é o candidato principal pelos liberais. Em junho de 2009 foi eleito deputado ao Parlamento Europeu e lidera desde então o ALDE.

Partido Verde Europeu - Grupo Verdes/Aliança Livre Europeia

É um grupo político composto por deputados de duas famílias de partidos com ideologias distintas: o Partido Verde Europeu e o Aliança Livre Europeia, a par de alguns independentes. O primeiro agrupa partidos ambientalistas, o segundo representa movimentos regionalistas e nações sem Estado, quase sempre de orientação progressista. Fazem ainda parte desta família partidos não afiliados em nenhuma destas organizações pan-europeias. Ao todo tem 52 membros.

O Livre, que tem Rui Tavares como cabeça de lista, é fundador da Primavera Europeia. Se a Primavera Europeia, que integra partidos e cidadãos de países como a Dinamarca, Polónia, Grécia, Áustria, Alemanha, Espanha e Portugal, não conseguir formar um grupo parlamentar próprio, o Livre deverá integrar esta família.

Esta família é a que mais cresce em países como a Alemanha ou Países Baixos, com um excelente resultado em França. Seria importante para Portugal ter representação, porque são um grupo decisivo nas duas coisas determinantes: o combate às alterações climáticas e o combate pela democratização União Europeia.

Em 2009, Rui Tavares teve no PE com o Bloco de Esquerda, com quem se incompatibilizou tendo passado para Os Verdes, e trabalhou com Ska Keller. A alemã Ska Keller, que estudou Estudos Islâmicos, Turcologia e Estudos Judaicos na Universidade Livre de Berlim e na Universidade Sabanci, em Istambul, é uma das spitzenkandidaten. Foi eleita pela primeira vez para o Parlamento Europeu em 2009, e foi candidata principal do Partido Verde Europeu na campanha para as eleições europeias de 2014. É co-presidente do grupo Verdes/ALE no Parlamento Europeu.

GUE/NGL - Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde

O Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde é um grupo parlamentar socialista e comunista. Foi constituído em 1994 e opõe-se à atual estrutura política da União Europeia, embora esteja comprometido com a integração europeia. Tem três objetivos fundamentais para a UE: mudar as instituições para as tornar democráticas, romper com as políticas monetárias neoliberais e desenvolver uma política de cooperação equitativa. Quer desmantelar a NATO. É aqui que está inserido o Partido Comunista Português, com três deputados, e o Bloco de Esquerda, com a deputada Marisa Matias. Ao todo, esta família tem 52 deputados. O grupo tem mais de um candidato, a dinamarquesa Margrethe Vestager, de 51 anos, comissária europeia da Concorrência desde 2014. Foi ministra da Economia e dos Assuntos Internos e ministra da Educação na Dinamarca.

Europa da Liberdade e da Democracia Direta

É um grupo político europeu eurocético e politicamente de direita, formado depois das eleições europeias de 2009 e constituído por elementos da União para a Europa das Nações e do grupo Independência/Democracia, ambos extintos. Depois das eleições de 2014, o grupo foi refundado com o nome Europa da Liberdade e da Democracia Direta. É o partido do Brexit, de Nigel Farage, e do Movimento 5 Estrelas, fundado pelo comediante Beppe Grillo para colocar cidadãos comuns no poder. Tem 42 eurodeputados.

Europa das Nações e da Liberdade

Tem 36 deputados, é o grupo mais pequeno do Parlamento Europeu. Foi formado depois de, em 2014, a extrema-direita europeia, em especial, a Frente Nacional, o Partido para a Liberdade e a Liga Norte terem tentado formar um grupo, sem conseguir. Marine Le Pen anunciou mais tarde que o grupo seria composto pelos seguintes partidos e deputados: Frente Nacional para a Liberdade, Liga Norte, Partido da Liberdade da Áustria, Vaaml Belang, Congresso da Nova Direita, Janice Atkinson, eurodeputada expulsa do UKIP (e agora já tem mais três membros que decidiram transferir-se do UKIP), e Laurentiu Rebega, que rompeu com o Partido Conservador. As sondagens dizem que o número de deputados vai crescer e dar origem a novos partidos ou, no mínimo, novas alianças.

NI - Não Inscritos

São o grupo dos Não Inscritos, ou seja, os deputados que não fazem parte de nenhum grupo político. Tem 20 membros: Hungria (3), Reino Unido (3), Grécia (5), França (3), Roménia (1), Dinamarca (1), Alemanha (2) e Polónia (2).