Em audição na Comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação, a ministra da Habitação, Marina Gonçalves, fez uma apresentação do Programa Nacional de Habitação, constantemente acompanhada por burburinho, sobretudo dos deputados do PSD.

Na primeira ronda de perguntas, o maior partido da oposição apresentou um “protesto veemente” ao Governo por não ter enviado, antes da audição de hoje, a primeira regimental da ministra, as medidas do programa Mais Habitação que têm de ser submetidas à Assembleia da República.

“Chega aqui sem ter as propostas no parlamento? O que estamos aqui a fazer? No parlamento só existe um pacote sobre habitação, o do PSD”, recordou o deputado social-democrata Paulo Rios de Oliveira, perguntando quando chegariam as medidas.

Marina Gonçalves não respondeu à primeira e o deputado voltou a perguntar. A ministra respondeu então: “Vão entrar nos próximos dias, o programa só foi aprovado na quinta-feira [dia 30 de março]”.

“Estamos a antecipar a discussão das nossas propostas, que vão entrar nos próximos dias”, realçou, prometendo considerar “todas as opiniões”.

O PSD acusou a ministra de falar como uma “cassete” e de recorrer a “‘powerpoints’ e fotografias da Remax [nome de uma imobiliária]”.

Para o maior partido da oposição, o facto de o programa Mais Habitação ainda não ter dado entrada no parlamento causa “um efeito devastador na confiança dos investidores, dos inquilinos e dos senhorios”.

Em reação, Marina Gonçalves acusou o PSD de fazer “debate demagógico” sobre o tema da habitação, nomeadamente limitando a discussão ao arrendamento coercivo de habitações devolutas.

A ministra recordou que, hoje, o IMI (Imposto Municipal sobre os Imóveis) agravado é um instrumento que já existe para mobilizar o património devoluto e muitos municípios já podem e já compram e expropriam para reabilitar as casas.

“Não diabolizamos ninguém”, frisou, realçando a necessidade de mobilizar todos os atores do setor.

Sobre a apresentação que trouxe aos deputados, Marina Gonçalves disse que “não são anúncios”, mas sim “obra que está no terreno”, e acentuou na “mobilização do património do Estado para atribuir às famílias”.

A deputada socialista Maria Begonha elogiou o “equilíbrio” do novo pacote de medidas e acusou o PSD de ficar “do lado dos proprietários”.

Enquanto falava, o presidente da comissão parlamentar, Afonso Oliveira (PSD), teve de pedir silêncio várias vezes e chegou mesmo a apelar à “urbanidade” e reconhecer que a audição estava a decorrer com “algum aquecimento”.

Pelo Chega, o deputado Filipe Melo destacou o impacto das novas medidas na confiança do mercado e recordou que o Estado continua sem conhecer o seu património e “continua sem saber” quantos imóveis devolutos pode colocar no mercado de arrendamento.

“Antes de fazerem um ataque cerrado ao património individual, porque é que o Governo não olha primeiro para o património devoluto que tem?”, questionou.

“Eu devo falar chinês”, reagiu a ministra, notando que “uma coisa é ter visões diferentes” sobre habitação, “outra coisa é dizer que nada se faz” e convidou os deputados para “um périplo pelo país”.

Carlos Guimarães Pinto, deputado da IL, criticou a política do Governo por se focar no alojamento local e por afetar a estabilidade de todo o setor.

A ministra recusa estar a atribuir culpas a um só setor – seja o alojamento local ou os vistos ‘gold’ –, mas responsabiliza, pelo estado atual, “a confluência de todos”.

O deputado do PCP Bruno Dias - que disse e repetiu a frase “faltam casas que as pessoas possam pagar” – questionou a ministra sobre quando estarão prontas as nove mil casas do parque público a custos acessíveis promovidas pelo Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), que, assinalou, “tem uma crónica falta de meios”.

“Temos as obras todas calendarizadas para estarem prontas entre 2026 e 2030”, assegurou Marina Gonçalves, precisando que 2.800 serão concluídas até 2026 e admitindo que serão necessárias medidas adicionais para reforçar o parque habitacional público.

Mariana Mortágua, deputada do BE, considerou que as medidas do Mais Habitação "não resolvem nada", sublinhando que não há nada que esteja a ser feito para dar uma resposta às pessoas agora.

"As pessoas precisam de resposta agora e o Governo não está a responder", disse a deputada bloquista.

Marina Gonçalves recordou que o programa Mais Habitação integra “medidas excecionais e temporárias”, que decorrem do momento de crise atual, mas é também “um conjunto de respostas estruturais”.

O parque público, sublinhou, é uma prioridade, é a resposta estrutural, mas isso “demora tempo”, apontado, por isso, a necessidade de o Mais Habitação recorrer a um conjunto de instrumentos de natureza conjuntural para reforçar a resposta.

Sobre a polémica em torno da medida do arrendamento forçado, a ministra não quis “perder muito tempo” e voltou a lembrar que esse instrumento já está hoje na lei e que já existe para mobilizar património devoluto.

Porém, referiu que não é por existir e estar disponível que se vê “o património a ser mobilizado apenas através deste instrumento”.

“Pode ser usado”, mas “temos muitos outros instrumentos”, assinalou, referindo a necessidade de não se reduzir o Mais habitação a apenas um instrumento.