Diz o ditado popular que “um mal nunca vem só”. As últimas semanas têm vindo a demonstrar que não, a pandemia da covid-19 não acabou — e temos uma nova doença entre nós (que, ainda assim, é capaz de não ser assim tão grave). Mas vamos por partes.
Primeiro, a covid-19. O vírus SARS-CoV-2, como é habitual nos organismos da sua índole, continuou a evoluir, não obstante a pandemia ter vindo a ser relativamente controlada no nosso país. A Ómicron reinventou-se e chegou à linhagem BA.5 — que, de acordo com os cálculos do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), já será dominante em Portugal.
Para já, a Organização Mundial de Saúde adianta que esta nova linhagem poderá ser ainda mais infecciosa, mas nada indica que provoque covid-19 mais grave.
Estas são informações agridoces: por um lado, com a população vacinada, significa que a mortalidade não deverá aumentar muito; por outro, o aumento do número de casos redunda em maior pressão sobre o sistema de saúde e os resultados estão à vista.
A média diária de casos disparou de 14.400 para 22.805 no espaço de uma semana — e as piores projeções apontam para que, no final de maio, o país possa atingir os 60 mil casos diários. Este aumento já levou, por exemplo, o Hospital de São João, no Porto, a refletir sobre se vai interromper a atividade programada em 20% — leia-se, consultas e cirurgias — para fazer face ao número de internamentos por covid-19.
“Estamos a chegar às 08h00 de cada dia sem nenhuma vaga no hospital”, disse Nelson Pereira, que, em declarações aos jornalistas junto ao serviço de urgência deste hospital, explicou estar em causa a ativação do nível 3 do plano de contingência, algo a decidir até ao fim de semana. “Não podemos chegar ao fim de semana sem tomar essa decisão: ou para um lado ou para o outro. Mas a situação é grave”, referiu.
Ora, isto significa que é possível que um em cada cinco utentes deste hospital venha a, uma vez mais, ver a sua saúde posta de lado ou atrasada, ao fim de dois anos nessa situação.
Face a este cenário, Marta Temido — que, recorde-se, tem feito da recuperação da atividade programada um dos pilares do seu discurso político — admitiu o condicionamento da atividade hospitalar, o que é “uma grande preocupação”. A ministra da Saúde, porém, recusou para já o regresso de testes gratuitos nas farmácias e uso obrigatório de máscaras, medidas já pedidas por algumas associações.
Quando é que será necessário retroceder? Temos de esperar. Para já, Temido defende apenas que os comportamentos individuais se devem adaptar à evolução da pandemia, estando o país em “fase de autorresponsabilização”.
A covid-19, porém, não é a única dor de cabeça com que o INSA e a Direção-Geral de Saúde se confrontam neste momento.
Hoje ficámos a saber que entre nós começou a grassar uma doença mais comum no continente africano do que no europeu, a varíola-dos-macacos, ou, recorrendo a um anglicismo, a “monkeypox”. Se, durante a manhã, a DGS apontou para 20 casos suspeitos desta doença e para cinco confirmados, ao início da noite o balanço aumentou para 14 casos confirmados.
Há razões para ter medo? Nem por isso. A doença é muito incómoda — os sintomas incluem lesões ulcerativas, erupção cutânea e gânglios palpáveis, eventualmente acompanhados de febre, arrepios, dores de cabeça, dores musculares e cansaço — mas é raramente fatal. Todos os casos confirmados são jovens em estado de saúde estável.
A maioria dos casos, aponta a DGS, estão circunscritos à região de Lisboa e Vale do Tejo e a doença não se dissemina facilmente entre seres humanos, sendo transmitida através de contacto com animais, contacto próximo com pessoas infetadas ou com materiais contaminados.
No entanto, é outro problema sanitário que urge resolver e as autoridades de saúde estão à procura das causas da disseminação na Península Ibérica (Espanha também tem casos) de uma doença até agora aparecia sobretudo esporadicamente na República Democrática do Congo, Serra Leoa, Libéria, República Centro-Africana e Nigéria.
"Neste momento, decorrem ainda os inquéritos epidemiológicos, com o objetivo de identificar cadeias de transmissão e potenciais novos casos e respetivos contactos", adiantou a DGS.
"Perante sintomas suspeitos, o indivíduo deverá abster-se de contactos físicos diretos. A abordagem clínica não requer tratamento específico, sendo a doença habitualmente autolimitada em semanas", disse ainda a DGS.
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