Eugenio Scalfari, escritor, jornalista determinante da imprensa intaliana e europeia do século XX, como o próprio Vaticano o define, morreu na quinta-feira, aos 98 anos, em Roma, anunciou o jornal La Repubblica, que fundou em 1976, e ao qual esteve ligado até ao final da vida.

“Adeus, diretor”, publicou o jornal La Repubblica na sua página ‘online’, na tarde de quinta-feira.

O Papa Francisco, segundo comunicado da Sala de Imprensa da Santa Sé, recebeu com pesar a notícia “da morte do seu amigo”, um não crente confesso.

Francisco “guarda com carinho a memória dos encontros – e das conversas densas sobre as últimas questões da humanidade – que teve [com Scalfari] ao longo dos anos, e confia a sua alma ao Senhor em oração, para que o receba e console aqueles que estavam próximos a ele”, lê-se na mensagem publicada pelo Vaticano.

Scalfari entrevistou e trocou correspondência com o antigo cardeal argentino Jorge Bergoglio, depois da sua eleição como Papa Francisco, em 2013, dando origem a uma longa conversa sobre fé e secularismo, que deu origem ao livro “Dialogo tra credenti e non credenti” (“Diálogo entre um crente e um não crente”, em tradução livre), publicado então pela editora Einaudi-La Repubblica.

O encontro teve continuidade em títulos seguintes, como “Il Dio unico e la società moderna – Incontri con papa Francesco e il cardinale Carlo Maria Martini”, surgido em 2019.

Scalfari “não é crente nem ateu ou, melhor, tem outra maneira de ser crente”, escreveu Frei Bento Domingues sobre o jornalista, numa das suas crónicas do jornal Público. “Continua a ser um aturado estudioso das questões religiosas e teológicas e cultiva um relacionamento muito intenso com o Papa Francisco”.

Eugenio Scalfari foi um intelectual fundamental na história italiana do século passado, que combinou o jornalismo com o seu empenho civil e político, e a sua morte foi recebida com tristeza num país do qual foi uma das maiores vozes e para cuja modernização contribuiu como líder anti-fascista, lê-se no perfil que lhe dedicou a agência Efe.

A sua morte “deixa um vazio intransponível na vida pública do nosso país”, disse o prmeiro-ministro italiano, Mario Draghi, em reação à morte de Scalfari.

Fundador do L’Espresso e La Repubblica, que editou durante 20 anos, “Scalfari foi um protagonista absoluto na história do jornalismo na Itália do pós-guerra”, prosseguiu Draghi, que se disse emocionalmente afetado, e que sentiria falta da “amizade” do jornalista.

“A clareza da sua prosa, a profundidade da sua análise e a coragem das suas ideias acompanharam os italianos durante mais de setenta anos e fizeram dos seus editoriais uma leitura essencial para quem quisesse compreender política e economia”, concluiu o primeiro-ministro italiano.

O ministro da Cultura, Dario Franceschini, destacou por seu lado o seu “exemplo de jornalismo cívico” que “marcou a história da Itália republicana com o seu trabalho”. “A sua morte deixa um vazio intransponível: ele é uma voz e um pensamento que todos vamos sentir falta”, disse Franceschini, na mensagem de pesar.

Nascido em Civitavecchia, perto de Roma, em 06 de abril de 1924, Eugenio Scalfari licenciou-se em Direito e iniciou a sua carreira jornalística em 1950, como colaborador de Il Mondo e L’Europeo, semanários que eram um ponto de referência para políticos e intelectuais italianos da época.

Combinou o seu trabalho como jornalista com a política e ajudou a fundar o Partido Radical Italiano, do qual foi secretário-geral adjunto.

Em 1963, foi nomeado diretor da L’Espresso, revista que também ajudara a fundar, que que dirigiu até 1968, quando regressou à política e foi eleito deputado, no grupo socialista, nas eleições desse ano, desempenhando funções parlamentares até 1972.

Quatro anos mais tarde, fundou o jornal diário La Repubblica, que quis crítico e progressista, e assim o afirmou, dirigindo-o até 1996, sendo substituído por Ezio Mauro, vindo do La Stampa.

“A República, única e indivisível” foi o título do seu derradeiro editorial.

Como diretor do La Repubblica, em 1990, Scalfari opôs-se à aquisição do grupo editorial Espresso-Mondadori, que integrava o diário, pelo magnata dos media e antigo primeiro-ministro Silvio Berlusconi, numa batalha que terminou, após mediação governamental, com a cisão do consórcio detentor dos diferentes títulos.

Em 1996, quando Scalfari deixou a direção do La Repubblica, este jornal encontrava-se em segundo lugar nacional, em termos de circulação, próximo do líder, o milanês Corriere della Sera.

A obra ensaística de Eugenio Scalfari inclui livros como “Dibattito sul laicismo” (“Debate sobre o laicismo”, 2005) e “L’uomo che non credeva in Dio” (“O homem que não acreditava em Deus”, 2008).

Entre as edições mais recentes, nenhuma delas constantes entre as publicações em Portugal registadas na Biblioteca Nacional, contam-se os títulos “La passione dell’etica” (“A paixão da ética”), coletânea de ensaios escritos entre 1963-2012, e “L’amore, la sfida, il destino” (“Amor, desafio, destino”), de 2013.

“Adeus Eugenio, um século de jornalismo e paixão civil”, escreveu o seu sucessor na direção do La Repubblica, Ezio Mauro, na edição de hoje.

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