PREFÁCIO

Se considerarmos o prefácio uma luz que ilumina o conteúdo de uma obra, opto por escolher figuras humanas em vez de palavras para ilustrar este pequeno livro cujo objetivo é fazer parte das famílias com crianças. Relembro aqui Helen Keller e Anne Sullivan Macy, que, pelo seu exemplo, são como professoras para mim, e perante o mundo, documentos vivos do milagre na educação.

Na verdade, Helen Keller é um excelente exemplo do fenómeno que é comum a todos os seres humanos: a possibilidade da libertação do espírito humano aprisionado através da educação dos sentidos. É aqui que se encontra a base do método educativo apresentado sucintamente no presente livro.

Se apenas um sentido foi o suficiente para tornar Helen Keller uma escritora e uma pessoa excecionalmente culta, não existe ninguém melhor para provar o poder desse método educativo com base nos sentidos. Helen Keller obteve uma conceção elevada do mundo que a rodeava através dos excelentes dons naturais, portanto, quem melhor do que ela para provar que é no mais profundo do ser que existe um espírito pronto a ser revelado?

Helen, mantenha no coração estas crianças, pois elas, acima de todas as outras, irão entendê-la. São os seus irmãos mais novos, com os seus olhos enfaixados e em silêncio, que tocam com as suas mãos e sentem impressões na sua consciência e exclamam, felizes: «Vejo com as minhas mãos». Só eles podem compreender na totalidade o drama do privilégio misterioso da sua alma. Na escuridão e silêncio, o seu espírito é livre para se expandir, a sua energia intelectual duplica-se, e conseguem ler e escrever sem nunca o terem aprendido, fazendo-o quase por intuição. Apenas eles, e só eles, podem compreender parcialmente o êxtase que Deus lhe deu neste caminho iluminado para o conhecimento.

Maria Montessori

Um

O MANUAL DA DRA. MONTESSORI

Recentemente, tem sido possível observar uma melhoria notável nas condições de vida das crianças. Em todos os países civilizados, mas especialmente em Inglaterra, as estatísticas demonstram uma redução da mortalidade infantil.

Esta redução da mortalidade está associada a uma melhoria do desenvolvimento físico das crianças, pois estas estão fisicamente mais saudáveis e vigorosas. A difusão e a popularização da ciência contribuíram para estas vantagens notáveis. Os pais começaram a implementar a higiene moderna nas suas crianças. Surgiram muitas instituições sociais novas, que foram aperfeiçoadas com o objetivo de as ajudar e proteger durante o período de crescimento físico.

É Desta Que Leio Isto: Ela tinha o dever de deslumbrar. Em maio, Filipa Martins traz-nos a biografia de Natália Correia

Filipa Martins junta-se ao É Desta Que Leio Isto no próximo encontro, marcado para dia 25 de maio, pelas 21h.

O livro escolhido para leitura é "O Dever de Deslumbrar. Biografia de Natália Correia", que chegou às livrarias a 16 de março, dia em que se cumpriram 30 anos sobre a morte da poetisa.

Esta obra mostra Natália Correia como símbolo das inquietações do século XX português e uma mulher "precoce e radical no pensamento feminino, vítima de efabulações e de mitos, incompreendida e amada".

Finalista dos Prémios Sophia, da Academia Portuguesa de Cinema, Filipa Martins dedicou-se – nos últimos seis anos – a estudar a vida e a obra de Natália Correia, tendo sido coautora de um documentário e coargumentista de uma série de televisão sobre esta escritora açoriana.

Para se inscrever no encontro basta preencher o formulário que se encontra neste link. No dia do encontro receberá um e-mail com todas as instruções para se juntar à conversa.

Subscreva a Newsletter do É Desta que Leio Isto aqui e receba diretamente no seu e-mail, todas as semanas, sugestões de leitura, notícias e acesso a pré-publicações. Além disso, pode ficar a par de tudo o que acontece no clube de leitura através deste link.

Desta forma, está praticamente a surgir uma nova geração mais desenvolvida, saudável, robusta e resistente às doenças mais traiçoeiras.

Qual é o impacto da ciência nesta questão? A ciência sugeriu determinadas regras simples, que restauram o mais possível as condições de uma vida natural às crianças, e deu uma ordem e diretrizes às funções corporais. Por exemplo, foi a ciência que sugeriu a amamentação, não embrulhar recém-nascidos em fraldas apertadas, banhos, vida ao ar livre, exercício, roupa simples e curta, sossego e muitas horas de sono. Também foram estabelecidas regras para quantificar a comida e adaptá-la racionalmente às necessidades fisiológicas da criança.

Apesar de tudo isto, a ciência não estava a contribuir com nada de novo. As mães sempre amamentaram, as crianças sempre foram vestidas, sempre respiraram e sempre comeram.

A questão é que estes atos físicos, quando eram efetuados sem ordem e às cegas, levavam à doença e à morte; mas quando eram efetuados de forma racional tornavam-se um meio de dar força e vida.

O progresso feito até então pode ser enganador, e fazer-nos pensar que já foram feitos todos os possíveis pelas crianças.

Apenas temos de pensar e refletir cuidadosamente sobre o assunto: serão as nossas crianças apenas os seus corpos em crescimento vigoroso? Será o seu destino cumprido apenas com a produção de corpos humanos bonitos?

Nesse caso, haveria pouca diferença entre as crianças e os animais que criamos para alimentação ou para transporte.

O destino da humanidade é certamente outro. O cuidado devido às crianças é um assunto muito mais abrangente do que a higiene do corpo. A mãe que deu um banho à sua criança e foi com ela até ao parque não cumpriu a missão de «melhor mãe do mundo». A galinha que reúne as suas crias e a gata que limpa os seus gatinhos e cuida deles com carinho não diferem das mães humanas nas suas ações.

Se a mãe humana for reduzida a estes limites, dedica-se em vão e sente que uma aspiração mais elevada está a ser reprimida. Ela é também a mãe da humanidade.

Não é só o corpo das crianças que tem de crescer, mas também o seu espírito. A mãe anseia por seguir a viagem espiritual misteriosa do seu ente querido que se irá transformar num ser humano, essa criação divina e inteligente.

Claramente, a ciência ainda não terminou o seu progresso. Pelo contrário, mal deu ainda o primeiro passo, pois parou no bem-estar do corpo. No entanto, deve continuar a avançar. Da mesma maneira que melhorou a saúde e salvou a vida física das crianças, está destinada a beneficiar e a reforçar a sua vida interna, ou seja, a verdadeira vida humana. Segundo este mesmo modelo positivo, a ciência vai continuar a focar-se no desenvolvimento da inteligência, do caráter e das forças criativas latentes que se escondem no magnífico embrião espiritual do ser humano.

O corpo de uma criança tem de ser nutrido e receber oxigénio do ambiente que a rodeia de modo a conseguir funcionar fisiologicamente, a crescer. Como tal, o espírito deve receber do ambiente que o rodeia o sustento de que precisa para se desenvolver de acordo com as suas próprias «leis de crescimento». É impossível negar que os fenómenos de desenvolvimento são um trabalho magnífico por si só. O reforço dos ossos, o crescimento do corpo, a construção do cérebro, a formação da dentição, tudo isto são construções reais do organismo fisiológico, tal como a transformação do organismo durante o período da puberdade.

Estes esforços são todos diferentes daqueles apresentados pela humanidade no chamado trabalho externo, ou seja, na «produção social», seja em contexto escolar ou no mundo, onde, ao exercer a sua inteligência, o ser humano produz riqueza e transforma o ambiente que o rodeia.

No entanto, é verdade que estes esforços são ambos «trabalho». Na verdade, durante estes períodos de enorme trabalho fisiológico, o organismo é menos capaz de efetuar tarefas externas e, por vezes, o trabalho de crescimento é tão extenso e difícil, que o indivíduo se sente sobrecarregado e, por este motivo, fica exausto ou falece.

O ser humano poderá sempre evitar «trabalho externo» ao utilizar o trabalho alheio, mas não há possibilidade de evitar o trabalho interno. Tal como o nascimento e a morte, foi imposto pela natureza que cada ser humano tem de efetuar esse trabalho interno sozinho. Este trabalho difícil e inevitável é o «trabalho da criança».

Quando afirmamos que as crianças devem descansar, estamos a referir-nos apenas a um lado da questão do trabalho. O que queremos dizer é que devem descansar do trabalho externo visível para o qual elas não são capazes o suficiente para contribuir para si próprias ou para os outros.

Portanto, esta declaração não é absoluta: a criança não se encontra realmente a descansar, pois está a efetuar o trabalho interno misterioso da sua autoformação. Está a trabalhar para se tornar adulta. Para que consiga alcançar este objetivo não é suficiente que o seu corpo cresça fisicamente: as funções motoras e do sistema nervoso também têm de ser estabelecidas e a inteligência tem de se desenvolver.

As funções a serem estabelecidas pela criança são de dois tipos: 1) as funções motoras pelas quais está a garantir o equilíbrio, a aprender a andar e a coordenar os seus movimentos; 2) as funções sensoriais através das quais estabelece as bases da sua inteligência quando recebe sensações do ambiente enquanto observa, compara e julga constantemente. Desta forma, a criança começa a familiarizar-se com o seu ambiente e a desenvolver a sua inteligência.

Livro: "O Manual Montessori"

Autor: Dra. Maria Montessori

Editora: Alma dos Livros

Data de Lançamento: 11 de maio

Preço: € 13,50

Subscreva a Newsletter do É Desta que Leio Isto aqui e receba diretamente no seu e-mail, todas as semanas, sugestões de leitura, notícias e acesso a pré-publicações.

Simultaneamente, está a aprender um idioma e enfrenta as dificuldades motoras da articulação, sons e palavras, bem como as dificuldades de obter um conhecimento dos nomes e da composição sintática dessa língua.

Se pensarmos numa pessoa emigrante que vai para o país diferente sem qualquer conhecimento acerca dos costumes, da aparência natural, da ordem social e do idioma dele, aperceber-nos-emos de que há um enorme esforço de adaptação que deve ser feito antes de participar na vida ativa de lá. Ninguém pode fazer esse esforço de adaptação por si. A própria pessoa emigrante tem de observar, compreender, lembrar-se, formar juízos de valor e aprender o novo idioma através da prática e longa experiência.

E quanto às crianças? E quanto àquelas que se deparam com um novo mundo e que, por muito mais fracas que sejam e antes de o seu organismo estar desenvolvido na totalidade, têm obrigatoriamente de se adaptar rapidamente a um mundo tão complexo?

Até aos dias de hoje, a criança nunca recebeu ajuda racional para executar esta tarefa difícil. No que diz respeito ao desenvolvimento psíquico da criança, encontramo-nos num período paralelo àquele em que a vida física foi deixada à mercê do acaso e do instinto – o período em que a mortalidade infantil foi um flagelo.

É de maneira científica e racional que temos de facilitar o trabalho interno da adaptação psíquica que a criança tem de fazer, o que não é de todo a mesma coisa que «qualquer trabalho externo ou produção».

É este o objetivo subjacente ao meu método de educação infantil e é por este motivo que determinados princípios que enuncia, juntamente com a questão que lida com a técnica da sua aplicação prática, não são gerais e referem-se especialmente ao caso particular das crianças entre os três e os sete anos, ou seja, às necessidades de um período formativo da vida.

O meu método é substancial e objetivamente científico. Contribuiu para o alcance de um estado mais avançado, e não só no sentido material e fisiológico. É um esforço para concluir o percurso que a higiene já tinha começado, mas apenas no tratamento do lado físico.

Se fosse possível obter estatísticas respeitantes à debilidade do sistema nervoso, dificuldades da fala, erros de perceção e de raciocínio e de falta de personalidade em crianças comuns, seria interessante comparar as estatísticas da mesma natureza, compiladas a partir dos estudos de crianças que tiveram vários anos de educação racional. Muito provavelmente, iríamos encontrar semelhanças entre essas estatísticas e as disponíveis hoje em dia que demonstrariam a redução da mortalidade e a melhoria no desenvolvimento físico das crianças.