Numa declaração ao país esta tarde, o líder do PSD acusou António Costa de pôr "os seus interesses à frente dos interesses do país" e de tirar partido de uma "campanha de desinformação".

Em causa estão as declarações desta sexta-feira de António Costa, que caracterizou o chumbo da devolução do tempo integral de serviço dos professores — nove anos, quatro meses e dois dias — como uma "vitória da responsabilidade".

Rui Rio criticou duramente aquilo que considerou "uma farsa, um golpe de teatro que põe a nu este défice de sentido de Estado" do primeiro-ministro.

O líder do PSD lembra que António Costa não se demitiu quando mais de 100 pessoas perderam a vida nos incêndios de 2017, ou quando o partido "inundou" a administração pública com familiares e amigos, quando a estrada de Borba colapsou ou face ao escândalo de Tancos. "No entanto, estava disponível para se demitir porque o parlamento poderia aprovar uma lei que poderia criar um caos financeiro e depois vota contra a norma que podia travar esse caos". "Terminou [a farsa], caiu o pano", disse.

"Um primeiro-ministro tem de ser um estadista, o garante da estabilidade e não da instabilidade", disse, acrescentando que o primeiro-ministro "geriu essa instabilidade" por questões de natureza partidária, nomeadamente para "quase parar a campanha para as europeias que estava a correr particularmente mal" ao PS.

Rui Rio considera assim que António Costa coloca "primeiro a família, depois o PS e depois Portugal".

Antes de apontar baterias a Costa e a "muitos comentadores que tudo fizeram para confundir os portugueses", Rui Rio fez questão de salientar que "o voto do PSD foi totalmente coerente com o que sempre disse e defendeu", nomeadamente o reconhecimento do tempo integral de serviço dos professores, acompanhado de uma cláusula de salvaguarda financeira, criticando ainda o PS de votar contra a norma-travão.

A Assembleia da República rejeitou hoje as alterações ao decreto do Governo que pretendiam consagrar a devolução de todo o tempo de serviço congelado aos professores, uma semana depois de o primeiro-ministro ter ameaçado demitir-se se as propostas fossem aprovadas.

PSD, PS, CDS-PP reprovaram, em votação final global, o texto proveniente da Comissão Parlamentar de Educação para a reposição integral do tempo de serviço dos professores, que teve o apoio do Bloco, PCP e PEV.

Com o resultado desta votação, em que o PAN optou pela abstenção, fica em vigor o decreto do Governo que recupera apenas dois anos, quatro meses e 18 dias do tempo de serviço (referente ao período entre 2011 e 2017) em que a carreira docente foi alvo de congelamento.

Em termos de consequências políticas, com o chumbo na Assembleia da República do princípio da recuperação integral do tempo de serviço dos professores - nove anos, quatro meses e dois dias -, fica assim afastado o cenário da demissão do Governo, que foi colocado em cima da mesa pelo primeiro-ministro, António Costa, na semana passada.

Nas galerias do parlamento, acompanhando as votações, sentaram-se vários docentes sindicalistas, entre os quais o líder da Fenprof, Mário Nogueira. Este grupo saiu em silêncio do hemiciclo após o anúncio do chumbo do diploma em votação final global.

Nove anos, quatro meses e dois dias

A devolução dos nove anos, quatro meses e dois dias reivindicada pelos sindicatos dos professores foi aprovada na especialidade, na noite da passada quinta-feira, com os votos favoráveis de todos os partidos, à exceção do PS, levando a declarações de congratulação por parte do líder da Frenprof e de deputados do BE e PCP mas também do PSD e CDS-PP.

Os centristas e os sociais-democratas votaram favoravelmente a contagem integral do tempo de serviço congelado mesmo depois de verem chumbadas na especialidade as suas propostas para condicionar a sua concretização ao crescimento económico e ao equilíbrio das finanças públicas.

Mas tanto o PSD como o CDS, através dos seus líderes, Rui Rio e Assunção Cristas, respetivamente, vieram depois explicar que não concordavam com a devolução do tempo de serviço congelado sem as condicionantes chumbadas por PS, BE e PCP na fase da especialidade, quando o primeiro-ministro, António Costa, já tinha ameaçado com a demissão do Governo caso o parlamento aprovasse as alterações em votação final global.

Rio e Cristas explicitaram então que as condicionantes chumbadas em sede de especialidade seriam reapresentadas no plenário de hoje e, se não obtivessem luz verde, o PSD e o CDS-PP votariam contra o texto saído da comissão parlamentar de Educação que consagra a devolução integral do tempo congelado.

Os apelos do secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, para que o PCP e o BE votassem favoravelmente as condições do PSD e CDS, permitindo assim a viabilização das propostas de alteração ao decreto do Governo, não tiveram acolhimento. A crise política ficou, desta forma, resolvida, devendo o plenário de hoje recusar a devolução integral do tempo de serviço congelado aos docentes durante o período de crise financeira.

António Costa dramatizou as consequências de uma hipotética aprovação das alterações, invocando o seu impacto financeiro (cerca de 800 milhões para todas as carreiras especiais da administração pública) e para a imagem para o país junto dos parceiros internacionais.

Numa entrevista à TVI, Costa invocou a responsabilidade financeira do Governo e defendeu que nem daqui a 10 anos será possível devolver integralmente o tempo de serviço congelado aos docentes.

“Eu não vou criar ilusões a dizer que vou devolver a integralidade do tempo, porque eu sei que só não vou eu, como não vai ninguém. E, não vai, não é este ano, nem no próximo, nem daqui a 10 anos, porque financeiramente não é possível fazer isso”, afirmou.

A crise política da última semana surgiu depois da aprovação na especialidade de uma alteração ao decreto do Governo, com os votos contra do PS e o apoio de todas as outras forças políticas, estipulando que o tempo de serviço a recuperar pelos professores são os nove anos, quatro meses e dois dias reivindicados pelos sindicatos dos docentes.

No dia seguinte, o primeiro-ministro comunicou ao Presidente da República que o Governo se demitiria caso essa proposta fosse aprovada em votação final, considerando que a validação da totalidade do tempo congelado seria uma medida injusta e financeiramente insustentável, apesar de a oposição defender que tal não teria qualquer impacto orçamental adicional nas contas do atual Governo.