O primeiro ano de governação da coligação PSD/CDS-PP na Madeira foi uma “lua de mel” sem “nada de extraordinário” a apontar, marcado sobretudo pela covid-19, segundo a professora de Ciência Política Teresa Ruel.

“Aquilo que podemos aduzir deste primeiro ano de mandato é, efetivamente, […] que é um ano de lua de mel em que significativamente não há nada de extraordinário que possamos sublinhar”, referiu a investigadora, doutorada em Ciência Política, em declarações à agência Lusa.

“A não ser o simples facto de a pandemia e de o contexto da pandemia terem obrigado a uma reorganização daquilo que foi o Programa de Governo na altura aprovado e uma direção de governo [diferente] daquele que tinha sido planeado, pelo menos em termos de plano e de estratégia para os três [anos] que faltam”, acrescentou.

Teresa Ruel realçou que, num ano de mandato, sete meses foram de pandemia, pelo que, “para além disso, há pouco que se possa dizer em relação àquilo que tem sido a dinâmica da governação” de coligação, uma vez que não há uma área de intervenção de destaque. Há, sim, “vários pacotes para enfrentar a pandemia”, mas que não estavam previstos no Programa de Governo.

PSD e CDS-PP destacam “bom funcionamento” da coligação no Governo da Madeira

O presidente do primeiro governo de coligação da Região Autónoma da Madeira, Miguel Albuquerque, afirma que o executivo PSD/CDS-PP tem funcionado em "unidade e concertação" e considera que a oposição regional está "em coma".

"Nós trabalhamos em unidade e a coligação tem funcionado muito bem. Não tem havido qualquer problema", disse à agência Lusa, quando se assinala o primeiro ano de mandato, reforçando: "Não foi uma coligação casuística. Assinámos um programa e um acordo de princípios entre os dois partidos e depois consubstanciámos num programa de governo que está sufragado pela população."

"Quando iniciámos o mandato, estávamos com um crescimento económico há 81 meses, atingimos o valor mais alto do Produto Interno Bruto desde sempre - cerca de cinco mil milhões de euros - e estávamos com uma taxa de desemprego inferior a 8%", lembrou, realçando que a crise pandémica, a partir de fevereiro de 2020, "alterou completamente as circunstâncias e obrigou à reformulação das prioridades".

Miguel Albuquerque assegurou que a coligação governativa manteve a "unidade" e a "concertação", sobretudo no período de emergência, em que foram tomadas "medidas difíceis", mas sempre “em conformidade” com os objetivos.

"A reformulação das prioridades foi muito simples: primeiro, a salvaguarda da vida e da saúde pública da nossa população e, posteriormente, todo o apoio para a manutenção do funcionamento das empresas, sobretudo as mais afetadas, ligadas ao setor e à indústria do turismo, o apoio maciço às famílias e ao rendimento dos cidadãos", explicou.

Por seu turno, o líder do CDS/Madeira, força partidária parceiro na coligação governamental, considerou que este projeto é "um momento histórico" que acontece pela primeira vez na região.

Rui Barreto, que ocupa o cargo de secretário da Economia no executivo madeirense, destacou que este primeiro ano do atual Governo Regional fica "marcado pela pandemia" da covid-19, realçando a "capacidade revelada para conter a propagação da covid-19 na região".

O governante admitiu ser "natural que existam divergências nalguns aspetos da governação”, mas sustenta que "nunca houve bloqueio da parte do PSD na resolução dos assuntos" e que "sempre houve abertura, frontalidade e há uma noção de compromisso entre as duas partes, e isso tem levado sempre à superação dos problemas".

Para Rui Barreto, existem "três princípios que têm presidido à coligação: coesão, compromisso e responsabilidade". O Governo da Madeira, destacou, "está coeso e, certamente, nem o CDS nem o PSD desistirão do seu compromisso com todos os madeirenses".

O responsável centrista madeirense enalteceu também "a capacidade com que o executivo da região respondeu aos pedidos de ajuda de todos os setores da sociedade madeirense" nesta crise provocada pela pandemia.

No seu entender, o executivo tem sido "capaz de, num tempo muito curto e com meios exclusivamente do Orçamento Regional, criar um conjunto de medidas de apoio e de relançamento económico capazes de manter viva a esperança dos empresários e de milhares de trabalhadores".

"Todas as medidas de apoio às empresas e às famílias que o Governo Regional da Madeira implementou foram desenhadas exclusivamente com as verbas do Orçamento Regional, sendo que, da República, até agora não chegou nada", sublinhou.

Rui Barreto realçou também "a forma empenhada e arrojada" como ele próprio e o secretário centrista que tutela o Mar e as Pescas, Teófilo Cunha, "enfrentaram os desafios colocados pela pandemia global associada ao covid-19", considerando que "neste primeiro ano de governo há uma marca do trabalho desenvolvido pelo CDS no governo que merece nota positiva".

Na sua opinião, "o arrojo, a criatividade, a rapidez de execução e o empenho são marcas do CDS no Governo da Madeira, fazendo valer a pena todos os votos no partido".

O balanço, acrescentou, "prova que a presença do partido no executivo é uma mais-valia para a região”.

Coligação PSD/CDS na Madeira é "mais do mesmo" para a oposição

Para o líder do PS/Madeira, o maior partido da oposição regional, “algo que se destaca é a região ter um governo que, apesar de coligação, é mais do mesmo” e “não governa para a população, mas para os aparelhos partidários”. Como exemplo, apontou “as nomeações recorde que fez já e continua a fazer mesmo em período de quarentena”.

Em declarações à agência Lusa, o também deputado regional Paulo Cafôfo vincou que “não há qualquer inovação, qualquer novidade no modo de fazer política”, o que, na sua opinião, é evidente “com constantes ofensas aos deputados da oposição” no parlamento.

Paulo Cafôfo defendeu serem “precisas respostas imediatas” para a crise que a Madeira está a atravessar na sequência da pandemia da covid-19, considerando que os programas lançados pelo executivo liderado por Miguel Albuquerque “são claramente insuficientes e inadequados”.

É necessária, indicou, “uma diversificação da base económica da Madeira, para tornar a economia mais resiliente e aproveitar o dinheiro” da União Europeia, evitando estar refém “do turismo, da construção civil e do setor público”.

“A verdade é que temos é um presidente do Governo Regional que anda perdido no meio desta crise pandémica”, opinou.

No seu entender, “a única novidade que trouxe a coligação governamental foi mais lugares para um partido”: “De resto não vemos qualquer alteração da postura política, nem sequer das políticas implementadas ao longo de 40 anos pelo PSD”.

Cafôfo disse que a entrada do vice-presidente Pedro Calado no atual executivo serviu “para continuar a alimentar os ‘lobbies’ que sempre existiram na região”.

Quanto ao parceiro da coligação governamental, mencionou o socialista, “encaixou-se perfeitamente”, esquecendo a sua postura no passado e sendo “mais papista do que o papa”, devido aos interesses partidários. Aliás, acrescentou, o CDS-PP “defende, no parlamento regional, mais o governo do que o próprio PSD”.

Por seu turno, o líder parlamentar do JPP, Élvio Sousa, reconheceu que no combate à pandemia o governo, “do ponto de vista da saúde esteve bem”.

O partido indicou “o despesismo” e a incapacidade para combater as listas de espera na saúde como principais críticas à atuação do executivo insular, e mostrou-se expectante sobre a aprovação da proposta que apresentou para a criação de uma “comissão de acompanhamento dos fundos que vêm do Fundo de Resiliência, sobretudo, que serão mais 1.400 milhões seguramente”.

Quanto ao deputado único do PCP, Ricardo Lume, enfatizou que este Governo Regional, apesar da novidade da coligação, “mantém a política de exploração, empobrecimento e de subjugação aos grandes interesses económicos e aos ‘lobbies’ dos amigos do regime”.

Para o parlamentar, mesmo antes da pandemia, e apesar do crescimento económico, “na Madeira cresciam a pobreza e exclusão social e esta é uma marca que não se alterou com este novo governo”.

Ricardo Lume censurou igualmente o incumprimento de promessas como a do complemento de reformas - que “apesar de estar inscrito no Orçamento Regional não se concretizou” - e a falta de estratégia para apoiar o setor primário.

“Achamos que este é um governo que tem feito muita propaganda, tem no âmbito da pandemia apresentado muitos programas, muitas linhas de crédito, mas, se formos ver os impactos dessas medidas, são basicamente nulas”, salientou, referindo que “quem se está a aproveitar são os grandes grupos económicos”, já que os pequenos empresários são excluídos devido à “excessiva burocracia e às medidas restritivas”.

O primeiro Governo Regional da Madeira de coligação, encabeçado por Miguel Albuquerque (PSD), que está no seu segundo mandato, tomou posse em 15 de outubro do ano passado, depois de os sociais-democratas terem perdido a maioria absoluta nas eleições legislativas regionais de 22 de setembro.

O PSD perdeu a maioria absoluta com que governou a região ao longo de 43 anos elegendo 21 dos 47 deputados da Assembleia Legislativa, o que motivou o convite ao CDS-PP para formar um governo de coligação e garantir a maioria absoluta de 24 mandatos.

A perda de maioria absoluta por parte dos sociais-democratas não era, porém, “uma situação que já não fosse expectável, dadas as circunstâncias e a polarização em que as eleições se desenvolveram em 2019, existindo além disso uma expectativa acentuada de que a alternância política pudesse ocorrer”, segundo a professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa.

Sobre a relação de tensão entre o Governo Regional da Madeira e o Governo da República, Teresa Ruel, madeirense e autora da obra "Oposição e Democracia na Madeira", considerou que não se trata “de crispação institucional” entre os dois governos.

No seu ponto de vista, o que existe são “questões, tempos diferentes de um Governo e de outro”, que acabam por suscitar reclamações da região ao continente, por falta de resposta imediata.

“Existem várias situações de o Governo Regional querer acelerar a decisão, e nem sempre o Governo da República acompanha estes ‘timings’ ou esses tempos de resposta que o Governo Regional quer”, reforçou.

Relativamente à postura e atuação de Miguel Albuquerque enquanto presidente de um executivo de coligação, Teresa Ruel disse que ainda não houve tempo para fazer uma leitura individualizada.

Ainda assim, considerou que “o posicionamento do presidente do Governo Regional num formato enquanto único partido a governar, tendencialmente, é diferente”, já que “uma coligação exige alguns consensos que são naturalmente feitos entre portas, não na praça pública”.