“Considero necessário tomar esta decisão que estava pensada há muito tempo, de reconhecer imediatamente a independência da República Popular de Donetsk e da República Popular de Lugansk”, referiu o chefe de Estado russo num discurso transmitido pela televisão estatal, depois do Kremlin ter divulgado esta intenção.
Putin pediu também ao parlamento russo para “aprovar esta decisão” para, em seguida, “ratificar os acordos de amizade e de ajuda mútua a estas repúblicas”, o que permitirá a Moscovo, por exemplo, enviar apoio militar aos dois territórios pró-russos do Donbass ucraniano.
Após o longo discurso televisivo, Vladimir Putin assinou o decreto com o reconhecimento e os tratados de amizade e assistência mútua com os líderes de Donetsk, Denis Pushilin, e Lugansk, Leonid Pásechnik.
Segundo Putin, a decisão foi tomada depois de receber hoje um pedido [de reconhecimento] por parte de ambos os líderes separatistas pró-Rússia e depois da Duma [câmara baixa do parlamento russo] ter enviado uma resolução com um pedido de reconhecimento da independência de Donetsk e Lugansk.
O chefe de Estado russo referiu ainda que a situação no Donbass ucraniano, onde decorre um conflito há oito anos que já provocou mais de 14 mil mortes, é “critica e séria”.
"Enfatizo mais uma vez que a Ucrânia para nós não é apenas um país vizinho. É parte integrante da nossa própria história, cultura, espaço espiritual. São nossos camaradas, parentes, entre os quais não somos apenas colegas, amigos, ex-colegas, mas também parentes, pessoas ligadas a nós por laços de sangue, parentes", insistiu Putin.
Ao longo da sua comunicação, o Presidente da Rússia fez um longo enquadramento da situação entre o seu país e a Ucrânia. Putin considerou a criação do estado moderno da Ucrânia um erro histórico proporcionado pela cedência da autonomia à região quando ainda fazia parte da União Soviética.
Ainda durante discurso televisivo, que durou 65 minutos, o Presidente russo pediu à Ucrânia para cessar imediatamente as “suas operações militares” contra os separatistas pró-Rússia.
"Quanto àqueles que tomaram o poder em Kiev e o mantêm, exigimos deles a cessação imediata das operações militares, caso contrário, toda a responsabilidade pelo contínuo derramamento de sangue recairá inteiramente sobre a consciência do regime em território ucraniano", referiu.
O líder russo assegurou também que tomará medidas para garantir a segurança da Rússia perante a recusa dos Estados Unidos e da NATO em abordar as suas preocupações de segurança e renunciar à Ucrânia o direito de fazer parte da Aliança Atlântica no futuro.
"Basta olhar para o mapa para ver como os países ocidentais cumpriram a sua promessa de não permitir que a NATO se expandisse para o leste", vincou.
“Simplesmente fomos enganados. Uma após a outra, houve cinco ondas de ampliação da NATO”, acrescentou.
Segundo Putin, como consequência a Aliança Atlântica e a sua infraestrutura militar “aproximaram-se das fronteiras russas”.
"Se a Ucrânia entrar na NATO, as ameaças militares à Rússia aumentarão várias vezes. E o perigo de um ataque surpresa contra o nosso país aumentará várias vezes", sustentou ainda.
De acordo com a agência estatal russa TASS, antes destas declarações, Vladimir Putin anunciou por telefone ao presidente francês Emmanuel Macron e ao chanceler alemão Olaf Scholz que "no futuro próximo pretendia assinar" um decreto a reconhecer as Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk.
Esta informação, prestada pelo serviço de imprensa do Kremlin, também já foi adiantada pela AFP e pela Reuters.
Macron e Scholz já fizeram saber estarem 'dececionados' pelo reconhecimento russo das regiões separatistas na Ucrânia.
Vladimir Putin já tinha anunciado, horas antes, que iria decidir hoje sobre o reconhecimento da independência das regiões separatistas pró-Rússia do leste da Ucrânia, apesar das ameaças de retaliação por parte dos países ocidentais, se o Presidente russo tomasse essa decisão.
Entretanto, a União Europeia (UE) já condenou a “grave violação” do direito internacional no reconhecimento por parte do Presidente russo, garantindo uma resposta ocidental “com unidade e firmeza”.
“O reconhecimento dos dois territórios separatistas na Ucrânia é uma violação flagrante do direito internacional, da integridade territorial da Ucrânia e dos acordos de Minsk”, reagiram os presidentes do Conselho Europeu, Charles Michel, e da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Numa mesma mensagem publicada por ambos na rede social Twitter, os responsáveis europeus vincaram que “a UE e os seus parceiros reagirão com unidade, firmeza e determinação em solidariedade”, juntamente com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e norte-americano, Joe Biden.
O reconhecimento por parte da Rússia da independência das regiões separatistas da Ucrânia representaria uma "rutura unilateral" dos acordos de Minsk de 2015, disse nesta segunda-feira o chefe de governo alemão Olaf Scholz, após uma conversa telefónica com Vladimir Putin.
Diante da gravidade da situação, o presidente alemão também teve conversas de emergência com Macron, com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky e com "os parceiros mais próximos da Alemanha", indicou o porta-voz do Governo, Steffen Hebestreit.
Zelensky, de resto, já convocou uma reunião "imediata" do Conselho de Segurança da ONU, perante a ameaça de uma invasão russa.
“A pedido do Presidente, Volodymyr Zelensky, peço oficialmente consultas imediatas dos membros do Conselho de Segurança da ONU, nos termos do artigo 6 do memorando de Budapeste”, escreveu o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmytro Kuleba, na rede social Twitter.
A Rússia é considerada a instigadora do conflito no leste do território ucraniano e a patrocinadora dos separatistas, tendo a guerra eclodido há oito anos, na sequência da anexação russa da península ucraniana da Crimeia, após a chegada ao poder de pró-ocidentais em Kiev, no início de 2014.
Por seu lado, Moscovo acusa as autoridades ucranianas de minar os acordos de paz de Minsk sobre o conflito que opõe a Ucrânia aos separatistas pró-russos, datados de 2015.
A posição de Moscovo sobre estas repúblicas provoca um curto-circuito no processo de paz resultante dos acordos, assinados sob mediação franco-alemã, já que estes visavam, precisamente, um regresso dos territórios à soberania ucraniana.
A decisão de Putin também abre caminho a um pedido de assistência militar à Rússia por parte desses territórios, conduzindo a uma justificação para a entrada de forças russas nessas regiões, dando razão aos países ocidentais que acusam Moscovo de estar a preparar uma invasão da Ucrânia, junto a cujas fronteiras já posicionaram mais de 150.000 soldados.
Na reunião do conselho de segurança russo, Putin afirmou hoje que não existe qualquer perspetiva de aplicação desses acordos, acusando novamente Kiev de os sabotar.
“Vemos bem que eles não têm absolutamente qualquer hipótese”, sustentou.
Esta observação seguiu-se a uma apresentação do seu encarregado das negociações de paz na Ucrânia, Dmitri Kozak, segundo quem o processo negocial “está em ponto morto desde 2019” e “nunca” as autoridades ucranianas aplicarão os acordos.
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