O primeiro sinal de que as explosões que danificaram os gasodutos Nord Stream 1 e 2 a 26 de setembro de 2022 não tinham sido um mero acaso foi dado pela Suécia em novembro desse ano. Apesar de terem ocorrido fugas de metano dos tubos, estas foram provocadas, veio-se a descobrir.

Depois da própria operadora Nord Stream AG — um consórcio germano-russo — ter adiantado que as crateras presentes tinham uma origem não-natural, o Estado sueco confirmou a possibilidade que já se discutia em surdina: de que houve sabotagem aos gasodutos sob o Mar Báltico e que ligam a Rússia à Alemanha.

“As análises que foram realizadas mostram restos de explosivos e foram descobertos vários objetos estranhos”, disse Mats Ljunggvist, o procurador sueco responsável pela investigação, em comunicado, não prestando mais detalhes.

Assim sendo, faltava saber quem terá sido responsável por este ato, sendo que as investigações das autoridades suecas, dinamarquesas e alemãs ainda não permitiram determinar a autoria deste incidente.

No entanto, esta quarta-feira, o jornalista de investigação Seymour Hersh — conhecido pela sua cobertura da guerra do Vietnam, do caso Watergate e da atividade norte-americana no Iraque e no Afeganistão, entre outros trabalhos — publicou um artigo na sua newsletter apontando os EUA como os autores das explosões nos Nord Stream.

Citando uma fonte anónima, Hersh escreveu que mergulhadores da Marinha dos EUA, ajudados pela Noruega, tinham colocado explosivos nos gasodutos em junho durante um exercício da NATO no mar Báltico, ativando-os três meses mais tarde. No mesmo artigo, o jornalista afirma que o próprio presidente dos EUA, Joe Biden, decidiu explodir os gasodutos para privar Moscovo da enorme receita da sua venda de gás para a Europa. 

Os países visados negaram prontamente estas acusações. Estas informações são “totalmente falsas” e resultam de “pura ficção”, disse Adrienne Watson, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. A mesma reação veio da CIA, onde um porta-voz garantiu que o artigo era “absolutamente falso”.

Além disso, também o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Noruega negou qualquer implicação do seu país, considerando as alegações “falsas”.

O que fará a Rússia?

Além das implicações legais que uma acusação destas poderá desencadear — porque, por exemplo, as explosões ocorreram nas zonas económicas exclusivas dinamarquesa e sueca —, a questão que se coloca neste momento é: como reagirá a Rússia?

Desde o incidente que a Rússia vinha a fazer acusações de que teria havido envolvimento ocidental nas explosões dos Nord Stream. No final de outubro, por exemplo, o exército russo acusou o Reino Unido de ter participado, repetindo-o em novembro. “Os nossos serviços de informações têm provas que sugerem que o ataque foi dirigido e coordenado por especialistas militares britânicos”, disse o porta-voz presidencial russo, Dmitry Peskov, numa conferência de imprensa.

“Há evidências de que o Reino Unido está envolvido numa sabotagem, num ataque terrorista contra infraestruturas vitais de energia não russas, mas internacionais”, continuou Peskov. Além disso, Moscovo tem lamentado que a Rússia foi colocada à margem das investigações.

Agora, perante o artigo de Hersh, o estado russo voltou novamente a apontar o dedo. "Algumas coisas [nesta publicação] são discutíveis, outras precisam de ser comprovadas, mas o artigo é notável pela sua análise aprofundada e apresentação harmoniosa" dos factos, disse Peskov à imprensa.

Segundo o porta-voz do Kremlin, o artigo de Hersh mostra "mais uma vez a necessidade de uma investigação internacional transparente sobre este ataque sem precedentes". “O mundo precisa de saber a verdade sobre quem conduziu este ato e sabotagem. Este é um precedente muito perigoso: se alguém o fez uma vez, pode fazê-lo outra vez em qualquer parte do mundo”, atirou Peskov.

Segundo a Reuters, a publicação do artigo de Hersh levantou ondas na esfera política russa, com membros do ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia a assumir abertamente a possibilidade de avançar com ações políticas e legais. "Isto vai ter consequências”, disse Sergei Ryabkov, membro desse ministério.

NATO em alerta

Temendo, no entanto, que a retaliação russa vá além da retórica ou da condenação política e legal, as marinhas de vários países da NATO estiveram hoje a avaliar riscos de novos ataques a infraestruturas subaquáticas. Portugal esteve representado pelo almirante Gouveia e Melo, Chefe do Estado Maior da Armada.

À agência Lusa, Gouveia e Melo admitiu “preocupações com as infraestruturas, porque já houve um ataque a uma infraestrutura subaquática”, aludindo assim ao caso Nord Stream.

O almirante especificou que parte das preocupações centra-se na “capacidade submarina dos adversários” e quanto à necessidade de os membros da NATO estarem “numa posição de, no mínimo, controlo nas atividades para evitar uma escalada”.

Além de gasodutos ou oleodutos subaquáticos, estão em causa infraestruturas como cabos elétricos e de telecomunicações submarinos e torres eólicas ou plataformas de exploração de gás ou petróleo ‘offshore’.

“O que é que nós pretendemos é que, através do espaço marítimo, não se crie um desequilíbrio desfavorável ao Ocidente, uma vez que o espaço marítimo é o motor da economia internacional”, vincou.

*com agências