No despacho judicial datado de quarta-feira, o Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa, "tudo visto e ponderado", deu razão ao recurso apresentado por André Ventura em que este pede a impugnação da decisão da Comissão para a Igualdade e a Discriminação Racial, a qual o tinha condenado ao pagamento de uma coima de 3.770 euros.
O tribunal considerou que a opinião de André Ventura, publicada no sua página do Facebook, "não consubstancia a prática de qualquer ilícito, nomeadamente a contraordenação que lhe é imputada, uma vez que, extravasa o âmbito da proteção das normas com fundamento nas quais foi condenado pela autoridade administrativa".
Segundo o tribunal, tal publicação na sua página do Facebook encontra-se protegida pelo "princípio fundamental da liberdade de expressão e opinião".
"Assim, concluímos que não se encontram preenchidos os elementos objetivo e consequentemente subjetivo da norma punitiva em causa, impondo-se a absolvição do recorrente (André Ventura)", refere a decisão.
Nos autos, o tribunal refere que, em 15 de novembro de 2017, André Ventura detinha uma página pessoal na rede social Facebook com o seu nome e de acesso público e com cerca de 20.000 seguidores.
Nesse dia, na página pessoal do Facebook - refere o despacho judicial - André Ventura escreveu e publicou o seguinte `post´: "Ainda esta semana uma família de etnia cigana espancou uma enfermeira e o segurança do Hospital de Beja. A RTP em silêncio. Quando se deram as agressões de Coimbra, os principais órgãos de informação públicos recusaram-se a referir a etnia dos agressores. Está o tornar-se uma obsessão, um tabu. É mais fácil e mais 'in' chamar racista a quem insiste em falar do problema. Inadmissível: somos nós todos que pagamos a RTP!".
O tribunal assinala que André Ventura era à data dos factos "uma figura pública, jurista de formação, professor universitário, comentador televisivo e político", ocupando também na altura o cargo de vereador na Câmara Municipal de Loures, eleito pelo partido PPD-PSD.
Após apontar factos não provados e ausência de prova contra o líder do Chega, o tribunal lembra que está "em causa a observância do princípio da presunção de inocência", consagrado na Constituição, que se traduz na garantia que "cada um tem de não ser julgado culpado enquanto não forem provados factos inerentes à imputação de um qualquer ilícito penal através de uma atividade probatória inequívoca".
"Caso tal não fosse assim, estaríamos a impor um ónus de prova ao suspeito ou acusado e a negar todos os princípios por que se rege o Direito Processual Penal português", lê-se no despacho judicial.
O tribunal nota ainda que "na questão da prova deverá ser sempre valorado a favor do arguido pela observância do `princípio do in dubio pro reo´ (em caso de dúvida absolve-se o réu), corolário máximo - acentua ainda - do "princípio da presunção de inocência".
Apreciando o caso concreto, o tribunal entende que o texto publicado por André Ventura, político, “não revela desde logo qualquer juízo de valor sobre qualquer pessoa ou grupo de pessoas, não discriminando de qualquer forma qualquer pessoa ou grupo, nomeadamente em função da etnia".
Do que resulta do aludido texto, diz o tribunal, é que André "discorda do facto de existirem publicações de notícias nos meios de comunicação social relativas à alegada prática de concretos factos suscetíveis de consubstanciarem crimes, sem que seja informada a etnia dos alegados concretos autores, bem como da ausência de publicação de tais notícias, não generalizando a prática de tais factos a todos os indivíduos de uma qualquer etnia".
Assim, pronunciou-se o tribunal, pela "inexistência qualquer forma de discriminação em função da etnia".
O líder do Chega tinha sido condenado no final de 2020 a pagar uma multa aplicada pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, no valor de 3.370 euros, por discriminação étnica na forma de assédio, contraordenação que fica agora sem efeito por decisão judicial.
"Escusado será de dizer que não pagarei nenhuma destas multas, em primeiro lugar porque não reconheço a esta entidade nenhuma autoridade para subverter o Estado de Direito e para limitar a liberdade de expressão de um cidadão, de um deputado da nação e líder político. Portanto, lamento muito que tenhamos chegado a este ponto", disse então André Ventura.
(Notícia atualizada às 19h44)
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