“No primeiro dia criámos um ‘site’ que fornecia toda a informação necessária para os refugiados, que lhes permitia viajar dentro da Ucrânia até às fronteiras que estavam abertas, saber como atravessar as fronteiras e como chegar a Portugal e se instalarem cá”, explicou à agência Lusa David Carvalhão, de 45 anos, um dos mentores do projeto.
Juntamente com a mulher, Kateryna Shepeliuk, de 32 anos, natural de Donetsk – que viu a sua casa destruída em 2014, aquando da ocupação da Crimeia, e reside em Portugal desde 2017 – criou também no final do primeiro dia de conflito uns formulários com ofertas e pedidos de ajuda.
David Carvalhão explicou que “as pessoas podiam colocar as ofertas das suas casas, alimentação ou viagens” nos formulários, enquanto uma pequena equipa de voluntários recebia chamadas telefónicas e mensagens escritas na rede Telegram e ia ajudando os refugiados.
No terceiro dia da invasão russa, depois de uma fase inicial “muito intensa”, o casal ajudou a criar uma organização designada We Help Ukraine e um centro de atendimento com mais de 200 voluntários, “para coordenar todo o processo, acompanhando o refugiado desde que entrava em contacto dentro da Ucrânia até passar a fronteira”.
“Encaminhávamos os refugiados para autocarros e outros meios de transporte e quando não havia autocarros usávamos algumas ofertas, como bilhetes de avião, para meter as pessoas, nomeadamente os mais idosos, pessoas mais frágeis”, explicou David Carvalhão.
Depois de entrarem em solo português, os refugiados eram ajudados a instalar-se em vários pontos do país por equipas de voluntários espalhadas pelo território nacional.
Passada a fase de instalação, o desafio passou a ser a integração dos cidadãos ucranianos na sociedade portuguesa, tendo o casal da Figueira da Foz recorrido ao desporto para estreitar laços com as populações locais.
“Envolvemos no total à volta de seis mil pessoas nestas atividades a nível nacional, ao longo do último ano, com resultados muito positivos”, sublinhou David Carvalhão, criador de empresas ‘start-up’ tecnológicas.
O projeto desenvolvido pelo casal vai continuar a realizar atividades desportivas de integração e a promover aulas de língua portuguesa, sobretudo para os adultos, já que as crianças “acabam por interagir bastante na escola e acabam por aprender português”.
Para David Carvalhão, o maior desafio que se coloca agora é “gerir uma série de problemas psicológicos que começam a surgir” nos refugiados, já que muitos deles “no choque inicial estavam um pouco anestesiados pelas circunstâncias”.
“Vamos tentando gerir com apoio psicológico e atividades, uma vez que o desporto ajuda bastante a gerir a ansiedade, tentando também apoiá-los dentro do possível nos problemas que vão tendo”, frisou.
O projeto From to Ukraine foi distinguido com o prémio Sport for Peace, no âmbito do Fórum Europeu do Desporto 2023, promovido pela Comissão Europeia.
O prémio reconhece o trabalho desenvolvido por Organizações Não-Governamentais no apoio a refugiados, com incidência nos provenientes da Ucrânia, através do uso do desporto como veículo para a integração social.
O galardão foi entregue na terça-feira em Estocolomo, Suécia, pelo ministro-adjunto para a integração europeia do Governo ucraniano, Andriy Chesnokov, que viajou mais de 30 horas para estar presente no evento.
Além de um cheque de 10 mil euros, o prémio “é um reconhecimento do trabalho fantástico desenvolvido por centenas de voluntários com milhares de refugiados ao longo de mais de um ano”, sintetiza David Carvalhão.
Comentários