A Supertaça não me enche as medidas. Bem sei que é uma espécie de aperitivo para um banquete longo e nem sempre de fácil digestão, como é o Campeonato Nacional mas, para falar a verdade, quase nunca me seduz e muito menos me faz queimar neurónios na quase insana tentativa de tentar adivinhar a equipa titular, as tácticas, as reacções dos intervenientes. É um troféu que não dá dinheiro, que pouco prestígio acrescenta e que nem sequer promove por aí além os jogadores.

Jorge Jesus, cujo futebol tanto apreciei nos últimos seis anos, saltou a cerca e parece apostado em aplicar a receita mágica na casa do grande rival. Até domingo ainda gosto dele mas, se acabado o jogo tiver ganho o apoucada competição, serei mais um a render-me à irracionalidade e a colocar o mediático treinador português na lista dos mal-amados.

Jesus foi campeão por três vezes em seis anos (o Benfica tem o hábito de ganhar um campeonato nacional a cada três anos e dois meses). Devolveu alguma da grandeza que se andava a desvanecer. Ninguém lhe pode atirar pedras, embora, face ao investimento feito, pudesse e devesse ter ganho mais dois campeonatos (caídos aos trambolhões nas mãos do portista Vitor Pereira, que não teve culpa das invenções do amadorense nem do empurrão generoso do actual presidente da Liga de Clubes, Pedro Proença).

Mas a verdade é que colocou a equipa a jogar futebol como poucos já se recordavam. Encheu o estádio, valorizou jogadores, foi o motor para negócios de milhões (ganhos, mas também gastos). Os mesmos milhões que agora o fizeram apear-se de um cavalo habituado a correr nos melhores circuitos para ir desbastar um potro que, no futuro, tanto pode vir a ser um campeão aclamado ou uma pileca trôpega. Continuarei a gostar dele até ao momento em que o animal que agora monta ultrapasse o meu. E desejo que isso não aconteça em nenhum dos anos em que tem contrato com o Sporting (um campeonato ganho a cada seis anos de vida). Mais sincero não posso ser.

Despesista e mandão, Jorge Jesus chegou a Alvalade não só como treinador. É, de facto, o treinador-presidente, pois é por sua acção que o clube - dito falido e sempre imerso num mar de instabilidade – tem vindo quase diariamente a assumir compromissos financeiros de monta e que vão desde a contratação de jogadores com tarimba e qualidade (mas também especialistas em criar confusões), até investimentos em instalações e equipamentos.

É devido a Jesus que regressam a Alvalade o irascível Octávio Machado e o enxovalhado Manuel Fernandes e que recolhe aos bastidores o sombrio Augusto Inácio e ao camarote presidencial o eleito presidente da instituição, Bruno de Carvalho. Simplificando: Jesus chegou, contratou à grande e à francesa (parece que até se prepara para dar já guia de marcha a um dos reforços), rodeou-se de pessoas da sua confiança e afastou aquelas que entende que não lhe irão trazer quaisquer vantagens. Face a isto porque não há de um benfiquista gostar de Jesus?

Sim. É verdade que o Sporting já joga futebol. Já é uma equipa que joga a correr na direcção da baliza contrária. Que pressiona os adversários e empolga as bancadas. Sim. É verdade que, pelo que se tem visto, o Sporting tem agora uma equipa bem mais favorita para vencer a Supertaça Cândido de Oliveira. Benfica e Sporting perderam alguns titulares. O Sporting comprou e parece disposto a continuar a reforçar-se. O Benfica não passa, para já, de um conjunto de promessas presidenciais. Até ver, de vitória o treinador do Benfica apenas tem o apelido. Os sócios, que até tinham perdoado os resultados pobrezinhos dos primeiros quatro jogos, estão agora exasperados com a miséria demonstrada ante um tal de Monterrey, equipa mexicana voluntariosa, já com andamento competitivo mas que nunca por nunca ser pode dar uma abada de 3-0 ao bicampeão nacional. As coisas vão mudar, dizem os benfiquistas mais tolerantes. E de facto vão: Gaitan deve sair em breve e a equipa ficará ainda mais debilitada. Maxi Pereira talvez não faça falta, mas a ausência de Lima vai ser muitas vezes lembrada. Quanto a reforços (daqueles que o são mesmo) é que ninguém ouve falar. Acumulam-se suspiros e o imenso desejo de ver cumprida a promessa de Vieira ao treinador – “Vais ter o mesmo que tiveram os outros treinadores”.

Os corações mais ansiosos aguardam, numa esperança meio destrambelhada, o anúncio da chegada de ídolos. Markovic e Coentrão são os mais badalados. O pior é que os jornais só falam, diariamente, em novos jogadores para os adversários. A calma começa a dar lugar à irritação. No domingo, no Estádio do Algarve, tudo poderá, no entanto, inverter-se em relação a Rui Vitória. Basta que ganhe o mediano troféu para voltar a sentir a confiança da mais numerosa massa associativa do país e do mundo. Se vencer deixará de ouvir coisas como “a equipa parece um conjunto de funcionários públicos alemães, obrigados a colar 257 estampilhas numa hora”.

Em caso de derrota ganha sobre os ombros o peso de uma pouco invejável cruz, passada por Jorge Jesus que, quando sentiu que já não era o centro do mundo (benfiquista) e que mais umas centenas de milhares de euros anuais (para além de um casarão de quase cinco milhões numa zona de gente fina, qual José Mourinho) lhe irão adocicar a reforma que já lhe acena, virou costas aos afectos, atravessou a estrada e foi por o grande rival a gastar dinheiro e a jogar à bola.

José António Bento Amaro é jornalista desde 1987 (Correio da Manhã, Semanário e Público). Tem 51 anos de idade e, garante, mais de mil de benfiquismo. Trabalhou em áreas como a justiça, o desporto e quase toda a informação geral. Actualmente "mata o tempo em pequenos, mas honestos jornais regionais" e, sobretudo, em alguns projectos que deseja venham a ser literários. O Benfica? "O Universo e pequeno para tanta grandeza". Nasceu na "mui nobre, gloriosa e sempre amiga Aldeia da Mata, Crato", concelho onde também "mata um pouquinho do tempo" como secretário da Assembleia Municipal.