Costuma dizer-se que jogadores como o João Félix são predestinados. De um ponto de vista teológico, não concordo. Estamos a falar de um jogador futebol, não de um seguidor da igreja calvinista. Adjetivar estes jogadores como predestinados retira-lhes mérito. O livre-arbítrio importa mais no futebol do que o livre-direto. João Félix é o jogador que é porque quer, não porque uma entidade divina definiu. Tem o destino nas mãos dele.
Prefiro vê-lo como prodígio. Por outro lado, não estou preparado para que seja um filho pródigo. Regressando à teologia, a parábola do filho pródigo, em Lucas 15:11-32, conta-nos a história de um filho que pede a herança ao pai e vai gastá-la irresponsavelmente para uma região distante, regressando na penúria e assumindo o seu pecado, sendo acolhido com compaixão pelo pai. Daí o pecado da prodigalidade, do desperdício, do esbanjamento. No caso de João Félix, quem incorrerá em prodigalidade serão os tubarões da Europa, dispostos a estoirar largas dezenas de milhões para poderem contar com os seus serviços. Se João Félix sair, será sempre bem recebido quando voltar – simplesmente julgo que ainda não está na hora de reclamar a sua parte da herança.
Seria normal que João Félix fosse um adolescente rebelde. Há uma tendência na idade dele para tentar dividir opiniões. Mas João Félix usufrui de um unanimidade em torno de si que não é normal para uma recém ex-criança. Conseguiu algo muito difícil, como o facto de a maioria dos adeptos dos três grandes concordar de que ele tem tudo para ser um enorme jogador. Note-se que estas pessoas conseguiriam discutir sobre se um copo de água fresca é agradável ou não. O papel de João Félix não é causar discórdia, mas gerar consenso. Talvez por isso é que Rui Vitória não tirou o proveito suficiente do seu talento. Porque João Félix não é de extremos. Rende mais no meio.
Não me parece que João Félix deva ficar porque não está preparado para jogar noutra liga, deve ficar porque ainda não fez tudo aquilo que pode fazer no Benfica. É que ele é dos que não engana, João Félix transmite uma confiança e uma maturidade que nos dá a ideia de que jogaria ao mais alto nível em qualquer equipa, desde o Manchester City ao Orlando Pirates. Compará-lo a Renato Sanches é ingrato e até cruel. Usar o facto do médio da Musgueira não ter tido o sucesso esperado no estrangeiro é uma chantagem para com Félix, um abuso emocional para demovê-lo de seguir a sua vida, caso seja essa a sua vontade.
Mas o amor é assim. O meu conflito de interesses obriga-me a lançar o pânico. Por isso, cá vai. João, não saias do Benfica porque pode acontecer-te o mesmo que aconteceu a outras jovens promessas! Não queiras ir aquecer bancos por essa Europa fora! A sério, a opção mais sensata é assinares contrato por 75 anos. Às 94 primaveras, aí sim, estarás dotado de estabilidade emocional e experiência para finalmente dares o salto. Ou o pulinho, vá. Aí fazes o contrato da tua vida. Mesmo no fim da vida, para teres vantagem negocial. A não ser que na altura aceites a nossa proposta de renovação. Podemos assinar até à época Eternidade / Infinitude, com mais uma de opção. Tu é que sabes, João. Tu é que sabes.
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