O líder da estrutura azul e branca foi peremptório quando questionado pelo jornalista sobre aquilo que lhe faltava alcançar ao fim de 38 anos à frente dos destinos do clube: "No FC Porto há sempre coisas para fazer". Não obstante ao facto de ter ganho vários títulos internacionais e nacionais, construído um estádio ou um museu enquanto presidente, aos 82 anos, Pinto da Costa considera que há planos para realizar no futuro.

"Ainda tenho coisas que gostava de fazer, por exemplo a Cidade Desportiva, que temos no pensamento e já na ação. É uma coisa que eu gostaria muito, e sobretudo gostava de no momento, no dia em que eu sair do FC Porto, que o FC Porto esteja sobretudo sólido e unido. Essa é que é a minha preocupação", frisou o presidente do campeão nacional de futebol, que enfatizou que o que "é feito" não é da sua responsabilidade nem de ninguém: "é por todos".

Uma das primeiras questões colocadas teve que ver com a sua saída. Se tudo correr como planeado, estará à frente do clube mais quatro anos. Ou seja, com o último mandato completo, cumpre 42 anos enquanto líder portista — aos 86 anos. Mas quer isso dizer que é o fim?

"Costuma-se dizer nunca digas nunca. E eu para mim mesmo e até publicamente já várias vezes disse que era o último mandato. Até já cheguei a dizer que, depois de terminar o mandato, não me recandidatava. E depois por circunstâncias diversas porque havia problemas que podiam acontecer se eu saísse, como por exemplo a construção deste Estádio [do Dragão], eu não saí. Portanto, nem vou dizer que é o último nem vou dizer que não é", respondeu Pinto da Costa.

Mas há algo que o possa levar a sair? "Chegar ao fim do mandato e ver que não sou necessário", respondeu. No entanto, salientou que um dos objetivos do atual mandato é deixar as contas do FC Porto em melhores condições. "Não tenho duvida nenhum de que o vamos alcançar", disse.

"Quando se fala, como vi até na vossa promoção desta entrevista, em falência técnica, [essa] existe porque nós somos obrigados a apresentar as contas segundo certos parâmetros. Porque senão tivermos essa obrigação [seria diferente]. O nosso plantel todo está no balanço por 76 milhões [de euros]. Nós agora este mês de transações fizemos 126 milhões. Como é que possível, então, com o plantel todo, com os craques que continuaram, o plantel valer 76 milhões? E nós fizemos 126 [milhões de euros em vendas]. É uma demonstração inequívoca de que os nossos ativos estão super desvalorizados", completou, antes de rematar que "vendemos dois bons jogadores, mas colmatámos".

Bazuca financeira? "A nós só nos sugam"

Questionado sobre a notícia do jornal desportivo Record de que há uma bazuca financeira prestes a entrar nos cofres do clube de 150 milhões de euros, Pinto da Costa frisou de que "a nós não chegará nada", a "nós só nos sugam tudo", sendo que a informação "não corresponde à realidade". Todavia, salienta que não dá como negar as perdas. Para isso, deu o exemplo da eliminação da Liga dos Campeões da última época.

"No ano passado ficamos acidentalmente fora da Liga dos Campeões. Tanto que acontece todos. Aconteceu com o nosso rival este ano. Curiosamente com o clube que foi eliminado pelo clube que no ano passado nos eliminou a nós, veja lá a ironia do destino. Os russos eliminaram-nos aqui e este ano foram eliminados pelo clube que eliminou o Benfica. O não ir à Champions é uma exceção. Nós depois do Real Madrid e Barcelona somos o clube da Europa que tem mais presenças. Agora o que aconteceu o ano passado foi acidente", disse Pinto da Costa.

O dirigente salientou que as contas "não fechassem" em junho e o FC Porto pudesse colocar os 126 das milhões das vendas dos jogadores, como a época de transferências foi posterior, aquilo que acontece é que o ganho já não não entra "nessas contas, vai entrar nas próximas". Outra das garantias dadas pelo dirigente foi de que o clube sairá "brevemente" do fair play financeiro. "Bastava que a época de transferências tivesse sido incluída, como é normal, nas contas do ano passado. O que nós vendemos dava para cobrir", enfatizou.

"Nunca fico satisfeito quando sai um bom jogador"

Questionado sobre se sentia responsabilidade direta no atual estado financeiro do clube, o presidente azul e branco esclareceu que sente "responsabilidade pessoal de tudo aquilo que acontece no FC Porto". "Agora, estou preocupado, evidente, mas estou seguro de que não vamos ter problemas no futuro", afirmou.

"Naturalmente quando se é afastado da Liga dos Campeões como nos aconteceu a nós o ano passado e aconteceu este ano ao Benfica, ou se aguenta o prejuízo ou se vende um ativo como o Benfica fez. Não estou a criticar, estou apenas a constatar, [pois] até o próprio treinador disse que perdeu o Ruben [Dias] porque foi o custo de não ir à Champions. Agora, nós nos ano passado entendemos que não vender. Aguentar o prejuízo para tentar ser campeões como fomos — até conseguimos a dobradinha — e depois então valorizar o nosso plantel e fazer as transferências", deu conta o presidente portista, que frisou que "nunca" fica satisfeito quando vê um bom jogador partir ao ser questionado sobre se estava satisfeito com a venda de Alex Telles para o Manchester United.

"Nunca fico satisfeito quando sai um bom jogador. Uma grande venda que fiquei desgostoso foi o Hulk e foi um grande negócio. Há momentos em que não temos outra solução. Uma semana antes de fechar o mercado, veio pedir para sair porque queria ir para o Manchester. Tentei que não fosse, tentei compensá-lo nem que ficasse até ao fim do ano. Mas manter um jogador que assume publicamente perante mim que quer sair, não pode ficar", explicou o dirigente.

Pinto da Costa revelou ainda os motivos que levaram o jogador brasileiro a sair.

"Com Alex nem foi problema negociar. O argumento para ir embora é que o atual selecionador do Brasil só convocava jogadores de três ou quatro campeonatos. Tentei contradizer até porque de momento ele está na seleção", disse ainda.

O presidente do FC Porto revelou ainda que os ‘dragões’ equacionaram a contratação de Lucas Veríssimo, central do Santos, mas que no final o treinador Sérgio Conceição decidiu por outras opções.

"Lucas Veríssimo não veio porque o FC Porto não quis. Tivemos vários centrais em observação, foi uma das opções que ficou para o final e no final o treinador quis ficar com Pepe, Mbemba, mais este Sarr e o Diogo Leite, que pretendeu que ficasse. Chegou a estar em cima da mesa. Se quiséssemos era nosso, não quisemos", afirmou.

Sucessão?

Sobre o seu sucessor Pinto da Costa também não quis falar em nome, apenas referiu que gostaria que fosse alguém "com a mesma paixão pelo FC Porto", acrescentado que Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, reúne essas características.

"Gostava que fosse alguém que sentisse o FC Porto, vivesse o FC Porto, trabalhasse para o FC Porto. Rui Moreira é um dos que reúne essas características. FC Porto não é uma monarquia. Se fosse teria de preparar o meu filho. Agora não é. Quem manda são os sócios. Se os sócios escolherem um aventureiro o problema é dos sócios. Isto não é meu. Nunca irei dar opinião, quem vier tem que ser a escolha dos sócios. A coisa pior que podia acontecer a quem me suceder era eu estar a dar conselhos. Gostava que tivesse a mesma paixão que eu pelo FC Porto, que ponha os interesses do clube acima de tudo e todos. A partir daí quero é vir ao futebol sem ter qualquer responsabilidade. No dia em que deixar de ser presidente quero ser apenas adepto do FC Porto", finalizou.

Adeptos e Inimigos 

"Todos me dão razão e me dizem que é incompreensível e até pessoas mais responsáveis me dizem que não é compreensível. Lembro-me quando foi a Taça de Portugal estavam lá altas figuras da Nação que me deram razão. Temos aqui os nossos camarotes e não podem estar aqui uma meia dúzia de pessoas? Tem lógica uma coisa ao ar livre estar tudo vazio quando vemos espetáculos como houveram no Pavilhão de Guimarães recentemente em que estão milhares de pessoas num recinto fechado todas juntas? Este estádio não tem possibilidades?", frisou Pinto da Costa, antes de dar conta do volume das pernas do clube devido ao facto dos jogos estarem a ser disputados à porta fechada. "Perdemos 29 milhões [de euros]. É o custo de não termos receita", contou, antes de dizer não "ter ideia" porque é os outros clubes em Portugal não são tão vocais quanto ao tema.

"Se calhar alguns dás-lhe mais jeito que não estejam lá os adeptos. Se eu tivesse adeptos que iam para me insultar não os queria cá, também queria o estádio vazio. Não estou a falar do Sporting, você [o jornalista] é que está. Não estou a falar de ninguém. É um cenário hipotético", contou ainda.

O líder portista, depois de elogiar Ramalho Eanes e de dizer que este era o "número 1 de Portugal", falou não de rivais, mas de inimigos.

"Quem não tem inimigos é porque está na terceira divisão ou na quarta. No dia em que nós não ganhemos nada somos todos amigos. Eu quando entrei para presidente tinha amigos em todo lado e tinha uma placa por ser o dirigente com melhor relacionamento com a imprensa. Sabe de quem? Do Correio da Manhã [ri]. Quando apareci era engraçado e tal, mas a partir do momento em que fomos campeões europeus... ai que agora são perigosos. Tudo mudou. Os verdadeiros inimigos do FC Porto estão na comunicação social. [...] O centralismo de Lisboa é um próprio estado de alma do próprio país. Os próprios do Porto quando vão para Lisboa acomodam-se. Agora vieram com a descentralização que é uma tanga para enganar", frisou.

Apito Dourado

Questionado pelo jornalista sobre a "mancha negra" do Apito Dourado na sua carreira enquanto presidente, Pinto da Costa respondeu com outra pergunta: "Uma suspeita é uma mancha negra? Então toda agente está com uma mancha negra. Hoje em Portugal suspeita-se de tudo e todos"

"Você pode não acreditar, mas quem me conhece sabe que nunca me preocupei ou preocupo com isso. Aquilo foi processo que começou no Minho e acabou em Leiria; percebeu-se logo a geografia. As acusações, quando as ouvi, fiquei totalmente descontraído. Nunca me preocupou. Fui várias vezes a tribunal e o Ministério Público recorria. Chegou-se ao ridículo de se numa situação o procurador era para ser absolvido, mas que tinha de recorrer porque era o Ministério Público que mandava", começou por explicar.

"Agora, fui ilibado de todos os processos, a dobrar, porque o Ministério Público recorria. Toda agente sabe que fiz a minha vida particular e familiar sempre igual. Tudo. Não deixei de ir a sítio nenhum, de conviver com os meus amigos. É por isso que me rio quando diz [o jornalista] que é uma mancha negraı".