Sim, os são paulinos foram, incrivelmente, os mais afetados pela movimentação de um treinador que não tem, hoje, nenhum vínculo oficial com o clube paulista. Em plena crise, na sequência de vários anos sem conquistar títulos, e insatisfeitos com a irregularidade do time comandado por Fernando Diniz nos jogos de “mata-mata”, os torcedores sonhavam com o regresso triunfal de Rogério após ter sido demitido em 2017.
Ceni desenvolveu-se nos anos fora do clube e é, hoje, apontado como o treinador brasileiro mais promissor no mercado nacional. A partir de janeiro, não teria, no São Paulo, o seu desafeto Leco como Presidente. Obviamente, a cadeira de treinador do clube está ocupada, mas, a não ser que um surpreendente título acontecesse, Diniz não conseguiria resistir à pressão no cargo.
Entretanto, em dois dias tudo mudou. Rogério recebeu uma proposta irrecusável para treinar aquele que é, provavelmente, o melhor plantel fora da Europa e lutar por três títulos ainda nesta temporada. O caminho claro de retorno à casa, para seguir o coração e devolver a glória ao clube querido ficou para depois. Rogério escolheu a carreira e a oportunidade que lhe apareceu.
Para quem tem planos, como Ceni, para chegar ao mercado europeu e à seleção brasileira, não existe melhor oportunidade. Ainda viúvo de Jorge Jesus, o Flamengo não conseguiu encontrar em Domé o treinador que procurava. O catalão ousou ao mudar radicalmente o estilo de jogo da equipa e nunca conseguiu convencer, com performance, apesar de bons resultados em campo.
O Flamengo é o melhor time do Brasil e tem o melhor plantel. É, por isso e pelos resultados de 2019, o único com a teórica “obrigação” de vencer o campeonato. Mas não conseguiu impor sua qualidade, tendo mesmo sido goleado em algumas derrotas. Mas os jogadores estão lá, há mais qualidade do que no ano passado e a equipa não parece ter perdido a sede por vitórias. Rogério percebeu a oportunidade.
Ontem, no Maracanã, por ironias dos deuses da bola, Rogério Ceni estreou-se no comando técnico do rubro-negro justamente contra o seu São Paulo, equipa contra a qual tinha sido eliminado na fase anterior da mesma Copa do Brasil, com o Fortaleza. Para tentar melhorar o time, em apenas um dia de trabalho, Ceni abriu o baú de memórias e montou uma equipa mais parecida com o Flamengo de JJ, com Bruno Henrique e Gabigol juntos e livres à frente.
Massacrou o São Paulo no primeiro tempo, que se tinha encurralado na defesa, mas perdeu muitas oportunidades. Na segunda metade, com dois golos em dois remates, o adversário aproveitou-se da quebra física do Flamengo e conseguiu controlar melhor a partida. Há 10 dias, os clubes enfrentaram-se no mesmo estádio num jogo a contar para Brasileirão que terminou com uma sonora goleada de 4-1 para os visitantes paulistas. Curiosamente, um resultado que pode ter sido decisivo para a demissão que abriu espaço para Rogério.
Racionalmente, não há como questionar a decisão do antigo guarda-redes. E, com base nas primeiras impressões, este tem tudo para fazer um bom trabalho e resgatar a áurea do time do ano passado. Emocionalmente, o torcedor do São Paulo não perdoou. Sentiu-se traído. Tão sofrido com a má gestão do seu clube e os péssimos resultados em campo nos últimos anos, sempre com derrotas marcantes nas competições de mata-mata, que precisou deste facto à vista para se lembrar que ama o clube acima de todos.
Como alguém que se lembra de amar o que tem, o torcedor abraçou o time, demonstrou apoio no aeroporto e nas redes sociais adotou o lema #AbraçadoComDiniz. Percebeu que é o que tem para este ano e que tem chances reais, apesar de difíceis, de vencer. O São Paulo pode-se tornar líder do Brasileirão se vencer os jogos que estão em atraso e, agora, lidera a eliminatória contra o Flamengo na Copa do Brasil.
Ceni optou pela razão. O torcedor do São Paulo é pura emoção. Hoje, vê no seu ídolo maior um rival. Está magoado. Vai comemorar muito se eliminar o antigo treinador novamente. Mas, certamente, ficará feliz se um dia, o bom filho voltar a casa.
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