Se apenas uma ideia se pudesse tirar da palestra de Nikos Vettas é a de que a União Europeia está aquém das suas possibilidades. E se, por um lado, afirma que a economia chinesa está em queda, por outro lembra que as economias da UE e do Reino Unido são bastante fracas quando comparadas, por exemplo, com a chinesa e a americana.

Nikos Vettas aponta a direção de forma muito simples e com base em previsões económicas. Mas sabe que não é por ser simples que é fácil: “Graças a Deus que não são os economistas a tomar as decisões políticas.”

O diretor geral e fundador da fundação para investigação económica e industrial reconhece que a Europa recuperou as perdas da pandemia, mas que no último ano e meio a produção industrial voltou a descer. E a origem do problema deixou uma onda de espanto na plateia do 15.º Fórum Económico de Limassol.

“O elefante nesta sala é a Alemanha, e o elefante na Alemanha é a indústria automóvel”. Mas conclui que ainda é pouco claro perceber as razões desta quebra, e se está ligada a outros setores europeus.

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Contudo, como sempre, na história da comunidade económica os países unem-se nas suas semelhanças e separam-se nas suas idiossincrasias gerando um equilíbrio que tem funcionado nos últimos anos. E o jogo de poderes pode mudar a qualquer momento com a energia certa.

“A indústria na Europa tem um portfólio muito interessante, economias como a espanhola têm estado a fazer um percurso muito bom de mudança do setor tradicional para o setor tecnológico” e isto pode catapultá-la, por oposição ao que está a acontecer na Alemanha.

Acerca deste exemplo e da possibilidade de Portugal conseguir seguir o exemplo espanhol, lembra, mais tarde à margem da cimeira, ao SAPO24 que “a produtividade em qualquer país depende de quão produtiva cada pessoa é em cada trabalho, comparando os mesmos trabalhos em todos os países. Mas especialmente a mistura dos tipos de trabalho que se fazem”.

Logo, em Portugal, é importante “mover capital e trabalho para setores mais produtivos, isso é a chave.” Recorre ao que Portugal “fez muito bem depois dos anos da crise, ao aumentar o turismo”. O que não só trouxe um “aumento de rendimento significativo”, como também “mostrou sinais de melhoria em algumas partes de fabricação”.

O economista grego acredita que “a fabricação moderna é a solução para países do sul europeu. E não criar negócios megalómanos que não tenham razão de existir em países como Portugal.”

Acrescentando que “se o que esses negócios procuram é salários baixos, podem ir para outros lugares do mundo. Se  querem algo extremamente tecnológico, têm mais países inovadores para ir.” E, por isso, a chave está em  “criar negócios que sejam suficientemente flexíveis, como negócios boutiques muito inovadores e que empregam pessoas da alta tecnologia, jovens e  pessoas com habilidades, que podem exportar para os mercados mundiais”.

E sim, concorda que o PRR não deve ser para “cobrir necessidades temporárias”. Mas sim para ajudar a transição para estes setores, que tem que obrigatoriamente acontecer nos próximos três ou quatro anos”.

Se o discurso de Nikos Vettas se foca no potencial por atingir, também não atira a economia europeia para um lugar de definhamento.

“Não é como se estivéssemos a ir para o precipício, mas não há previsão da economia europeia disparar nos próximos 15 anos se não houver reformas”.

Transição Verde

As reformas são necessárias, mas o professor de economia e negócios da Universidade de Atenas reconhece que não são essas políticas que trazem votos, mesmo quando são necessárias e reconhecidas pela população.

Usa como exemplo disso a tão atual transição verde. E se há uns anos os europeus a viam como prioridade, hoje questionam-se porque devem ser eles a navegar esta onda sozinhos.  “Tornou-se uma questão política, o cidadão médio europeu vê como muito alto o preço que tem de pagar pela transição verde. E acha que é algo a evitar. É uma mudança de paradigma muito grande”.

Se do ponto de vista do presente os europeus não estão errados, a longo prazo esta pode ser uma das piores apostas na evolução e crescimento europeu. E, para já, nada está a ser feito para o mudar.

“A quantidade de dinheiro que tem de ser posta de parte por causa da alterações climáticas é muito significativa e neste momento não estamos a fazê-lo”.

É uma mudança necessária, mas é cara. Contudo, não é cara a longo prazo. Mas a curto prazo mudar a tecnologia em cada setor é muito dispendiosos e resta saber quem a irá financiar.

Resiliência

Se há coisa que Nikos Vettas valoriza, e salienta, na economia global é a resiliência que tem mostrado depois das crises económicas, geopolíticas, ambientais e de saúde que assolaram o planeta nos últimos 25 anos.

E que foram capazes de demonstrar que a Europa tem muita força e que consegue aguentar tudo. Contudo, deixa o alerta: “Não sabemos se a determinado momento a economia mundial vai ter as consequências de tudo o que já foi acumulado”.

Principalmente num mundo onde o equilíbrio de poder é tão periclitante. “Os políticos não sabem como serão as relações com a China daqui a 10 anos, mas do que sabem, sabem que não será bom.”

E a solução para diminuir as consequências nefastas desse crescimento é apenas diminuir a dependência tecnológica que temos do gigante asiático. Até porque, garante, “a China tem tem mais a perder com uma crise”.

Explica, contudo, que é impossível diminuir essa dependência sem haver mudanças de fundo. “Com base na qualidade das instituições a UE devia ser a líder mundial de produtividade, mas temos elos fracos entre a educação e o negócio e somos muito lentos a incorporar tecnologia nos negócios. Isto pode mudar, mas não se continuarmos a fazer o que fazemos.”

A juntar a esta lentidão há um problema de demografia para o qual os países têm dificuldade em olhar. Usa exemplo da sua terra natal, a Grécia, que não é muito diferente do português, e de onde saem pessoas qualificadas a um ritmo que impede que haja planeamento económico.

Se o académico refere que um dos problemas da Europa é a demografia, o SAPO24 questiona-o se se pode então usar a migração atual para mitigar esse problema. Começa por dizer que o problema demográfico da União Europeia é diferente de país para país, “se nuns está estagnada, noutros está a diminuir”. E que não há na Europa políticas de imigração organizadas.

Antes de partir para as soluções do problema da demografia, foca-se nas soluções do problema das migrações e, de facto, há pontos em que um pode ser a solução do outro. Nomeadamente em iniciar “uma política mais ativa de atração de pessoas com talento”. Refere que é possível fazê-lo através de um sistema universitário mais aberto “algo que o Reino Unido faz há décadas. Atrai pessoas para estuda que depois se vão misturando”. Acrescenta, aliás, que esta estratégia não é novidade na Europa. “No passado, muitos países europeus também traziam pessoas de suas antigas colónias”. Mas, no fundo, acredita que a solução para o problema demográfico da Europa reside na criação de um “sistema de educação melhor , mais aberto e mais moderno, que atraia pessoas de outras partes do mundo e, gradualmente, atraia mais sangue novo”.

Confrontado com o IRS Jovem português, Nikos Vettas lembra que o envelhecimento da Europa influencia de sobremaneira as decisões políticas e, por isso, é importante que “que se perceba que se tem que fazer escolhas difíceis. Uma delas é o preço das reformas em comparação com preço dos salários de entrada no mercado de trabalho. Mas para isso é preciso atrair pessoas e também reter-las”. Conclui, por isso, que medidas como o IRS Jovem é o que se deve fazer”.

Além de “modernizar o sistema universitário e a ligação entre os universitários e o mercado de trabalho.”

À medida que vai falando a questão subjacente parece ser apenas uma: se já há o diagnóstico e a solução, porque continuamos a não crescer no nosso potencial? A resposta é simples: porque reformar não traz votos.

E, por isso, são as democracias as que podem ter maior problema de crescimento. As reformas económicas e políticas são um desafio. “As reformas não trazem votos e atraem problemas. Não vamos mudar a Europa sem algum desconforto”, reconhece.

"Os  políticos têm que ver a imagem alargada e perceber o que se pode perder a longo prazo. Precisam disso para sobreviver”, conclui.

*O SAPO24 foi ao 15º Fórum Económico de Limassol a convite da empresa Freedom24