“Acho que o euro foi um sucesso. O meu balanço é francamente positivo”, considera Ricardo Ferreira Reis, professor da Católica Lisbon School of Business & Economics, sobre os 20 anos de euro que se assinalam no próximo dia 01 de janeiro.
Para Ricardo Ferreira Reis ,o balanço é triplamente positivo. Em primeiro lugar, numa dimensão global, “estou convencido de que a existência do euro permite uma afirmação da economia europeia face ao crescimento de blocos, como o chinês, que ainda não tem uma divisa forte no contexto internacional”, afirmou.
Em segundo lugar, disse, “a introdução de uma divisa europeia que cada vez mais se afirma no espaço dos mercados financeiros globais é muito importante para a dimensão europeia, fortaleceu imenso aquilo que é a aventura da União Europeia (UE)”.
Para o professor da Católica, a moeda única “é um patamar de integração bastante ambicioso porque, de facto, tirou muito do que era a liberdade de política monetária aos vários países”, criando “uma exigência de integração muito grande”.
E a terceira dimensão é a nacional. “Também aqui daria uma nota positiva, no sentido em que temos cumprido o que são as obrigações da moeda única. Mas aqui a nota não é tão lisonjeira porque isto é uma espécie de puxão de orelhas contínuo de disciplina imposta aos governos portugueses, que acho que não existiria se estivéssemos fora do euro”, declarou o professor.
Também para Rui Bernardes Serra, economista-chefe do Montepio, “o balanço é positivo” e “a principal conquista foi a estabilidade de preços e a pertença a uma região com uma moeda forte e única, gozando de taxas de juro bem mais baixas do que as observadas antes de se iniciar o ajustamento”.
Rui Bernardes Serra considera que “fazer parte do euro permitiu, ainda, reduzir os custos de transação e de incerteza relacionados com a volatilidade do mercado cambial”, tornando mais fácil a comparação de preços e permitindo uma maior concorrência entre o espaço europeu que aderiu ao euro.
Já para António Afonso, professor do ISEG, uma das grandes vantagens da existência da moeda única tem sido “a redução dos custos de financiamento que os países membros têm obtido”, e “não só os países membros como também os próprios cidadãos, porque as taxas de juro convergiram de forma bastante significativa, desde o início da moeda única”.
O professor do ISEG aponta também outra mais-valia: “o aumento da sincronização do ciclo económico”, ou seja, “algum alinhamento da forma como os países se posicionaram no crescimento económico, em termos de recessões”, o que, de alguma forma, ajuda na condução da política económica.
Questionado sobre eventuais impactos da não adesão de Portugal ao euro, Ricardo Ferreira Reis alerta que o país teria tido desvalorizações contínuas do escudo, teria sido competitivo em termos monetários porque a moeda seria mais fraca do que o resto das moedas europeias e teria empregos de baixos salários no contexto europeu.
“Se já é assim com o euro, imagine o que seria com o escudo”, alerta, acrescentando que, sem o euro, haveria “contas públicas perfeitamente desregradas”, o que se aplicaria a todos os países do sul da Europa.
“Esta incapacidade que temos de contenção das contas públicas seria ainda mais complicada com uma moeda própria”, frisa o professor da Católica, acrescentando que, “em Portugal, teria sido um desastre maior do que por momentos foram estes 20 anos de finanças públicas”.
Mas também a própria Grécia, “apesar de todo o sofrimento”, beneficiou muito do euro e “seria ainda muito pior se estivesse estado fora”, aplicando-se o mesmo a Itália e Espanha.
“Estou convencido de que movimentos independentistas teriam sido muito mais fortes se não fosse o euro”, afirma Ricardo Ferreira Reis.
Outra vantagem do euro para António Afonso foi a redução dos custos de financiamento da economia.
O professor do ISEG considera que se Portugal não tivesse tido a moeda única “dificilmente conseguiria acompanhar os países da área do euro em termos de crescimento, produtividade e em termos de redução dos custos”.
Do lado das desvantagens, para Rui Bernardes Serra, a principal “foi a incapacidade de Portugal, no início da União Económica e Monetária (UEM), saber viver numa moeda única em que os crescimentos nos preços e salários desfasados de ganhos de produtividade conduziram a perdas de competitividade, gerando desequilíbrios, que culminaram na entrada da ‘troika’ em Portugal, com todos os custos que o programa de ajustamento teve na economia, no emprego e, em última análise, no bem-estar das famílias portuguesas”.
Para António Afonso, “do outro lado da medalha” houve “alguns desvios”, ou seja, alguns países — Espanha, Grécia, Itália e Portugal — nos quais “o nível de crescimento em termos de convergência com a média da UE não foi tão grande como o inicialmente esperado”, o que acarreta, “além de problemas económicos, alguns problemas sociais”.
Apesar dos desvios, Rui Bernardes Serra admite que “o euro atingiu a maioridade e a sua arquitetura está hoje bem mais completa do que aquando do seu nascimento”.
“O Banco Central Europeu [BCE] é hoje uma entidade muito respeitada, que age com independência e que conseguiu interpretar os tratados de uma forma ampla. No contexto do seu mandato, lançou programas de compra de ativos com criação monetária, que numa análise mais estrita, poderiam violar os tratados europeus por constituírem financiamentos, ainda que indiretos, dos défices públicos. Foram tomados passos no sentido da União Bancária”, frisa.
Para o economista-chefe do Montepio “falta, todavia, ainda um importante pilar: a integração orçamental”, que incluísse um mecanismo de subsídios de desemprego a nível comunitário, “que é um importantíssimo estabilizador automático entre regiões num Estado federal”.
Ricardo Ferreira Reis considera, por seu turno, que o ‘Brexit’ é, precisamente, sintoma de “uma crise de crescimento importante para que depois o sucesso do projeto de integração seja grande”.
“Esta coisa de andarmos com o euro no bolso, de andarmos com a UE no bolso é importantíssima na dimensão da integração europeia”, conclui.
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