Em causa está o próximo quadro financeiro plurianual (QFP) pós-2020, no cenário da saída do Reino Unido da União Europeia – que contribui anualmente com entre 10 a 14 mil milhões de euros para o orçamento comunitário.
Portugal defende um aumento da contribuição dos países para 1,23% do rendimento nacional bruto – na linha dos 1,2% aprovado no passado pelo Conselho Europeu -, mas Bruxelas deverá aprovar o crescimento dessas contribuições para 1,3%.
“Isso significará pouco menos de mais 600 milhões de euros anuais. Onde os vamos buscar? Ao nosso orçamento. Onde é que o nosso orçamento vai buscá-los? Aos impostos pagos pelos portugueses”, disse hoje o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, numa audição na comissão parlamentar de Assuntos Europeus.
O chefe da diplomacia portuguesa reiterou a proposta do Governo português de criar novas taxas sobre transações financeiras, serviços digitais desterritorializados, bancos emissores de moeda ou sobre empresas poluentes.
“Eu digo que sim, é preciso pedir mais aos portugueses, mas é preciso pedir muito mais às 'Googles' deste mundo ou às transações dos mercados financeiros que hoje ninguém taxa, ou aos bancos centrais que emitem moeda ou àqueles que são mais poluentes”, sustentou Santos Silva, sublinhando que estas “formas de taxação, em sentido amplo, não [incidirão] sobre rendimentos das pessoas”.
Dirigindo-se à deputada comunista Paula Santos, o ministro afirmou: “Peço ao seu partido que pense nisto: a alternativa a não ter recursos próprios, querendo mais recursos, e aceitando o aumento de contribuições para o teto de 1,3%, é carregar por ano os contribuintes portugueses em quase mais 600 milhões de euros”.
PCP e Bloco de Esquerda condenaram o aumento do orçamento disponível para a militarização da União Europeia, com o ministro a defender outros destinos para as verbas.
“Quero preservar a centralidade dos instrumentos mais poderosos que a Europa tem para a sua convergência. O Governo defende o aumento do bolo. O mais importante dos novos recursos que nós vamos ter e que vamos gastar nos próximos sete anos têm a ver com coisas que estão muito longe de qualquer militarização ou armamentismo: proteção dos migrantes, acolhimento dos refugiados, transição energética, conectividade física e digital intra e transeuropeia, o apoio ao desenvolvimento e as parcerias para o desenvolvimento com outras regiões”, sustentou.
A deputada comunista tinha advogado que o reforço do orçamento da UE deve “resultar das contribuições dos Estados-membros, com uma função redistributiva”, opondo-se a uma “política fiscal europeia”.
Pelo Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares sustentou que “claramente, a única certeza que já temos é que o reforço da vertente da defesa e de militarização acontecerá e que será feito de forma a beneficiar os contribuidores França e Alemanha”.
Por seu lado, o deputado do CDS-PP Pedro Mota Soares defendeu que, “mais do que discutir a dimensão financeira, importa discutir onde faz sentido alocarmos estes fundos comunitários”, recordando que os centristas propuseram a sua aplicação no cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (Agenda 2030 das Nações Unidas), na agricultura e mar, na coesão social e territorial, na demografia e no investimento e crescimento da produtividade
“Não afastamos novos desafios para os fundos, como a segurança e defesa, a ação externa, fronteiras e migrações, mas não à custa de dois pilares – a política agrícola comum e a política de coesão”, referiu.
Sobre a proposta de criação de novos impostos europeus, Mota Soares considerou “uma ideia muito desinteressante”, recordando que a Alemanha já se mostrou disponível para aumentar contribuições para o orçamento comunitário, mas não concorda com os impostos.
Também o PSD, pela voz de António Costa da Silva, tinha questionado o ministro sobre a posição do Governo para financiar o funcionamento da Europa no futuro, afirmando que falta “clareza”, alertando que eventuais novos impostos “são matérias muito sensíveis que podem afetar os cidadãos europeus”.
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