Mesmo assim sabe bem a calma com que sou recebido. Escolho manter a televisão desligada. As notícias deprimem-me. E a verdade é que vamos apanhando o essencial ao longo do dia, mercê da irritante e constante conexão ao mundo, com a qual parece não conseguirmos passar. 

São perto das 8 horas da noite e ligo o rádio. Àquela hora, durante os dias de semana, a sintonia só pode ser uma. Começam a ecoar os primeiros acordes do separador que anuncia o início do programa Portugália, na emissora Antena3, da Rádio e Televisão de Portugal. A voz serena e plena de Henrique Amaro ressoa das colunas da pequena aparelhagem da sala, anunciando um rol de projectos musicais que em comum têm a lusofonia. De todas as épocas, mas com enfoque nas novidades, principalmente aquelas que passam ao lado dos holofotes mediáticos. A seleção abrange uma variedade enorme de estilos musicais. Em quase todos os programas descobrimos (ou redescobrimos) algo novo ou ouvimos de viva-voz os responsáveis por esses projectos, em entrevistas que são conversas e que imaginamos desenrolarem-se no sofá da nossa sala.

Lembro-me quando uma vez, há mais de 10 anos certamente, me cruzei com o Henrique nas ruas dos Olivais, em Lisboa. Relativamente perto das instalações da RTP. Passei por ele, reconheci-o. Parei, ponderei e voltei para trás. Perguntei-lhe se ele não era o Henrique Amaro, locutor da Antena3 e responsável pelo Portugália, numa atabalhoada algaraviada que transpirava o nervosismo que me arrebatava naquele momento. O Henrique aparentava estar meio surpreendido por aquela interpelação. Talvez desabituado a ser importunado na via pública. Eu não sabia bem o que dizer e saiu-me o batidíssimo cliché - “gosto muito do seu trabalho”, para quase de imediato me ter arrependido das palavras proferidas. Mas a realidade é que essas mesmas palavras nunca terão sido ditas por mim com tanta honestidade. Nunca foram tão bem utilizadas. 

Obrigado, Henrique.