O que está a acontecer em França é uma revolução política, com grande salto no desconhecido. O que está pela frente é um novo sistema político que pode vir a propagar-se pela Europa.
Os dois partidos centrais até agora na paisagem política francesa, o PS e Os Republicanos, conseguiram apenas modestos 26% dos votos. Tinham obtido 56% na anterior eleição presidencial, em 2012.
Os dois candidatos que se colocaram nas extremas opostas do leque político, Le Pen e Mélenchon, receberam neste domingo mais de 40% dos votos: sete milhões e 600 mil com Le Pen, sete milhões com Mélenchon.
O próximo presidente vai ter a complexa tarefa de tentar reconciliar os franceses após uma campanha fortemente marcada pela vontade de protesto e de rompimento radical com o sistema. Poderá conseguir essa reconciliação ou vai ter o destino dos dois predecessores, Sarkozy e Hollande, obrigados à retirada logo ao fim de um mandato? A clivagem parece ter deixado de passar por categorias partidárias, impõe-se a alternativa ideológica sobre o modelo de sociedade fora do sistema tradicional de partidos. Com promessas de revitalização da prática política.
Tudo pode estar muito volátil. Em janeiro, Fillon parecia ter a eleição garantida. Três meses de revelações sobre oportunismos e faltas de ética instalaram divisões e Fillon está excluído da decisão. É de prever que a família política gaulista, a direita clássica, entre em fase de ajuste de contas em busca de responsabilidades sobre este rotundo desastre. Vai reencontrar-se em tempo útil para as eleições parlamentares de junho?
Macron vai governar com quem? Há nomes evidentes, como o do centrista Bayrou. O próximo presidente promete gente nova na política. Mas quem vai proporcionar a necessária maioria política no parlamento para poder governar? Vai criar um novo partido? Vai procurar entendimentos com fracções do partido que foi de Mitterand?
Macron abre um novo horizonte ao situar-se para além da divisão ideológica entre esquerda e direita. Como é que poderá ser desenvolvida essa opção pragmática centrada nas necessidades do cidadão? Vai conseguir?
O anunciado próximo presidente da França é liberal e europeísta. Chega à presidência seis meses de entrar nos 40 anos de idade.
O programa de Macron proclama que cada jovem francês de 18 anos recebe 500 euros para usar em práticas culturais. Os estudantes só podem levar telemóvel para a escola quando atingirem 15 anos de idade. Vão ser multiplicados os cursos de formação para atualização e reciclagem das competências de trabalhadores. Há anúncios de Estado mais pequeno e mais eficaz, com garantia das prestações sociais.
Macron foi quadro superior num banco de negócios, o Rothschild, e promete agora tomar as rédeas do desgovernado capitalismo francês. Formado em filosofia, antigo inspector de finanças, Macron vai conseguir proteger o futuro dos cidadãos com um sistema robusto de segurança social? Como? Vai conseguir, como prometeu, melhores hospitais e uma estratégia educativa e social que proteja os mais jovens da exclusão e da radicalização islâmica? A tarefa é gigantesca e entra por um tempo em que muita gente está afastada para fora do campo da sensatez tolerante.
Macron já conseguiu um milagre. Há um ano, quase ninguém sabia da existência desta personagem. Tinha sido jovem conselheiro e secretário-geral adjunto do presidente Hollande, tinha sido ministro da Economia no governo Hollande/Valls e tinha optado pela demissão em divergência política. Em 6 de abril do ano passado, fundou um movimento político com iniciais, EM, que correspondem às do seu nome. Muito pouca gente terá imaginado que a marcha do En Marche levaria à presidência da França em maio de 2017. Parece conseguido.
Para começar a governar e cumprir as promessas precisa de maioria parlamentar nas legislativas de junho. Tudo está para fazer num tempo de economia anémica, dinheiro escasso nas caixas, ameaças dos violentos e radicalismo inflamado nas extremas.
Tudo isto, sendo que a família Le Pen cresce em votos de eleição para eleição. Talvez até que seja conseguida uma revolução que reencontre as pessoas com o governo político do país.
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