Bom, mas eu li Os Maias, parece que ainda se lê, e é sobre incesto, não é? E li Jorge Amado, li Marguerite Duras, O Amante, teria uns 15 anos. Li Anais Nin e Henry Miller, a loucura das Novas Cartas Portuguesas de Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno. Também tive a sorte de ter uma professora de português que achava os Lusíadas sexies e Bocage inspirador.

O mundo muda quando se tem bons professores. Os bons professores são os que abrem  caminhos, são os que nos incentivam, não são os que controlam a nossa moral.

No secundário, se me recordo, a malta já pensa em sexo. Diria mesmo que se pensa bastante em sexo, porque nada melhor do que o abordar através da poesia.

Li algures que a Ode Triunfal de Fernando Pessoa, na verdade Álvaro de Campos, para sermos correctos, incita à pedofilia. Ó por favor! Estamos a falar de miúdos com 16 ou 17 anos, miúdos que não são parvos, que usam as redes sociais e têm acesso a sexo gratuito online se assim o desejarem. Não é falar que a malta se entende e desmistifica preconceitos e ideias falsas?

Ao manual escolar da Porto Editora, editora que recusa a acusação de censura, faltam três versos: "Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas". E ainda: "E cujas filhas aos oito anos - e eu acho isto belo e amo-o! - / Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada".

Na versão dos professores do mesmo manual o poema está na íntegra. Os docentes são livres de escolher discutir ou não os versos cortados? Parece que é essa a ideia. Dizem que há uma preocupação didática-pedagógica. Com o quê? Estamos a falar de miúdos crescidos, daqui a nada universitários ou no mercado de trabalho.

Ora, a obra de Fernando Pessoa e os respectivos heterónimos integra as chamadas “aprendizagens essenciais” definidas pelo Ministério da Educação. Acho bem. Como acho bem Os Maias ou Os Lusíadas com as suas sereias encantatórias.

O que não acho bem é o puritanismo e esta polícia do pensamento. Já a tivemos em Portugal, durou até 1974, vamos voltar atrás? Há um politicamente correcto e um sentido regulador que se impõe e que é tutelado por alguém. Não sei quem seja, mas as proibições e censuras cheiram sempre mal. Podem invocar o que quiserem, não tenho como entender.