Eis a grande notícia da semana: a fase final da Liga dos Campeões vai-se realizar em Portugal. Marcelo rejubilou e Costa não só rejubilou também, como disse ainda que esta era uma conquista de todos os portugueses e que era um prémio para os profissionais de saúde. Honestamente, só me deixou meio triste que não tivéssemos já ido todos para o Marquês festejar esta conquista, abraçando toda a gente, dando linguadões a desconhecidos e tudo.

Começando logo pelos profissionais de saúde, parece que já os estou a ver aos berros de felicidade, ainda dentro daqueles fatos anti-covid, que são só o nível imediatamente inferior ao fato de astronauta no que à indumentária de profissões de risco diz respeito. Os profissionais de saúde passam horas e horas ali enfiados, ficam exaustos e com marcas na cara, todos os dias têm contactos de risco, muitos deles isolaram-se das famílias. São tantas as condicionantes pelo que têm passado médicos, enfermeiros, técnicos ou auxiliares, mas não é em vão.

Está bem que salvar pessoas é giro, mas não se compara a viver no país que vai receber a final da Champions. Quantos deles é que poderão daqui a uns anos dizer aos netos:

- "Sabes onde é que eu estava durante a pandemia?"

-"Hm, na linha de frente?", responde o neto.

- "Isso também, mas mais importante que isso, estava no Santa Maria que é ali mais ou menos perto do estádio da Luz onde a Juventus estava a jogar e o Ronaldo marcou um golo tão bom que quase desliguei o ventilador sem querer a um doente".

Histórias épicas que poderão vir a ser contadas, portanto. Mas não só pelos profissionais de saúde, claro, porque isto, lá está, é uma conquista de todos nós. Consigo imaginar a felicidade com que foi recebida esta notícia, por todos os milhares de novos desempregados, pelas centenas de empresas que fecharam ou estão em risco de fechar, e até mesmo pelas pessoas que morreram de covid ou os seus familiares. Tudo a festejar, tudo alegre, tudo orgulhoso do seu país. Aliás, a única coisa chata de se morrer de covid é mesmo já não poder ver a final da Champions – que vai ser em Portugal, caso ainda não tenham percebido.

Imagino ainda a felicidade das pessoas em condição de sem-abrigo, que fizeram pela primeira vez na História uma manifestação pelo direito à habitação, mas que, naturalmente, não teve um centésimo da cobertura mediática que teve a notícia da Champions. “Yaaaaay! Não temos casa, nem comida, a comunicação social e o governo estão-se completamente a marimbar para nós, mas está tudo bem, desde que encontremos uma montra que deixe uma TV ligada cá para fora para se ver a bola!”. Que alegria que são as prioridades de Portugal.

Por último, e até dentro do futebol, só falta festejarmos a medida da Federação que quer impor um tecto salarial às jogadoras, mas não aos jogadores. Só faltava mesmo uma pitada de machismo e patriarcado nesta semana, para nos orgulharmos ainda mais do nosso país.

Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:

- Tou na Moda: primeiro single do álbum Cuca Monga (Zarco, Capitão Fausto, Luís Severo, Ganso, Rapaz Ego). Está óptimo e com um vídeo lindo que podem ver no YouTube.

- How Fascism Works: excelente livro de Jason Stanley.

- Chico Buarque: tudo dele.