Agora, claro que nada é tão urgente como estar sempre impecavelmente vestido com a última trend-spring-summer-fancy-casual-nice-vision-future-chic-rooftop-fashion. Quem diz última, diz, no máximo, da semana passada porque mais que isso já é “demódé”- que vergonha - e a proximidade entre o Dia da Mulher e a Moda Lisboa fez-me pensar nisso.
Ninguém ouve o que dizemos se estivermos mal vestidos, com roupas velhas, com cortes que ficaram nos anos 90, 2000 ou em Fevereiro de 2017. É impensável aparecermos em público duas vezes com a mesma t-shirt, o mesmo vestido, os mesmos ténis. O que seria do “girl power” se todas não pudessem empilhar quilos e quilos de roupa no quarto, ter “closets” do tamanho de uma aldeia indiana onde habitam 10 mil pessoas, poder escolher uma peça de roupa diferente para cada minuto do dia nos próximos três séculos mesmo não comprando mais nada? Comprar muito, comprar tudo, vestir, despir, voltar a vestir, experimentar outro, ir aos saldos, este top só custa 3€, então compra das 20 cores disponíveis, compra mais, compra tudo, e depois grita ao mundo como és livre no teu “girl power”. E quem diz “girl”, diz “boy”. Um fato para cada dia do ano, t-shirts usadas uma vez e deitadas fora, porque igualdade é os homens também poderem ter assim tanta roupa e não repetirem uma gravata uma única vez na vida.
Claro que isto tudo tem muito mais graça do que parece. Actualmente, há 40 milhões de trabalhadores na indústria têxtil mundial. 85% destes trabalhadores são mulheres que recebem mais ou menos 3 dólares por dia por causa das grandes marcas que esmagam impiedosamente as margens dos fabricantes. Wohoooo! GIRL POWER! Três dólares dá para comprar mais um top. Não dá é para comerem grande coisa, ou pagar uma casa, pôr os putos na escola ou ir ao médico. Mas para as mulheres do Ocidente não se apresentarem com um único borboto, as mulheres da Índia, da China ou do Bangladesh têm que trabalhar um pouco mais. Vá lá, são só 12 horas por dia. Têm de ser umas para as outras, não é verdade?
“Somos todos iguais, mas uns somos mais iguais que outros.”
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
Documentário: "The True Cost". É duro de ver, mas vale muito a pena ficar a conhecer melhor como funciona a indústria da moda. Vai deixar-vos a pensar um pouco, no mínimo.
Holi: A tradicional festa das cores indiana vai ser celebrada no Martim Moniz. É este sábado, dia 18, a partir ds 16h00. Levem roupas usadas, sem medos.
Dia do Pai: Não adianta muito fazerem posts no Facebook a adorar o vosso pai e a contar ao mundo como ele é incrível, se depois não lhe ligarem e forem dar um abraço em pessoa.
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