Simultaneamente, a cidade de Raqqa, na Síria, ocupada pelo ISIS desde janeiro de 2014 e considerada como a sua capital, estás prestes a cair, cercada por forças sírias, curdas, turcas e de várias fações, apoiadas pela aviação norte-americana e russa.

Extingue-se assim a existência territorial do Daesh, o Califado Islâmico do Iraque e da Síria, que durante três anos, com a justificação da sua forma extremista de salafismo sunita, torturou, massacrou e escravizou milhares de pessoas e destruiu inúmeros monumentos património da Humanidade.

Utilizando meios de comunicação de ponta, especificamente a Internet, e uma linguagem cinematográfica contemporânea, graças aos seus elementos vindos dos países mais avançados tecnologicamente, o Daesh mostrou ao mundo - atónito e chocado - as formas mais radicais de violência, incluindo crianças a fazer execuções sumárias, torturas medievais e escravatura.

Mas ninguém tem ilusões de que a religião fundamentalista do ISIS e os seus métodos bárbaros terminam com a presença territorial em regiões da Síria e do Iraque. Por um lado, metade dos militantes do grupo são originários do Ocidente - e muitos conseguirão voltar para casa; por outro, nestes quatro anos a filosofia do ISIS espalhou-se por todo o mundo, criando metástases que será muito difícil, senão impossível, extinguir.

Uma versão do ISIS manifesta-se nos atentados que vão acontecendo um pouco por toda a parte, mas sobretudo na Europa. Os seus agentes tanto podem ser militantes treinados para ações terroristas, como indivíduos isolados a agir por conta própria, depois de radicalizados nas prisões e nas mesquitas da União Europeia. É sintomático que TODOS os terroristas até hoje abatidos na Europa nasceram na Europa. Não há nenhuma ação que tenha sido praticada por refugiados ou imigrantes da Síria ou de outros países muçulmanos. Como uma epidemia de propagação aérea, a “mania” do terrorismo espalha-se por contágio de proximidade, levando jovens que se sentem excluídos da sociedade onde nasceram a entrar num radicalismo suicida.

Além destes “lobos solitários”, que agem sozinhos ou em pequenas alcateias, há ainda os grupos armados que se formaram um pouco por toda a parte, ou grupos já existentes com outras denominações que resolveram aderir ao ISIS. Neste momento, o ISIS têm existência confirmada em dezoito países, nomeadamente Argélia, Líbia, Egito, Nigéria, Arábia Saudita, Iémen, Afeganistão, Paquistão, Índia, Mali, Somália, Filipinas e Indonésia, além de praticamente toda a faixa subsaariana.

Um caso típico é o do Boko Haram (nome oficial: al-Wilāyat al-Islāmiyya Gharb Afrīqiyyah, ou "Grupo do povo de Sunnah para a oração e o Jihad"), fundado na Nigéria em 2002 e que se espalhou pelo Chade e pelos Camarões. Em Março de 2015 declarou-se súbdito do Estado Islâmico, e já tem no seu ativo cerca de 20 mil assassinatos e incontáveis casos de tortura e esclavagismo. Pelas últimas contas, o Boko Haram obrigou à fuga de suas casas de cerca de dois milhões e meio de pessoas. O Governo da Nigéria pediu a ajuda de tropas estrangeiras, mas os resultados continuam a não se ver.

Outro caso é o do ISIS do Afeganistão, que nasceu de dissidentes da Al-Qaida. Esta continua a existir, também um pouco por toda a parte, mas tem uma filosofia ligeiramente diferente – acham que a grande vitória do Islão será num futuro distante e que o principal inimigo são os Estados Unidos, enquanto o ISIS prega a vitória imediata e considera os sunis como os primeiros alvos a abater.

Também na prática há diferenças; comparando com o ISIS, a Al-Qaida é muito branda, recorrendo mais à execução sumária “clássica”, por fuzilamento ou explosão, e sem torturas muito criativas. Preferem atirar ácido ao rosto das mulheres, ou aleijá-las permanentemente, do que escraviza-las e violá-las. O facto é que com a conversão ao ISIS de elementos da Al-Qaida fartos de tanta brandura, reacendeu-se a guerra civil no Afeganistão e está a espalhar-se pelas regiões tribais do Paquistão.

O caso mais recente é o das Filipinas. Durante anos, vários grupos de islamistas radicais faziam guerrilha contra o governo central do país, sem grande sucesso. Há um ano, Rodrigo Duterte tornou-se Presidente – democraticamente eleito – e começou uma repressão sem precedentes contra o tráfico de droga, dando mão livre às forças policiais e mesmo aos civis para que liquidassem sumariamente vendedores e consumidores. Ocupado com estas actividades, não reparou que os grupos de guerrilha se tinham juntado e aderido à filosofia do ISIS. De repente, na própria ilha de origem de Duterte, Mindanao, os combatentes islâmicos, veteranos de anos de luta, ocuparam a cidade de Marawi, massacrando milhares de habitantes, na forma do costume. Apanhado de surpresa e particularmente chocado com o facto da ocupação acontecer na sua terra natal, Duterte enviou os seus militares de elite, com instruções de não se preocupar com banalidades como a segurança dos habitantes; mesmo assim, até este momento, um mês decorrido, o ISIS continua a ocupar Marawi.

Segundo as informações centralizadas pelo Departamento de Estado norte-americano, que pode não conseguir fazer nada de muito eficiente contra o ISIS mas pelo menos recebe “intel” de todos os serviços de inteligência, inclusive israelitas, egípcios, etc., a organização está em fase de expansão, não de retração. Ainda por cima o fim da ocupação física do sul da Síria e norte do Iraque irá libertar milhares de militantes para se espalharem por toda a parte. Quem financia o ISIS, agora que perdeu o petróleo que vendia a toda a gente, inclusive aos seus inimigos? Pois será a Arábia Saudita (que pratica a mesma religião sunita salafista) e, dizem as más línguas, Israel, que quer é ver os muçulmanos a autodestruir-se. Mas isso é outra história.

Resumindo: o Estado Islâmico morreu, longa vida ao ISIS!

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