Bem sei que as imagens captadas na Portela nos convocam a proferir frases como “isto só em Portugal”, mas a verdade é que os aeroportos estão caóticos em todo o lado. Em todo o caso, o estado da aviação comercial no verão de 2022 foi resumido por um vídeo, que se tornou viral, de um cidadão brasileiro que se queixava da prisão intestinal a que fora condenado face aos sucessivos cancelamentos de voos em Lisboa. Em consequência dessas imagens de horror, posso assumir que atualmente tenho mais medo de aeroportos do que de andar de avião. O maior problema de voar deixou de ser a turbulência e passou a ser a flatulência. Efetivamente, não estava à espera de que o maior pânico dos últimos anos em aeroportos se devesse a este tipo de evacuações.

O aeroporto da Portela tem uma personalidade difícil, faz questão de dificultar a vida aos passageiros. Quando não interessa que as pessoas levem com água, chove lá dentro. Quando as pessoas ficam presas no terminal, não oferece a possibilidade de um duche rápido. No aeroporto e no país do desenrascanço, admira-me que ainda não se tenha mobilizado os bombeiros para dar uma mangueirada nas partes dos turistas. É que há uma imagem da cidade a manter - o “cheira bem, cheira a Lisboa” não pode ser desmentido à chegada pela proliferação do odor a escroto de viajante. Se queremos continuar a roubar turistas à França, não podemos adoptar os mesmos padrões de higiene.

Por outro lado, é certo que nos tornámos muito mimados no que toca à eficiência de andar de avião. Continua a ser um milagre que um pássaro de plástico e metal consiga sobrevoar o Atlântico, não me parece que Gago Coutinho e Sacadura Cabral se tenham queixado do wi-fi. Temos de ser gratos e saber sofrer, o que não falta é entretenimento. Por exemplo, um aeroporto não é muito diferente de uma discoteca: tem pista, pessoas aceleradas, seguranças que gritam contigo, imenso álcool à venda, amigos perdidos do seu grupo e uma deprimente zona de fumadores. Basta levarem uma coluna a bombar a canção "Pepas" do artista "Farruko" e nem vão ficar tristes se o vosso voo para Ibiza for cancelado. Definitivamente, um aeroporto pode ser um destino em si - a Portela, por exemplo, é uma viagem ao Portugal dos anos 70.

Entretanto, há que arranjar soluções para atenuar o caos que hoje se vive nos aeroportos. Aterrar noutros sítios é uma hipótese. Sabemos que ninguém quer saber de atletismo fora das quatro semanas dos Olímpicos, pelo que há uma alternativa válida nas pistas de tartan. O próprio rio Tejo não é de descartar: acaba com as discussões sobre se o novo aeroporto deve ser na margem Norte ou na margem Sul. Aumentar a capacidade de cada avião é também um caminho. Se o leitor não se importou de andar na bagageira de um Renault Laguna nos anos 90 para voltar da noite, certamente estará confortável num porão. Aproveitar melhor os recursos humanos é também essencial: há que pôr Pedro Nuno Santos como hospedeira da TAP. Só mesmo, mesmo, em último caso é que vale a pena considerar outros meios de transporte. É que Portugal é um país em que ficamos horas à espera de um avião, mas séculos à espera de uma ferrovia.

 

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