O Tribunal da Relação do Porto considerou a violação de uma mulher inconsciente de “ilicitude baixa” pois a culpa dos arguidos situava-se na “mediana” e, por isso, condenou os dois homens somente a pena suspensa. No fundo, o que estes juízes querem dizer é que violar com jeitinho não ofende nem magoa ninguém e já estou a ver este tipo de pensamento a tornar-se norma e a ser utilizado noutros casos:

- Sim, ele violou, mas no fim fez-lhe cafuné e conchinha.

- Sim, ele violou, mas disse-lhe que ela era a mais bonita de todas as que ele já tinha violado e, por isso, o dano causado não foi grave comparativamente à subida do ego proporcionado.

- Sim, ele violou, mas deixou dez euros na mesinha de cabeceira, por isso a senhora é uma prostituta.

Isto abre uma porta perigosa, pois passa a mensagem de “Pessoal, se quiserem violar alguém, esperem que ela esteja muito bêbeda e depois já podem.” e desconfio que seja tudo uma conspiração dos fabricantes de bebidas alcoólicas para que os homens continuem a pagar bebidas às mulheres.

O Tribunal da Relação do Porto devia mudar o nome para Tribunal da Relação sem Consentimento do Porto. Viram o trocadilho? Forte. Não sei os detalhes todos do caso, por isso estou só a especular, mas não me parece que haja desculpa para inserir o pénis na vagina de uma mulher inconsciente a não ser que lhes tenham ensinado mal a fazer manobras de reanimação. Encontrar uma mulher desmaiada na casa de banho e, em vez de a ajudar, decidir violá-la é um comportamento de animal necrófago como a hiena. Não consigo perceber, até porque toda a gente sabe que as pessoas inconscientes são tão más na cama como uma boneca insuflável. Até me admiro de só ter sido violada pelo barman e pelo porteiro. Estranho o DJ não se ter juntado à festa, já que estão sempre prontos para fazer coisas que já outros fizeram.

Talvez o problema não seja apenas a leveza desta decisão, mas o facto de a lei, no geral, ser demasiado branda para crimes de violação: o crime de violação tem uma pena de 3 a 10 anos em Portugal. Se os traumas que ficam para a vítima podem ser os mesmos, os moldes nos quais o crime ocorre são diferentes. Se alguém que viola vinte mulheres, com violência e de forma premeditada, só fica, no máximo, dez anos preso, talvez estes dois anormais, por comparação, não possam ter mais do que pena suspensa. Se a pena de violação ascendesse aos 25 anos, estes dois trogloditas já tinham ido bater com os costados na choldra pelo menos dez anos, anos esses em que seriam violados no duche sempre com “ilicitude baixa” já que nos duches da prisão há um “ambiente de sedução mútua” pois apanham os sabonetes de uma forma de quem está mesmo a pedi-las e a provocar.

Já dizia o Dave Chappelle que a ter de ser violado, preferia sê-lo pelo Bill Cosby que sempre metia as vítimas a dormir e custava menos. Há um fundo de verdade nesta piada e talvez tenha sido isso que na cabeça dos juízes os levou – a meu ver, erradamente – a dar a pena como suspensa. É como assaltar uma casa: se o assalto for feito com a casa vazia, é uma coisa, se for feito com os moradores lá dentro e recorrendo a violência, é outra. Embora o objectivo do crime e resultado seja igual – casa assaltada – a forma diferente como ocorre dita sentenças e gravidade diferentes. Faz sentido e não, não estou a comprar violar uma mulher com assaltar uma casa.

É uma decisão machista? Talvez seja, mas se fosse um homem inconsciente a ser abusado por duas mulheres, estas também nunca seriam condenadas a prisão efectiva a não ser que tivessem usado os dentes. A decisão em si não será machista, mas o pensamento na cabeça de muitos juízes parece ser ainda do “ela estava a provocar”. São juízes que fazem pouco sexo e que, por isso, ficam excitados com mulheres inconscientes em casas de banho públicas. Cada um tem as suas taras, é pena é trazerem as suas frustrações pessoais para os tribunais. Por mim, violação violenta teria a pena de prisão perpétua, e a violação com jeitinho teria uma sentença de 25 anos, no mínimo. Para que haja justiça neste caso, só nos resta esperar que não tenham usado preservativo e que a mulher já tivesse HIV, Gonorreia, Hepatite C, Clamídia e Herpes.

Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:

Para ver: Idiotas, Ponto

Para rir: Guilherme Geirinhas, em Modo Voo

Para comer: Torradas com manteiga.