Otelo, um homem que o tempo não curou

Tomás Albino Gomes
Tomás Albino Gomes

“Apesar dos excessos que se possam apontar, nomeadamente no período pós 25 de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho foi, e será sempre considerado, o maior símbolo individual do Movimento das Forças Armadas.” - Eduardo Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República

“A capacidade estratégica e operacional de Otelo Saraiva de Carvalho e a sua dedicação e generosidade foram decisivas para o sucesso, sem derramamento de sangue, da Revolução dos Cravos.” - António Costa, primeiro-ministro.

“É ainda cedo para a História o apreciar com a devida distância. No entanto, parece inquestionável a importância capital que teve no 25 de abril, o símbolo que constituiu de uma linha político-militar durante a revolução, que fica na memória de muitos portugueses associado a lances controversos no início da nossa Democracia, e que suscitou paixões, tal como rejeições.” - Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República

“Para muitos, morreu hoje o Capitão de Abril, para outros o responsável máximo do Copcon, para mim morreu o homem que mandou matar o meu pai e mais 14 vitimas inocentes, um bebé, o Nuno de apenas quatro meses, o Henrique, o Diamantino, o Alexandre, o Álvaro, o Adolfo, o Agostinho, o Fernando, o José, o Evaristo e o Rogério.” - Manuel Castelo-Branco, filho de uma das vítimas das FP-25

“[Otelo foi] um dos principais obreiros do golpe de estado que ficou conhecido como a Revolução dos Cravos, o 25 de Abril de 1974. (…) [Mas o CDS não esquece]] Comando Operacional do Continente, os mandados de captura em branco e as vítimas mortais do terrorismo das FP25. Não esquecemos que Otelo Saraiva de Carvalho era o rosto de toda essa atrocidade.” - Miguel Barbosa, vice-presidente do CDS-PP

Muito se disse e muito se escreveu este domingo a propósito da morte de Otelo Saraiva de Carvalho, militar e estratego da "Revolução dos Cravos", falecido esta de madrugada aos 84 anos, no Hospital Militar, em Lisboa.

Nascido em 31 de agosto de 1936 em Lourenço Marques, atual Maputo, Moçambique, Otelo Nuno Romão Saraiva de Carvalho teve uma carreira militar desde os anos 1960 e fez uma comissão durante a guerra colonial na Guiné-Bissau, onde se cruzou com o general António de Spínola, até ao pós-25 de Abril de 1974.

No Movimento das Forças Armadas (MFA), que derrubou 48 anos de ditadura, foi ele o encarregado de elaborar o plano de operações militares e, daí, ser conhecido como 'estratego do 25 de abril'.

Depois do '25 de abril', foi comandante do COPCON, o Comando Operacional do Continente, durante o Processo Revolucionário em Curso (PREC), surgindo associado à chamada esquerda militar, mais radical, e foi candidato presidencial em 1976.

Na década de 1980, o seu nome surge associado às Forças Populares 25 de Abril (FP-25 de Abril), organização armada responsável por dezenas de atentados e 15 mortos, tendo sido condenado, em 1986, a 15 anos de prisão por associação terrorista. Em 1991, recebeu um indulto, tendo sido amnistiado cinco anos depois, uma decisão que levantou muita polémica na altura.

É esta a vida que leva a tantas opiniões e mesmo paixões divergentes, dos que salientam o homem que foi estratega da revolução que instaurou uma democracia liberal em Portugal e os que condenam o homem pelo período pós-revolucionário e que teve sempre o nome associado ao movimento terrorista das FP-25.

Como é que um país se despede de uma figura como Otelo? Como é que se celebra um homem que derrubou um regime ditatorial ao mesmo tempo que se condena a sua ligação ao movimento terrorista pós Abril?

O tempo cura tudo, mas nunca curou a imagem de Otelo. Nunca o glorificou ou condenou por inteiro. Hoje, no dia da sua morte, não podia ser diferente.

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