A Hungria bateu o pé e a União Europeia falhou acordo para apoio à Ucrânia. Porquê?

Alexandra Antunes
Alexandra Antunes

O primeiro dia do Conselho Europeu terminou hoje em Bruxelas sem acordo sobre a revisão do orçamento da UE a longo prazo, que inclui ajuda financeira à Ucrânia — 50 mil milhões de euros de apoio à reconstrução e modernização do país.

Que apoio é este?

Os líderes da UE, reunidos desde quinta-feira em Bruxelas, discutiram um quadro de negociação proposto pelo presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, para rever o orçamento plurianual, incluindo o apoio à Ucrânia.

Inicialmente, Charles Michel propôs um total de verbas adicionais ao Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2024-2027 de cerca de 22 mil milhões de euros, um terço do proposto pela Comissão Europeia, que foi de 66 mil milhões de euros, numa tentativa de alcançar consenso.

Depois de discussões esta tarde ao nível dos peritos que aconselham os Estados-membros, a nova caixa de negociação fixou-se em 21 mil milhões de euros.

Nesta discussão, que requer unanimidade entre os líderes europeus, manteve-se sempre, ainda assim, a mesma verba de 17 mil milhões de euros em subvenções para modernização e reconstrução da Ucrânia, de uma reserva financeira de 50 mil milhões de euros (que conta ainda com 33 mil milhões de euros em empréstimos), como o executivo comunitário havia proposto.

Mas não se chegou a acordo. 

Fontes comunitárias precisaram que a mais recente versão do quadro de negociação “foi objeto de um forte apoio por parte de 26 Estados-membros, mas a Hungria repetiu claramente que não vai autorizar novas verbas para a Ucrânia, nem o pagamento de juros do Fundo de Recuperação da UE”.

Porquê o entrave da Hungria?

As maiores dificuldades relacionam-se com a posição húngara, num ceticismo sobre as minorias húngaras em território ucraniano e a corrupção existente no país, mas sobretudo uma questão não relacionada com Kiev, que se prende com a suspensão de verbas comunitárias a Budapeste.

Assim, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, condicionou a ajuda da Europa à Ucrânia à “libertação dos milhares de milhões de euros” para a Hungria, antes de considerar a possibilidade de levantar o veto a uma nova ajuda a Kiev.

"Sempre disse que se houvesse uma alteração ao orçamento da União Europeia (...), a Hungria aproveitaria a oportunidade para exigir claramente o que merece. Não metade, não um quarto, mas tudo", afirmou o líder nacionalista numa entrevista à rádio estatal.

Assim, qual a solução? 

Foi referido que chegou a estar em cima da mesa uma proposta portuguesa de avançar apenas a 26 Estados-membros (distribuindo os encargos por estes), no âmbito do quadro de negociação que foi afinado esta noite, dado o bloqueio da Hungria, mas não havia base jurídica que o suportasse.

Assim sendo, está previsto que os líderes da UE se voltem a reunir numa cimeira extraordinária para discutir esta matéria orçamental, a ser realizada em janeiro ou em fevereiro do próximo ano.

De recordar que a a UE está a discutir a revisão do orçamento para o período 2024-2027, no âmbito da qual está prevista uma reserva financeira para os próximos quatro anos, com empréstimos e subvenções para reconstrução da Ucrânia pós-guerra, montante que será mobilizado consoante a situação no terreno.

O que diz o Conselho Europeu sobre a falta de consenso? 

Apesar da falta de acordo, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, referiu que "há um forte apoio" à proposta de revisão do orçamento da UE a longo prazo, que engloba "todas as prioridades", desde o "apoio à Ucrânia, migrações e o fundo de solidariedade".

"Vamos voltar a isto no início do próximo ano", confirmou, acrescentando, contudo, que houve progressos no que diz respeito ao alargamento e que os 27 enviaram "um sinal muito forte aos cidadãos europeus e aos ucranianos".

Questionado sobre a possibilidade de a questão ser ultrapassada a 26, como foi na quinta-feira a abertura das negociações formais com a Ucrânia e a Moldova — o primeiro-ministro húngaro não participou na votação —, Charles Michel rejeitou especular sobre o assunto e disse querer concentrar-se em chegar à unanimidade entre os Estados-membros.

Por outro lado, Charles Michel disse ter “várias ferramentas no bolso” para a União Europeia avançar com o apoio financeiro à Ucrânia, atualmente previsto no orçamento a longo prazo, face a um eventual novo bloqueio húngaro.

E Portugal? 

O primeiro-ministro defendeu hoje que “não está em causa” o apoio da União Europeia à Ucrânia. “O financiamento até janeiro está assegurado. Agora vamos trabalhar no instrumento que estava proposto criar para assegurar previsibilidade e estabilidade”, disse António Costa.

“Ficou muito claro que, havendo um acordo a 26, o apoio não está em causa […], a Ucrânia não deixará de ser apoiada”, insistiu o primeiro-ministro.

António Costa advogou que, pelo menos, Budapeste não bloqueou a “decisão mais importante”, nomeadamente a abertura das negociações com a Ucrânia para adesão à UE.

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