"Ligamos pessoas.

Isso pode ser bom se o tornarem positivo. Talvez alguém encontre o amor. Talvez até salve a vida de alguém à beira do suicídio.

Então conectamos mais pessoas.

Isso pode ser mau se o tornarem negativo. Talvez custe a vida a alguém ao expô-lo a bullies. Talvez um dia alguém morra num ataque terrorista coordenado com as nossas ferramentas.

Nós continuamos a conectar pessoas”.

Em junho de 2016, estas eram as palavras do vice-presidente do Facebook, Andrew Bosworth, escritas no memorando que foi divulgado no dia 29 de março pelo Buzz Feed. Até então, este memorando apenas circulava internamente na empresa.

Designado “The Ugly”, o memorando interno mostra que a empresa entende os riscos físicos e sociais que a plataforma implica, ainda que minimizasse esses riscos em público.

O documento levanta a questão sobre o que é que o Facebook está disposto a sacrificar pelo seu crescimento e missão de ligar as pessoas. “Isto é literalmente o que nós fazemos. Conectamos pessoas. Ponto”, continua o executivo.

Andrew Bosworth faz parte de um pequeno círculo interno do Facebook. Integrou a equipa em janeiro de 2006, deixando a Microsoft, e, ao longo dos anos, esteve envolvido em vários segmentos da empresa, como o “News Feed” ou os grupos de sistemas anti-abuso do Facebook.

A publicação deste memorando vem na sequência de uma vasta polémica internacional com a empresa Cambridge Analytica, acusada de ter recuperado dados de 50 milhões de utilizadores da rede social, sem o seu consentimento, para elaborar um programa informático destinado a influenciar o voto dos eleitores, favorecendo a campanha de Donald Trump.

Com as atenções direcionadas para si, Bosworth respondeu na sua conta oficial de Twitter.

“Eu não concordo com 'post' hoje nem concordei com ele quando o escrevi. O objetivo deste 'post', tal como muitos outros que escrevi internamente, trazer os problemas que merecem mais discussão entre a empresa à superfície”.

Bosworth diz que olhar para este memorando — agora eliminado do painel interno da empresa — isoladamente faz parecer que ele, ou mesmo a empresa, têm uma postura que não se verifica.“Eu preocupo-me profundamente com a forma como o nosso produto afeta as pessoas”, escreve o CEO, acrescentando que assume a responsabilidade social de fazer com que impacto [nas pessoas] seja positivo.

Não existe registo de uma resposta de Zuckerberg ao memorando. Contudo, o fundador do Facebook enviou uma declaração ao Buzz Feed News após a sua publicação:

“Boz [Bosworth] é um talentoso líder que diz muitas coisas provocativas. Este foi um [exemplo] que a maior parte das pessoas do Facebook, incluindo eu, discordou fortemente. Nós nunca acreditámos que os fins justificam os meios”.

“Reconhecemos que conectar pessoas não é suficiente por si só. Também precisamos de trabalhar para aproximar as pessoas. Nós mudámos a nossa missão e o foco para refletir neste último ano”, finaliza Zuckerberg.

Segundo o The New York Times, existe um ambiente de preocupação na empresa; alguns empregados estão a tentar encontrar quem divulgou este memorando e outros tentam apagar comentários ou mensagens antigas que possam parecer polémicas e espoletar mais notícias.