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Deslocando-se por Muswell Hill na sua bicicleta com quadro em aço de carbono, as mãos pousadas levemente sobre o guiador feito em mistura de alumínio, Dennis Cradle sente uma exaustão prazerosa. A viagem do escritório até à sua casa no norte de Londres é um tanto longa, mas fê-la em tempo razoável. É algo que hesitaria contar aos seus familiares, mas Dennis vê-se como um defensor de certos valores. O percurso árduo pela cidade satisfaz o espartano que tem em si. O ciclismo mantém-no esguio e arguto e, consequentemente, com um aspeto bastante sportif nos seus calções de licra apertados e jersey em tecido elástico, tendo em conta os 48 anos que se lhe avizinham.

Enquanto diretor da Divisão D4 do MI5, responsável pelas iniciativas de contraespionagem contra a Rússia e a China, Dennis alcançou um nível de senioridade que lhe permite, se assim o desejar, ser acompanhado até casa por um motorista ao volante de um dos veículos anónimos de gama média da frota do Serviço. Uma oferta tentadora, por certo, no que toca às aparências, mas um caminho perigoso. Uma vez perdida a boa forma física e lá se vai tudo. Sem dar por isso, acabaria por se tornar num daqueles velhos barrigudos e desgrenhados que financiam o bar de Thames House de uísque Laprohaig na mão e queixumes nos lábios sobre como tudo era melhor antes de as mulheres obstinadas terem usurpado os Recursos Humanos.

O ciclismo mantém Dennis cuidadoso. Mantém-no atento a tudo o que se passa e o sangue a correr-lhe veloz nas veias. Que era exatamente onde precisava dele, tendo em conta a libido desenfreada de Gabi. Meu Deus, o que daria para ir ao encontro dela em casa e não ao encontro de Penny, com o corpo drenado pela dieta e a sua incessante tendência para criticar.

É Desta Que Leio Isto: Em maio recebemos Teolinda Gersão

Há muito esgotado no mercado português, "O Cavalo de Sol" regressa às livrarias pela mão da Porto Editora, razão para endereçarmos o convite a Teolinda Gersão para o encontro deste mês do É Desta Que Leio Isto, clube de leitura da MadreMedia. Editado em 1984, foi distinguido com o Prémio de Ficção do PEN Clube em 1989, versando sobre o tabu da homossexualidade nos anos 30 do século XX.

Autora de mais de 20 livros, Teolinda Gersão é uma das grandes escritoras portuguesas da atualidade, tendo sido galardoada com alguns dos mais prestigiados prémios literários nacionais, nomeadamente o Grande Prémio de Romance e Novela da APE, o Prémio do PEN Clube (1981 e 1989), o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco, o Prémio Fernando Namora (1999 e 2015) e o Prémio Literário Vergílio Ferreira 2017 pelo conjunto da sua obra.

Para se inscrever no encontro basta preencher o formulário que se encontra neste link. No dia do encontro receberá um e-mail com todas as instruções para se juntar à conversa.

Além disso, pode ficar a par de tudo o que acontece no clube de leitura através deste link.

Como que um sinal, ao deslizar os últimos cem metros, o tema Eye of the Tiger, do Rocky III faz-se ouvir no leitor de áudio Bluetooth no seu capacete de ciclismo. Os intensos acordes explodem e o coração de Dennis bate síncrono. No seu pensamento, Gabi espera por Dennis numa cama king size no camarote principal de um super-iate. Está nua, exceto um par de meias de cano alto, brancas e felpudas, e tem as pernas tonificadas pelo ginásio apartadas em jeito de convite.

Foi então que, vinda do nada, uma mão sólida como aço lhe agarrou no braço e o arrancou da bicicleta, que derrapou chão afora. Dennis abriu a boca para falar, mas foi silenciado por um soco violento no estômago.

— Desculpe, amigo, mas preciso da sua atenção — o captor de Dennis tem por volta de 40 anos, com feições semelhantes a um rato bem aprumado, e cheira a fumo de cigarro bafiento. Com a mão livre, remove o capacete de ciclismo de Dennis e deixa-o cair em cima da bicicleta tombada. Dennis contorce-se, mas o aperto no seu braço é inquebrável.

— Fique quieto, sim? Não quero magoá-lo.

Dennis solta um gemido.

— Mas que raio...

— Estou aqui em nome de um amigo que precisa falar consigo. Sobre a Babydoll.

A cor que ainda restava no rosto de Dennis dissipa-se. O olhar esbugalha-se.

— Pegue na bicicleta, coloque-a nas traseiras do veículo. Depois, sente-se no banco da frente. Sem demoras.

O homem liberta Dennis, que olha à sua volta, aturdido, e repara na carrinha Ford Transit branca e velha e no jovem de rosto pálido com um piercing no lábio sentado ao volante. Abrindo a porta traseira da carrinha, de mãos trementes, Dennis desliga o sistema de som Bluetooth do capacete, que agora toca Slide It In, dos Whitesnake. Dennis pendura o capacete no guiador e pousa a bicicleta dentro da carrinha.

— Telemóvel — pede o Cara de Rato, seguindo a ordem com uma bofetada lancinante que deixa os ouvidos de Dennis a zumbir. De mãos trementes, Dennis entrega-lho. — O. K. Sente-se no pendura.

Enquanto a carrinha se insere no meio do trânsito, Dennis tenta lembrar-se dos protocolos de captura e interrogação do Serviço. Mas e se estes tipos forem parte do Serviço e fizerem parte de alguma equipa de investigação interna? Teriam de ter passado pelo DG para que autorizassem uma captura de alguém com o seu posto. Quem raio seriam eles? Seriam hostis? Parte da SVR, talvez, ou da CIA? Mantém o silêncio. Enfrenta cada momento conforme acontece. Não digas nada.

A viagem não dura nem dez minutos, a carrinha Transit a ziguezaguear por entre o trânsito da hora de ponta. Atravessam a North Circula Road e entram no parqueamento de um hipermercado da Tesco. O condutor escolhe o lugar mais longe da entrada para a loja, estaciona e desliga o motor da carrinha.

Dennis mantém-se imóvel, o rosto da cor de massa crua, o olhar fixo através do para-brisas na vedação à sua frente. Uma ténue névoa de combustível ergue-se do trânsito da North Circular.

— E agora? — pergunta.

— Agora, esperamos — responde-lhe a voz do Cara de Rato atrás dele.

Passam-se minutos até que toca um telemóvel. Grotescamente, é o som do riso de um pato.

— Para si, amigo.

Do banco de trás, o Cara de Rato passa-lhe um telemóvel de plástico barato.

— Dennis Cradle? — a voz é baixa, um som eletrónico vibrante e metálico. Um modulador de voz, apercebe-se subconscientemente.

— Quem fala?

— Não é necessário que saiba. O que precisa de saber é aquilo que nós sabemos. Comecemos pelas boas notícias, pode ser? Em troca de trair o Serviço, acaba de aceitar a grande parte de quinze milhões de libras, guardadas numa conta offshore nas Ilhas Virgens Britânicas. Algum comentário a fazer sobre isto?

O mundo de Dennis retrai-se até ao para-brisas à sua frente. O coração parece ter sido envolto em gelo. Não consegue pensar, quanto mais falar.

— Bem nos parecia. Continuemos, então. Sabemos que, no início do ano, adquiriu um apartamento de três quartos num edifício chamado Les Asphodèles, em Cap D’Antibes na Riviera Francesa, e que, no mês passado, comprou um iate a motor de quase treze metros chamado Babydoll, de momento atracado na marina de Port Vauban. Também sabemos da sua associação com a menina Gabriela Vukovic, 28 anos, atualmente empregada no clube de fitness e spa do Hotel du Littoral.

» Correntemente, nem o MI5 nem a sua família têm qualquer conhecimento sobre isto. Nem a Polícia Metropolitana nem a Inland Revenue. Se quiser que tudo se mantenha assim, está nas suas mãos. Se quiser que mantenhamos o silêncio (se quiser manter a sua liberdade, o seu emprego e a sua reputação) terá de nos contar tudo, e quero mesmo dizer tudo, sobre a organização que lhe tem estado a pagar. Se deixar algo por contar, o mais pequeno facto, e vai passar o próximo quarto de século numa cela da prisão de Belmarsh. A não ser que morra primeiro, claro está. O que me diz?

O zumbido indistinto do tráfego. Algures, ao longe, o alarme de uma ambulância.

— Quem quer que sejas, quero que te vás foder — atira Dennis, a voz grave e vacilante. — Agressão e rapto são crimes. Estou-me a cagar para aquilo que tiveres a dizer.

— Ah, mas eis o problema, Dennis — continua a voz metálica. — Ou talvez deva dizer, eis o seu problema. Se enviarmos estas informações para Thames House e houver uma investigação e acusação, e todo esse tipo de coisas, vão presumir que falou connosco, e as pessoas que lhe estão a pagar todo aquele dinheiro, e quinze milhões é muito dinheiro, vão ver-se forçadas a fazer de si um exemplo. Vão tratar de si, Dennis, e não vai ser nada bonito. Sabe bem como eles são. Na verdade, não tem qualquer escolha, aqui. Não há bluff que o salve.

— Não fazes ideia do que estás a falar, pois não? Posso ter escondido algumas coisas da minha mulher e dos meus patrões, mas ter um caso amoroso não é crime, ou não o era da última vez que vi.

— Não é, não. Mas traição é, e vai ser essa a sua acusação.

— Não tens quaisquer provas para me acusar de tal coisa e sabes bem disso. Isto não passa de uma péssima tentativa de chantagem. Por isso, quem quer que sejas, como já disse, vai-te foder.

— O. K., Dennis, vou explicar-lhe o que vai acontecer. Dentro de cinco minutos, vai sair dessa carrinha e regressar a casa na sua bicicleta. Aconselhava-o a comprar algumas flores para a sua esposa. Tem umas a um preço razoável na estação de serviço. Amanhã de manhã, um carro irá buscá-lo a casa às sete da manhã e levá-lo até à Estação de Investigação de Dever em Hampshire. O seu delegado em Thames House foi informado de que irá passar os três próximos dias lá, num seminário sobre contraterrorismo. Durante esse tempo, também irá, numa outra parte da estação, ser interrogado sobre os assuntos de que falámos. Mais ninguém lá terá conhecimento disto e não haverá qualquer indício de que esta atividade esteja a interromper as suas tarefas. Dever, como decerto sabe, está listada como um ativo secreto do governo, e é totalmente segura. Se a conversa correr bem, como acredito que venha a correr, poderá sair em liberdade.

— E se disser que não?

— Dennis, não vamos sequer começar a considerar o que acontece se disser que não. A sério. Seria uma autêntica tempestade de merda. Penny, para começar. Consegue imaginar? E as crianças. O pai acusado de traição? Não entremos por aí, O. K.?

Um longo silêncio.

— Disseste às sete da manhã?

— Exato. Mais tarde e o trânsito torna-se impossível. O olhar de Dennis prende-se no crepúsculo enevoado. — O. K. — responde.

***

Pousando o telemóvel na secretária, Eve Polastri exala e cerra os olhos. A personagem dura e autoritária que estava a fingir ser para Dennis Cradle em nada tem a ver com Eve. Se fosse cara a cara, nunca teria conseguido manter o tom jocoso, até porque Dennis estivera incomensuravelmente acima dela na hierarquia quando Eve trabalhara no MI5. Mas aquele último «O. K.» tinha atestado a sua culpa, e se não havia dúvida da sua surpresa quando ela amanhã aparecesse à sua frente, isso era algo com que Eve saberia lidar.

—Excelente trabalho — congratula Richard Edwards, removendo os auscultadores através dos quais estivera a ouvir a conversa entre Dennis e Eve e recostando-se na cadeira menos desconfortável que havia no escritório em Goodge Street.

— Foi um esforço de equipa — esclarece Eve. — Lance deixou-o assustado como tudo e Billy conduziu que nem um anjo. Richard aquiesce. Diretor da divisão do MI6 na Rússia, Richard é, tecnicamente, o patrão de Eve, embora seja um visitante pouco frequente do escritório e o nome de Eve não esteja contemplado em qualquer lista de pessoal oficial dos Serviços de Segurança.

Killing Eve - O Amanhã Não Existe
créditos: Minotauro

Livro: Killing Eve - O Amanhã Não Existe

Autor: Luke Jennings

Editora: Minotauro

Data de lançamento: 12 de maio

Preço: 15,21 €

— Vamos deixá-lo dormir sobre a sua situação esta noite, com sorte na companhia da mulher implicante — diz Richard. — Amanhã logo tratamos de o comer vivo.

— Acha que estará lá às sete? Haverá risco de que fuja durante a noite?

— Não. Dennis Cradle pode ser um traidor, mas não é idiota. Se fugir, está terminado. Somos a única oportunidade dele e Dennis sabe disso.

— Haverá risco de ele...

— De se matar? Dennis? Não, não é esse tipo de pessoa. Conheço-o desde que estudámos em Oxford e é um homem obstinado e atrevido. O tipo que acha que consegue resolver qualquer problema, por mais espinhoso que seja, enquanto bebe uma garrafa de vinho num bom restaurante, de preferência à conta de outra pessoa. Dennis vai contar-nos o que queremos saber e manter-se calado. Porque por mais assustadora que a nossa gente possa ser, os tipos que Dennis acaba de trair são infinitamente mais. Qualquer sugestão da sua traição e eles silenciam-no em três tempos.

— E com afinco.

— Com bastante afinco. Se calhar até enviam a sua amiga para fazê-lo.

Eve sorri e o telemóvel na sua mala vibra. É uma mensagem de texto de Niko a perguntar-lhe quando chegaria a casa. Eve responde «às oito», embora saiba que é mais provável só chegar depois das oito e meia.

Richard olha para lá da janela, a única no escritório e por limpar há muito.

— Sei em que está a pensar, Eve. E a resposta é não.

— Em que estou a pensar?

— Apertar com Cradle, usá-lo como isco. Ver o que morde? — Não era uma má ideia, de todo.

— Matar alguém é sempre má ideia, confie em mim. E isto não será nada mais do que isso.

— Não se preocupe, vou cingir-me ao plano. Dennis estará de regresso aos braços da encantadora Gabi antes mesmo de Richard conseguir dizer «crise de meia-idade».

***

Rinat Yevtukh, líder da rede criminosa Irmandade Dourada, em Odessa, sente-se frustrado. Veneza, haviam-lhe assegurado, era mais do que uma cidade. Era uma das magníficas cidadelas da cultura ocidental, e talvez o destino mais luxuoso do mundo. No entanto, à janela da sua suite no Hotel Danieli, vestido com o roupão e chinelos de cortesia, não parecia conseguir sentir nada por aquele lugar.

Em parte, era do stress. Raptar o russo em Odessa foi um erro, percebe isso agora. Presumira, e com alguma razão, que tudo se resolveria como era habitual. Umas quantas negociações pela porta do cavalo, uma quantia acordada, e nada de ressentimentos de ambas as partes. Porém, uma lunática pareceu levar tudo a peito, o que deixou Rinat com seis homens e o refém mortos, e a sua casa em Fontanka transformada em queijo suíço. Tinha outras casas, claro, e os homens eram fáceis de substituir. Mas tudo aquilo era trabalho extra e uma pessoa chega a determinada altura da vida que este tipo de coisa começa a pesar nos ombros.

A suite Doge no Danieli é tranquilizadoramente luxuosa. Querubins alados passeiam por entre nuvens de algodão-doce no fresco do teto, retratos de aristocratas venezianos pontilham as paredes em molduras em ouro de damasco, e carpetes antigas cobrem os chãos. Numa mesa de apoio está uma estatueta multicolorida de um metro, um palhaço lacrimoso comprado numa fábrica de Murano naquela manhã e destinado ao apartamento de Rinat, em Kiev.

Katya Goraya, de 25 anos, modelo de lingerie e namorada de Rinat, está esparramada, descalça, sobre uma chaise-longue de estilo rococó. Num crop top da Dior e numas calças desgastadas da Dussault, Katya mira o telemóvel, masca pastilha e agita a cabeça ao som de uma música de Lady Gaga. Em certas partes, canta em coro, ou pelo menos tenta, no seu inglês muito limitado e por entre o mastigar da pastilha. Em tempos, Rinat achara aquilo atrativo. Agora, era somente irritante.

— Bad Romance — corrige Rinat.

Sem pressas, Katya retira os auriculares, os seus seios dispendiosamente aumentados apertados contra o tecido rendado do top.

— Bad Romance — repete Rinat. — Não é bedroom ants. Katya fita-o, impassível, e franze o sobrolho.

— Quero voltar à Gucci. Mudei de ideias sobre aquela mala.

A rosa, em pele de cobra.

Não há nada no mundo que Rinat deseje menos. Aqueles assistentes de nariz empinado em San Marco. Tudo sorrisos até terem o teu dinheiro no bolso, mas depois não passas de lixo.

— Temos de ir agora, Rinat. Antes que feche.

— Vai tu. Leva Slava contigo.

Katya faz beicinho. Rinat sabe que Katya só quer a sua companhia para que pague pela mala. Se o guarda-costas a levar, sairá da mesada dela. Que é Rinat que lhe dá.

— Queres fazer amor? — Katya lança-lhe um olhar enternecedor. — Quando voltarmos da loja, posso ir-te ao cu com o strap-on.

Rinat não dá sinal de a ter ouvido. O que mais deseja é estar longe dali. Perder-se no mundo para lá das cortinas em seda dourada, onde a tarde se derrama pela noite e as gôndolas e os táxis aquáticos desenham linhas pálidas na lagoa.

— Rinat?

Rinat fecha a porta do quarto atrás de si. Demora dez minutos a tomar banho e vestir-se. Quando retorna ao salão, Katya ainda está no mesmo sítio.

— Vais deixar-me aqui? — pergunta Katya, incrédula.

De testa franzida, Rinat mira o seu reflexo num espelho octagonal prateado. Ao fechar a porta atrás de si, ouve o barulho, deveras impressionante, de um palhaço de vidro de vinte quilos de Murano a despedaçar-se no chão de um terrazzo antigo.

No bar do último andar do hotel, reina a paz e o sossego. Mais logo, estará apinhado de clientes, mas naquele instante tem apenas dois casais, ambos sentados em silêncio. Prostrando-se no terraço, Rinat inclina-se na sua cadeira e, por entre olhos semicerrados, observa o brando subir e descer das gôndolas nos seus ancoradouros. Não tarda, medita Rinat, e será hora de abandonar Odessa. Tirar o seu dinheiro da Ucrânia e levá-lo para uma jurisdição menos volátil. Durante a passada década, o sexo, as drogas e o tráfico humano tinham-se provado os três negócios mais lucrativos, mas com o advento dos gangues turcos, e com os russos sem dar tréguas, o jogo estava a mudar. O homem sábio, afirma Rinat para consigo, sabe quando é tempo de seguir em frente.

Katya tem os olhos postos em Golden Beach, Miami, onde, por menos de doze milhões de dólares, incluindo uns quantos subornos aos Serviços de Imigração e Cidadania dos Estados Unidos, é possível encontrar uma casa de luxo à beira-mar com uma doca privada. Rinat, no entanto, é cada vez mais da opinião de que a vida pode ser muito menos stressante sem Katya e as suas eternas exigências, e há dias que estava a considerar a Europa Ocidental. Itália, em particular, que parece ter uma perspetiva relaxada sobre crimes de torpeza moral. É um lugar com classe — os carros desportivos, as roupas, os edifícios degradados — e as italianas eram mulheres inacreditáveis. Até meras empregadas em lojas pareciam estrela de cinema.