Quase todos — nove homens e duas mulheres — foram inicialmente enterrados pelos moradores da cidade em valas comuns, quando a intensidade dos combates não deixou tempo para mais. Após a retirada das tropas russas desta área, outro corpo foi encontrado não muito longe dali.

Mais de quatro meses se passaram desde que os jornalistas no local encontraram os corpos de 20 civis mortos em Bucha a 2 de abril, no que foi o primeiro indício de crimes de guerra na Ucrânia — no entanto, só agora é que as autoridades locais começaram a enterrar os corpos não identificados.

Na terça-feira, 14 corpos foram enterrados, seguidos por outros 11 na quinta-feira.

É apenas o começo, já que estão previstas outras três cerimónias, disse à AFP Myjailyna Skoryk-Shkarivska, vice-presidente de Bucha. Segundo ela, cerca de cinquenta pessoas, entre os 458 civis mortos durante a ocupação russa da cidade, ainda não foram identificadas.

"O nosso objetivo é encontrar os parentes de cada pessoa não identificada", diz. Para isso, foram extraídas amostras de ADN, inclusive com a ajuda de gendarmes franceses, e tudo que possa ajudar a identificar um dos falecidos é publicado no Facebook.

O procedimento tem protocolos rígidos. Entre as 11 pessoas enterradas na quinta-feira, dois homens portavam documentos de identidade. Apesar das menções na Internet, ninguém os reivindicou e, "para que sejam identificados formalmente, os seus parentes precisam de ver os corpos e reconhecê-los", explica Myjailyna Skoryk-Chkarivska.

Amostras deADN e fotografias

Minutos antes da chegada dos corpos, depositados à pressa no reboque de um camião frigorífico, vários funcionários de cemitérios municipais vizinhos chegaram como reforços para plantar onze cruzes ortodoxas no chão.

Em cada uma delas há uma pequena placa acompanhada de um número que servirá para localizar o corpo caso o teste de ADN apresente algum resultado ou apareça algum parente.

"Para nós, é importante que estas pessoas sejam enterradas com dignidade, como seres humanos, e não como corpos inertes", disse à AFP o padre Andrii Golovin com a voz firme, sem hesitar ao denunciar "esse 'mundo russo' que se manifestou diante dos nossos olhos com todo o seu horror".

Aos 11 caixões enterrados na quinta-feira deve-se acrescentar um décimo segundo, o de Oleksandre Jmaruk, um ex-militar ucraniano de 37 anos que desapareceu desde meados de março e foi identificado à última hora graças a uma fotografia divulgada pela aplicação de mensagens Viber.

Os seus pais deixaram a cidade ocupada pelos russos pouco antes e procuram-no desde então, sem sucesso. Tudo o que sabiam era que o seu filho tinha sido detido pelos russos. E que sabiam muito bem para onde estavam a ir, considerando que no seu prédio as portas dos três apartamentos usados por soldados ou ex-soldados ucranianos foram arrombadas.

"Os orcs (o apelido que muitos ucranianos dão aos soldados russos) prenderam-no em sua casa. E mataram-no perto do mercado", repete o pai de Oleksandre Jmaruk, Vasyl, com a voz trémula, sentado num banco enquanto pressiona contra o peito um retrato emoldurado do seu filho.

Oleksandre Jmaruk será enterrado numa outra área do cemitério, entre muitas outras sepulturas cuja data de morte indica aproximadamente março de 2022. Os seus pais, no entanto, vão continuar a investigar outros detalhes.

"Uma informadora deu o nome dele. Havia uma mulher a acompanhar os russos, os vizinhos ouviram-a. Mas não sabemos quem ela é ou de onde veio", dizem os pais de Oleksandre.

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