Com cartazes com frases como “Pelo Estado de direito”, ou “Ensino Superior, não à política de mão de obra barata”, os manifestantes culparam o Governo pela situação de precariedade em que vivem mas sobretudo os reitores das universidades e presidentes dos institutos politécnicos.
A concentração foi convocada pelo Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), cujo presidente, Gonçalo Velho, disse, em declarações à Agência Lusa, haver “sete a oito mil” docentes e investigadores na situação de precariedade, alguns há décadas.
“O ensino superior e ciência é o terceiro setor com mais precariedade de toda a administração publica, sendo que o problema se situa nos que são mais qualificados, os investigadores, doutorados e docentes doutorados”, disse Gonçalo Velho à Lusa, lembrando que a situação se mantém, apesar de estarem a decorrer dois programas que supostamente deveriam resolve o problema.
Um deles é o programa de regularização extraordinária dos vínculos precários na Administração Pública (PREVPAP), ao qual 5.000 investigadores e docentes submeteram processos, dos quais apenas 150 estão a ser analisados, segundo o responsável.
O outro programa é a lei do emprego científico, que existe há vários meses, mas que ainda não foi regulamentada, e à qual os reitores e presidentes de politécnicos têm demonstrado “resistência”.
Afirmando que é preciso resolver o problema, Gonçalo Velho diz que é uma “questão de vontade”, que a linha financeira da Fundação para a Ciência e Tecnologia para estas situações não foi sequer gasta, e que é “inaceitável que reitores e presidentes de politécnicos continuem sem integrar” os precários.
E enquanto isso, adiantou, há investigadores com carreiras internacionais que admitem sair do país, com prejuízos para a ciência e ensino superior que podem ser graves, e há bolseiros em “situações graves de dificuldades financeiras”.
Luís Monteiro, deputado do Bloco de Esquerda que esteve na concentração, disse à Lusa que há uma “grande expectativa” quanto ao PREVPAP que tem de ser cumprida e que o Bloco “cá estará” para garantir isso. E lamentou que faça hoje 97 dias que foi publicada a lei do emprego científico sem que tenha sido regulamentada.
A “responsabilidade total” é do Governo, quem está “a falhar” é o Governo, disse Luís Monteiro, acrescentando que se a maioria dos reitores não tem mostrado vontade política para usar a lei há também “uma conivência” do ministro Manuel Heitor (Ciência, Tecnologia e Ensino Superior), que tem de garantir que os investigadores vão ter um contrato de trabalho “de uma vez por todas”. “É imperativo que o faça porque estes investigadores não podem esperar mais tempo”.
Paulo Granjo, antropólogo, investigador com contrato de laboratório associado, é um dos exemplos. Está há 15 anos em situação de precariedade, trabalha na Universidade de Lisboa.
“Esta e muitas outras situações não se resolvem porque houve afunilamento de concursos nas universidades, pessoas foram sendo mantidas com situações precárias, numa sucessão de bolsas, contratos, e novas bolsas com bocados de desemprego pelo meio. Agora há a possibilidade de resolver os problemas, mas inexplicavelmente muitos reitores, universidades e institutos, em vez de aproveitarem essa oportunidade, apoiarem os seus investigadores e integrarem-nos, estão a obstaculizar, se não a boicotar ou mesmo sabotar o processo”, disse à Lusa o investigador.
Sandra Pereira, presidente da Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), disse também à Lusa que há milhares de bolseiros com décadas de precariedade e acrescentou que a ABIC está a convocar uma concentração de bolseiros para a Assembleia da República no dia 14, quando é discutido o orçamento do Estado para o setor em sede de comissão.
Chiara Pussetti, que nasceu em Itália mas escolheu Portugal para viver, precária há 14 anos, tem uma explicação para a situação: Se calhar Portugal “não encontra forma de empregar pessoas que fazem ciência neste país”.
A investigadora, disse à Lusa, já concorreu para trabalhar em Itália mas preferia ficar com a família em Portugal, ainda que tenha, aos 45 anos, de se “reinventar”, no caso de ficar sem emprego.
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